Yr offeiriades

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Dois meses haviam se passado, Gene estudava dia e noite o idioma local para melhor se integrar ao país e também para lecionar com mais clareza. Havia conseguido um emprego numa universidade local há menos de uma semana e sentia-se feliz, em paz e radiante.

Às vezes se pegava pensando nas coisas que aconteceram com ela, as visões de uma figura que mais tarde se mostrou ser um dos arcanos do tarot, os recorrentes sonhos eróticos envolvendo sadomasoquismo ou algo assim e principalmente a ininterrupta sensação de que havia algo de errado com ela; sentia-se o tempo todo vigiada, uma atmosfera mórbida e sufocante a envolvia na maior parte do tempo e ela não tinha noção do que causava aquilo.

Aos domingos, ia à igreja e fazia suas orações atribuindo-lhe penitências de novenas que nunca terminavam, pois lembrava-se de sua avó dizendo que as forças do mal afetam as pessoas através da carne e do desejo. Quanto mais próximo se estava dos prazeres do mundo, mais suscetível estava ao controle do mal. Gene acreditava em forças ocultas, não tinha certeza se suas visões eram maléficas, mas achava melhor se precaver.

Era um sábado de manhã, ela acordou enrolada com o lençol e com o sol forte se espalhando em seu quarto. Levantou-se ainda trôpega e tomou um banho depois desceu para aprontar o café.

Enquanto degustava sua salada de frutas e o leite com chocolate, olhou ao redor e sentiu seu coração se encher de alegria por ter conseguido alugar aquela casa, o bairro era bonito, tranquilo e não ficava longe da universidade. A vizinhança era silenciosa, havia muitas árvores nas calçadas e uma pequena praça bem em frente à casa que alugou. Seus devaneios a retiraram da mesa e a levaram para o alto, estava leve como uma pluma e flutuava sobre a casa, o vento a levou para longe dali; num lampejo estava de volta aos dez anos.

Brincava no jardim coletando insetos e colocando dentro de um vidro de picles. As flores amarelas de dente-de-leão enfeitavam a grama verde e contrastavam com o céu límpido tão azul que fazia de qualquer coração sonhador sua nova morada. Sua mãe aproximou-se e acocorou-se perto dela, perguntava constantemente os nomes dos insetos e Genevieve respondia corretamente, exatamente como estavam escritos nas enciclopédias que lia.

— Filha, quando você crescer, haverá momentos em que o mundo não parece certo. Mas não se preocupe com isso, haverá dentro de ti uma voz interior que lhe servirá como uma bússola apontando sempre o melhor caminho a seguir.

— E é uma voz bonita, mamãe?

— Claro que é, é sua própria voz. Nunca se esqueça, Genevieve, você deve sempre seguir a sua voz interior.

A mãe levantou-se e se despediu com um beijo em sua testa, aquela foi a última vez que viu a mãe com vida, pois ela se jogou no mar naquele mesmo dia.

Genevieve se pegou olhando para a mesa e com os olhos cheios de lágrimas, enxugou-os com o dorso da mão e respirou fundo para se recompor. Levantou-se e foi até o jardim regar as plantas, o que não passava de alguns vasos com flores e ervas aromáticas.

Pietro, o vizinho, estava lavando o carro. O corpo bronzeado do rapaz chamava a atenção de Gene desde o primeiro dia em que o viu. Sob o sol matinal ele estava sem camisa e usando um calção esportivo úmido que deixava seus contornos em evidência.

Ela deslizou sobre cada curva, cada gominho abdominal e cada covinha daquele corpo sarado, seus olhos penetravam aquela carne como se ela o fosse devorar naquele momento.

Ele virou-se e sorriu com seus dentes alvos, rosto fino com a barba aparada, olhos cor de mel e uma tatuagem no peito. Ele acenou para ela desmanchando o sorriso, quando Gene caiu em si ele apontou para seus pés e só então ela percebeu que estava encharcada, a mangueira havia caído de sua mão e ela o encarava abobalhadamente.

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