blessed with a curse

110 12 4
                                    

As vezes fico me perguntando sobre muitas coisas que acontecem comigo, justamente pela simples razão de nunca ter feito mal a ninguém. Toda violência que passei, tanto física e mental, pelo Nick, acabaram abrindo um buraco enorme em minha alma - se eu ainda possuo alguma. 

Dias depois de todo ocorrido desde a festa de Halloween, me prendi em meu quarto e mal via a luz do sol. Na realidade, qualquer claridade me fazia sentir muita dor nos olhos. Eu ainda não havia me olhado no espelho, não comia mais, e qualquer pessoa que tentasse contato comigo, era impossível, pois a porta ficava trancada.

Por dias escutava Copia, Papa, Mountain e Aether baterem na minha porta. Alguns traziam comida, outros me chamavam para sair do quarto pois diziam sentir minha falta. Mas eu não tinha reação pra me levantar de onde estava. Na realidade, o lugar que me encontrava - mentalmente - era um lugar cômodo, onde não corria risco de machucar ninguém e muito menos de ser machucada.

Não sabia quantos dias estava sem dormir. Se eu ousasse em fechar meus olhos, aquele mesmo homem de cabelos brancos e longos vinha em meu encontro, mas ele sempre me empurrava para algum abismo diferente. Se eu fechasse meus olhos, eu tinha flashbacks de quando estava dilacerando o Nick com minhas próprias mãos, e caia em um abismo mental gigantesco de dor.

Eu só enxergava a escuridão, o silêncio e o vazio. De alguma maneira, aquilo me confortava, mas por outro lado, eu odiava estar sozinha. E o mais cômico, é que por mais que lutasse contra meus demônios, era como se tentasse contar grãos de areia da praia - inútil.

"I can't drown my demons, they know how to swim."

Mas eu estava cansada. Não queria mais me esconder e muito menos fugir da realidade. Quanto mais eu tentava fugir, mais ia em direção a o que eu tentava esconder: eu mesma. 

(...)

Finalmente levantei da cama, e já sabia que era de noite. Conseguia olhar pro lado de fora do casarão, e a noite era de céu limpo e estrelado. Respirei fundo, e fui até ao banheiro, pois precisava retomar minha dignidade tomando um banho. Não esperava me assustar com meu próprio reflexo - na verdade, não foi um susto de algo ruim, mas não imaginava como meu rosto estaria e se aquelas marcas já tinham sumido. Pelo contrário, as marcas só diminuíram de tamanho e estavam em uma parte do meu rosto - do lado esquerdo, surgindo em minha testa e indo até meus olhos. Meus olhos, mudaram de cor, e eu tinha uma cor de âmbar escuro - o que mais me chocou, pois meus olhos eram castanho-escuro. 

Meus cabelos foram de preto para um tom castanho avermelhado, ressaltando todos os traços de meu rosto que sempre evitei - maxilar marcado, bochechas acentuadas e uma boca mais carnuda. Incrivelmente eu aparentava ter saúde, com a pele rosada nas bochechas e boca, e a pele sem nenhum resquício de corte ou machucado. 

Eu tinha me transformado. Em que, eu ainda não sabia. Mas o "conjunto da obra" acabou me agradando, algo que nunca havia acontecido. Fiquei por um tempo olhando meu reflexo, até que atingi minha alma, e percebi que quem estava ali não era uma Afrodite insegura, indecisa e frágil. Eu havia me tornado outra mulher, cheia de mistérios e alguém que eu estava prestes a conhecer.

- Nunca vi uma ceifadora tão linda em toda minha vida. - Era a voz de Fire. 

Fire tentou por várias vezes me ver, mas ele com seu jeito reservado, desistia um pouco fácil demais. Talvez por ser sempre uma pessoa que não tentasse interferir nas vontades alheias. Mas eu sabia que ele estava sempre ali, sempre nas sombras me vigiando. Ele sabia que eu não queria falar com ninguém, por isso nunca se aproximou durante esse tempo que me afastei de tudo e de todos.

Por algum motivo, ao vê-lo tive uma sensação de alivio e felicidade, como se meu passado tivesse sido apagado da minha memória. - Ainda tem medo de mim? - Me virei pra ele.

Hunter of SinOnde histórias criam vida. Descubra agora