Abrindo Espaço

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Ye não fez nada além de desejar que Cibele tivesse um bom dia no trabalho, distante em seus pensamentos, ela estranhou, imediatamente se sentindo mal, aquele comportamento não condizia com o homem do dia anterior, mas a mulher conhecia bem aquele tipo de cara, respirou fundo, bom, era menos uma preocupação.

— Bom dia. — Cumprimentou sorridente a recepcionista. A mulher de cabelos castanhos não se dignou em lhe responder, apenas lhe lançou um olhar desdenhoso e interfonou.

Um minuto depois Sandro, o dono da clínica, aparece, social, usando seu jaleco, óculos de grau quadrado, barba feita, os cabelos loiros tingidos.

— Bom dia, Cibele, pode vir comigo.

Cibele o seguiu por um corredor estreito, dobraram à direita, chegando em um saguão amplo com divisões como de escritórios onde ocorriam as etapas de cuidados com os animais. O ambiente era  branco, bem iluminado e barulhento por causa dos bichos.

— Como você não lida com saúde animal vou precisar que atue mais na limpeza deles, pode ser?

Ela piscou e respirou fundo.

— Eu entendo, mas o senhor aceitou meu currículo como auxiliar de veterinária, não como tosadora.

— E fui duramente criticado por meu sócio após sua entrevista via video chamada. Mas disse que vai cursar medicina ano que vem, se optar pela animal talvez eu possa te promover a auxiliar.

— Claro. — Concordou meio sem graça.

— Ótimo! Vou te deixar com o João, ele também faz parte do nosso programa de inclusão então acho que vai se dar melhor com ele.

Programa de inclusão?

Cibele o acompanhou em silêncio, precisava manter a boca fechada ou acabaria perdendo o emprego.

João, um homem negro, alto, cabelo curtíssimo platinado e com waves, terminava de enfeitar uma poodle em seu espaço quando foi interrompido pelo veterinário, ele virou a cabeça para dar uma rápida olhada no chefe, seus brincos compridos  de triângulos vermelhos invertidos na orelha direita balançaram chamando atenção.

— Deixa eu adivinhar, minha nova aprendiz.

— Você é o melhor professor daqui. Vou deixá-la sob seus cuidados agora. Seja bem vinda, senhorita. — Sandro ficou um segundo observando-a antes de sair.

Por que estavam olhando-a daquela forma?

— Oi, tem algo que eu possa fazer para ajudar?

— Já estou terminando essa, quando meu próximo cliente chegar aí você me ajuda.

— Tá bom. — Ergueu o rosto para ver os outros trabalhando e pegou o momento exato em que abaixaram a cabeça disfarçando não estarem de olho. Desconfortável, pigarreou e manteve o sorriso simpático.

— Já cuidou de bicho antes?

— Eu tive um gato quando criança, mas ele ficou doente e morreu seis meses depois.

— Então não tem nenhum tato com animais, mas está trabalhando numa clínica veterinária?

— Eu gosto de animais.

— Mas não sabe lidar com eles, então não adianta.

Em seis horas de trabalho Cibele foi humilhada pela falta de habilidade em tudo que se propôs, fez um buraco no pelo de um Terra Nova, três gatos arranharam não só seus braços, mas o rosto também, sua roupa estava encharcada e ela fedia a bicho molhado.

— Cibele! Nossa, vejo que botou as mãos na massa, hein?! — Sandro estava na recepção fofocando com a recepcionista quando Cibele passou para ir embora.

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