Cabala

Y consuriwr - parte2

O avião começou a se mover pela pista de decolagem, ela olhava pela janela apreensiva e simultaneamente aliviada. Viu a cidade de cima ficando cada vez menor, logo toda a província e o país onde nasceu e cresceu, diminuir rapidamente até parecer uma manchinha de terra perto do oceano. As nuvens cobriam grande parte de sua visão, o marasmo e o conforto a amoleceu e então ela se permitiu relaxar, seus olhos pesavam tanto, que era como uma luta hercúlea mantê-los abertos. Todas as luzes se apagaram e seus olhos fecharam.

O cheiro doce e químico entrou por suas narinas e a fez sentir a adrenalina percorrendo seu corpo. Sua pele estava suada e molhada com outros líquidos, sentia o forte cheiro de álcool e suor espalhar-se ao seu redor.

Seu corpo estava amarrado, seus movimentos limitados. Ela tentou mover os braços presos às costas, mas sentiu doer por conta da corda apertada, o traje que vestia era fino e pouco cobria sua pele; a parte superior era um corpete de couro com um decote enorme que deixava mais da metade de seus peitos à mostra, a calcinha apertada enfiada entre as nádegas pressionava sua genital, mas não ao ponto de incomodá-la, ao contrário, aquele traje vulgar era apreciado por sua vontade. Os sapatos de salto alto pretos eram tão lustrados que era possível usá-los como espelho. Ela sentiu alguém segurar seus tornozelos e a multidão ao seu redor gritar em euforia. Ela sentia a vibração das vozes, o calor dos corpos, a agitação do público, tudo fazia parte de uma coreografia sensual a qual ela esperou por muito tempo para executar.

Um estalo metálico foi captado por seus ouvidos e logo seus pés começaram ser puxados para cima, o show iria começar, ela mordeu o chicote colocado em sua boca e sentiu um arrepio percorrer sua coluna. As gotas de suor desciam pelas pernas e pelas costas e chegavam até sua nuca. Ela estava eufórica, com o coração acelerado e a vulva quente por conta do contado com a roupa de couro, mas o calor não era externo, exalava de dentro dela, de seus desejos e de sua vontade, ela estava no controle de si, de seu corpo e de suas necessidades.

Abriu os olhos e viu seu reflexo no piso preto espelhado. Os olhos verdes densamente delineados a encaravam com um olhar devasso e quase sobrenatural, ela viu seu rosto se contrair num sorriso e ao receber um tapa na bunda ela gemeu deixando o chicote cair.

Despertou com gentis solavancos. Olhou para o lado e viu uma moça com uniforme azul-marinho e sorriu.

— Nós já pousamos e todos já deixaram o avião. A senhora precisa de ajuda?

— Não. Não, eu estou bem — respondeu ela reparando no sotaque carregado da moça, que se esforçava para manter seu inglês limpo. — O que me recomenda fazer nesse país?

A moça sorriu e empertigou-se, estendeu-lhe a mão para auxiliá-la a levantar-se e esperou que Gene pegasse sua bagagem, mas não havia nenhuma. Então caminhou à frente dela até a porta, quando virou-se para ela e disse:

— O Brasil é muito grande e tem muita coisa para se fazer e conhecer aqui. Se você não tem um roteiro claro, sugiro que contrate um guia de viagens ou busque dicas de pontos turísticos no nosso stand no piso dois.

— Agradeço.

Brasil, aqui estou eu.

Ela caminhou pelo aeroporto constatando a simplicidade da estrutura em relação ao que conhecia em seu país, a comida exalava um cheiro diferente, a iluminação era mais intensa e a temperatura mais alta, o ar parecia mais pesado e áspero quando entrava em seu pulmão, sentia falta do ar gelado e cortante.

Conforme caminhava atraía para si alguns olhares, de imediato notou que era por conta de suas vestes, que destoava muito do coletivo. Apesar de estar frio, as pessoas não usavam roupas tão grossas como as dela, porém, ela não tinha o que fazer, tudo o que tinha estava nos bolsos daquele casaco, todos seus documentos importantes, cartões e celular, metade de sua vida estava com ela.