LIBERTAR TODAS AS LÁGRIMAS

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   Capítulo 17

         

    Fazia algumas semanas que eu chegara do hospital e ainda me sentia um estranho no meu próprio quarto. Olhava as paredes, o teto, o piso. Meus olhos pousavam nos móveis e em cada detalhe e só sentia as lágrimas quentes rolando pelo rosto.

Só que, naquele dia, algo me fez encarar minha nova realidade. Meu notebook já não estava no quarto. Melhor assim, pensei de imediato. Não queria e não tinha com quem se preocupar. A psicóloga que meus pais contrataram, aconselhou que eu me afastasse de toda e qualquer rede social, até que estivesse me sentindo preparado para um novo retorno.

O problema é que eu nunca mais iria voltar a usar.

Me afastei de tudo e tentava a todo custo superar o medo de me encarar diante do espelho. Eu estava sofrendo de dismorfia¹, além de síndrome de pânico e depressão pós-traumática. Eu simplesmente pensava que estaria evitando do mundo ter que me aturar. Me sentia sujo e descartável. Não queria ter que dar explicações ou enfrentar novas amizades. Já era difícil ter que descobrir estar acordando todos os dias e perceber que ainda respirava.

Tudo isto era cansativo demais.

Eu não reclamava para meus pais, pois sabia bem o quão era sacrificante para eles terem de abrir mão de muita coisa para cuidar de mim. Eu me sentia um fardo pesado demais e não tinha nenhuma vontade de ter que deitar a cabeça no travesseiro e dormir. Dormir era algo doloroso e causticante. Era uma tortura fechar os olhos, pois vinham os cheiros e sons.

As dores e risadas.

Uma mescla de situações desagradáveis na época escolar e aquele dia infernal. Um pesadelo tão realista que eu acordava com as dores físicas, mesmo sabendo que não estavam lá, mas minha mente me punia e me arrastava pelos cabelos até o galpão, me prendendo num redemoinho de desespero e dor.

Eu já estava cansado demais.

Queria dar fim aquela tortura infindável de pesadelos, exames, médicos, remédios...

Mas eu tinha um amor tão grande pelos meus pais! Eu não suportaria decepcionar os dois mais uma vez. Eu me sentia um poço de decepção e sujeira. Via meu corpo sujo, marcado e maculado pra sempre. Não me achava digno de ter pais como eles.

Fui até a cozinha, sem chamar atenção e vasculhei alguns armários, atrás de algo que eu pudesse beber e acabasse de vez com minha dor. Nada. Nos filmes era tão fácil achar uns quatro ou cinco tipos de veneno e outros líquidos terrivelmente perigosos que você nem sabia exatamente porque as pessoas tinham. Mas, na vida real, não era tão fácil.

Abri uma gaveta e umas mil facas se exibiram pra mim. Passei a ponta dos dedos, sentindo o aço frio delas.

“Não. Dói muito! Fora de cogitação! Desisti!” – Pensei, subindo as escadas

Me sentia tão derrotado.

Passei pelo quarto deles e lembrei que minha mãe tinha analgésicos e comprimidos para refluxo.

“Será que se eu tomasse todos eles juntos, acabaria logo com este inferno de vida?”

(- Não seja ridículo. Vá estudar, Pedro!)

O GOSTO METÁLICO DA DOROnde histórias criam vida. Descubra agora