Força Zazel - Os Escolhidos

Um novo lar

Margot cumpriu sua palavra e conseguiu uma boa família para o Gabriel,  Samanta e Tom eram o casal modelo de todo o estado, dois arquitetos milionários e bem sucedidos que moravam no subúrbio, apesar das circunstâncias talvez Gabe fosse uma pessoa de sorte.
_ É uma família influente Gabriel, ficaram particularmente interessados por você, é claro que ainda é temporário, mas se tudo der certo, em breve todos veram o quanto você é especial.
Gabriel era esperto demais para saber que nem sempre especial significa algo bom, " O desconhecido causa desconforto ", havia lido isso em um dos seus livros, então decidiu usar um boné antigo do seu pai que a Maria costumava guardar, ele era preto e com um desenho do Incrível Hulk na frente, sabia que era infantil demais, mas não queria que a mudança constante da cor do cabelo chamasse atenção.

_ Você vai gostar deles querido, são um casal de arquitetos e tem uma filha linda, mais ou menos da sua idade.

Sabia o quanto era difícil o sistema de adoção, se essa era a família certa, nada poderia dar errado.
A família o esperava em frente a casa, juntos, tal qual a capa de uma revista imobiliária com toda a família em frente a mansão, o pai era um homem alto, com um corte militar e cabelos escuros, olhos castanhos, tinha um corpo musculoso e um sorriso carismático.
_ Ora, ora se não é o Hulk.
Gabriel sorrir sem entender.
_ O boné, é o Incrível Hulk não é? .
_ A..., sim eu gosto de heróis.
Era mentira.
_ Acho que você assustou ele Tom, me desculpa, é que estávamos ansiosos pra sua chegada.
Disse a Mãe, uma mulher de tamanho médio, cabelos claros, liso e cumprido, magra, exatamente como a barbie.
Gabriel se perguntou se tudo aquilo era real, eles pareciam muito felizes.
_ Eu sou a Samanta e ele é o Tom.
_ E essa pequena aqui é a nossa filha, a Olivia.
Olivia passava um ar de tranquilidade, era talvez a pessoa mais interessante da família, vestia um vestido preto, tinha o cabelo liso e castanho, seu olhar era profundo e reconfortante.
_ Porque não vão brincar enquanto conversamos com a Margot?
Gabriel olhou para Margot como quem pedia permissão, ela se abaixou, o abraçou e sussurrou no seu ouvido em despedida.
_ Não esquece o quanto você é especial.
Gabriel foi com a Olivia conhecer a casa, mas quando entrou não acreditou no que viu , a casa devia ter uns 3 andares e cada cômodo era cinco vezes maior do que o necessário, pintada com cores claras, o banheiro parecia uma sala e a sala era do tamanho da sua antiga casa, era óbvio que  eles sabiam quanto dinheiro tinham e se orgulhavam disso.
_ Não se preocupa, eles gostaram de você, também fiquei surpresa quando cheguei, eu também sou adotada.
_ A quanto tempo você?...
_ Sou órfã? A dois anos, os meus pais morreram em um acidente de avião, mas Tom e Sam não gostam que eu fale disso, " Projetando uma vida nova vida ".
_ O que é isso?
_ Um dilema da família, arquitetos sabe, você vai aprender também.
Gabriel se perguntou porque um casal assim queria adotar duas crianças, mas não sentia que importava, desde que eles o tratassem bem. A conversa com Olivia era tranquila e amigável, ela parecia feliz em vê-lo, mas uma casa grande tem janelas e varandas proporcionais, assim, uma ventania levou o seu boné e seus cachos rosa ficaram a mostra, a deixando surpresa.
_ Nossa, acho que isso é demais, não sei se vão gostar.
_ Me desculpa eu não devia.
_ Tá tudo bem, não vou contar, só coloca o boné de novo.
Gabriel se sentiu bem com a Olivia, ela entendia seus receios, também era adotada e sabia o quanto a vida podia mudar em um acidente, guardaria seu segredo como uma irmã faria, percebeu que podia fazer parte daquela família, ou talvez esse sentimento de paixão ainda viesse da Téia.
No cair da noite, quando a Margot foi embora eles se puseram a grande mesa de madeira na sala de jantar, havia uma cozinheira particular na casa que os serviu sopa de ervilha.
_ E então Gabriel, você gosta de esportes?
Tom perguntou.
_ Eu... gosto de jogar bola
_ A, isso é bom, podemos trabalhar com isso. Vou te escrever no time de futebol do colégio, você vai ter os melhores treinadores e tudo o que precisar.
Gabriel não sabia se era mesmo o que queria, mas era cedo demais para comentar.
Samanta boceja e o olha com uma expressão cansada.
_ Você vai gostar daqui querido, quero que se sinta em casa está bem? A Olivia vai te mostrar o seu quarto, eu vou subir pra dormir agora.
Ela sobe alguns degraus da grande escada branca em " V " e chama o Tom.
_ Querido, você vem?
_ Bom, essa é a minha deixa, amanhã nos falamos melhor, boa noite Incrível Hulk.
Tom subiu as escadas sorrindo com a Samanta.
O quarto do Gabriel era de frente ao da Olivia, com banheiro e uma cama que cabia facilmente 4 pessoas, era tão espaçoso quanto o restante da casa.
_ Eu também já vou dormir, amanhã brincamos um pouco, é legal ter outra criança morando aqui.
_ Boa noite, valeu por não contar o meu segredo.
_ No banheiro do andar de baixo tem um kit de barbear, talvez te ajude.
Olivia se despede e fecha a porta.
Gabriel não conseguia dormir, sempre que fechava os olhos pensava no acidente com a sua mãe, ou na Téia sendo sufocada no porão de casa, não parava de pensar no quanto sua mãe tinha razão, havia mesmo muita maldade no mundo, mas ele estava bem agora, essa família era legal e se ficasse poderia ser médico como o seu pai um dia, não iria deixar que seu cabelo rosa imbecil impedisse isso. Ele desceu as escadas e foi até o banheiro, tirando o boné e pegando o barbeador automático, mas quando iria começar ouviu alguém empurrar a porta de correr, era o Tom.
_ Arra!
Gabriel olhou assustado como se estivesse prestes a fazer algo horrível.
_Calma eu tô brincando, não consigo dormir, a Sam ronca bastante, mas não diz que eu te contei, e você Hulk o que tá fazendo com o barbeador?
_ Eu... Eu...
_ Tá, não precisa explicar, mas não pode brincar com isso, não sozinho, eu vou te ajudar, o que quer fazer.
_ Eu ia cortar o cabelo.
_ A, cortar o cabelo então, eu até gostei, mas não sei se todo mundo tem a mesma opinião.
_ Não quero ser estranho.
_ Entendo.
Ele fica atrás do Gabriel no espelho e passa a mão sobre os cachos cor de rosa, analisando mecha por mecha.
_ O mundo é um lugar estranho pequeno, o normal é superestimado, além do mais, você não precisa cortar, podemos só pintar de preto.
_ Podemos?
_ É claro, eu sou o mestre dos cabelos e tintas, das projeções também, mas não sei se a Sam concordaria com a última parte, cá entre nós, as melhores plantas são as dela, ela projetou essa casa.
_ Mas se eu pintasse, ainda teria o cabelo grande e as pessoas poderiam falar algo.
_ As pessoas sempre tem algo a falar Gabe, mas nem sempre devemos ouvir, posso cortar se você quiser, mas preciso saber que é por seus motivos.
Gabriel se sentiu bem, estava apaixonado por aquela família, eles eram mesmo felizes e não julgavam o seu jeito, será que ainda estava retendo o sentimento da Téia e por isso se sentia assim? E se pintasse o cabelo, quanto tempo bastaria pra ficar de outra cor de novo? Estava sempre mudando de acordo com o sentimento das pessoas, achou melhor não começar sua nova vida sendo o estranho do cabelo colorido.
_ Eu quero cortar, bem baixo por favor.
_ Então tá, como queira.
Ele arrasta a cadeira da sala e coloca no banheiro.
_ Agora é só sentar e deixar a mágica acontecer.
Tom era mesmo um homem talentoso, fez um ótimo corte no fim das contas, quando acabou o Gabriel estava com a cabeça raspada e feliz, se sentia normal de novo.
_ Eu te disse que era o mestre. Fico feliz de ter confiado, eu queria ter  cortado o cabelo do meu filho quando tive a chance, mas a Sam nunca deixou.
Gabriel ficou surpreso, não sabia que eles haviam tido um filho.
_ O que aconteceu com ele?
_ O mesmo que aconteceu com você e a Olivia, um acidente.
Tom fica com uma afeição triste e abatida.
Gabriel toca em sua mão e seu cabelo muda de rosa para castanho escuro, mas agora já não era tão perceptível.
_ Eu sinto muito, é triste perder alguém.
Pela primeira vez ele realmente se sentiu triste pela morte da sua mãe. Talvez absorver o luto do Tom o ajudasse com o seu, pensou em algo reconfortante para falar mas foi interrompido.
_ Não vamos pensar nisso tá bem? " Projetando uma nova vida ", repete comigo.
_ Projetando uma nova vida.
Isso aí, agora vamos limpar tudo e voltar a dormir antes que as meninas acordem.