Sentido

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Na vez seguinte, não deixei aquele desconfortável silêncio nos envolver.

- A última recordação que tenho, é de caminhar por uma rua de paralelepípedos, que levava até uma praça. Havia um arbusto com flores. Lembro que céu claro, cheio de nuvens brancas e de aparência fofa, quase como algodão colado numa tela azul-safira, sabe? Quando me inclinei para olhar as flores, encontrei um ninho entre os galhos.

Ele apenas me fitou, como sempre, sem expor uma palavra.

Não devia saber que estava sonhando, nós raramente nos damos conta disso.

Nos próximos encontros oníricos, prossegui a narrar fatos aleatórios da minha vida.

Não era comum meu mestre me fazer reencontrar sucessivamente a mesma pessoa.

Devia haver uma razão para isso, mas eu nunca conseguia o menor esboço de reação daquele rapaz, seria bem improvável conseguir uma pista dele.

Eu comentava alguma recordação, fato aleatório que sabia ou planos que queria realizar.

"Teve uma vez que tive que passar a tarde inteira após às aulas fazendo um trabalho de escola na biblioteca. Foram horas diretas de pesquisa ininterrupta. Sem pausas para comer ou descansar. Ao voltar para casa, só, quase desmaiando de exaustão, faminta, passei perto de uma lanchonete e usei os únicos 50 centavos que tinha para comprar um pastel. Foi quando me deparei com três cachorros, na sargenta, os olhos baixos e era possível ver as costelas aparentes... reparti o pastel em três partes e entreguei para eles"

"Você sabia que existe uma linguagem formada exclusivamente por assobios que existe há mais de 2000 anos? Eu nunca conseguiria apreender"

"Quando eu tinha seis anos, joguei uma pedra em um garoto que me socou e roubou minhas balas. Depois me arrependi de não ter sido um tijolo".

Eu comentava a falar logo após ele deitar a cabeça no travesseiro e fechar os olhos. Em seu ponto de vista, teria a visão que estávamos deitados lado a lado na cama desde sempre, e tudo isto era plenamente normal.

Sonhos não tinham a mais contundente eloquência.

Ele não me dava nenhuma resposta ou reagia à qualquer coisa que falava ou fizesse.

Eu evitava olhar para ele mais que o necessário, nem olhava para como seu quarto era.

Às vezes, era menos de um segundo, outras vezes passávamos anos ali.

O tempo em sonhos não é lógico.

Nada ali fazia sentido.

Mas eu estava desesperada para encontrar alguma lógica na situação.

Chainsaw man - Imagine Aki Hayakawa: AnormalOnde histórias criam vida. Descubra agora