Acordo com a luz do sol que invade o quarto, me sento na cama com os olhos ainda fechados, permaneço ali esperando minha alma voltar para o corpo. Lutando contra a apatia me arrasto até o banheiro, tomo um banho rápido apenas para despertar completamente, visto uma roupa leve, diferente de ontem o clima hoje está quente.
Desço as escadas cantarolando, mas me calo gradativamente ao ver Suppasit sentado exatamente no mesmo lugar e usando as mesmas roupas de ontem, ele meche no computador, está usando fones de ouvido, parece falar com alguém.
Me recosto no mesmo aparador em que tropecei ontem, cruzo os braços em frente ao corpo e apenas observo suas costas moverem os músculos conforme ele digita alguma coisa.
— Me envie o que você tem aí e vejo o que posso fazer. - ele fala confirmando minha suspeita.
Ele pega o violão que até agora estava no chão ao seu lado e começa a dedilhar as cordas, retira os fones de ouvido e murmura alguma coisa que provavelmente é a letra de alguma canção, me aproximo e apoio os braços no encosto do sofá.
— Você passou a noite toda aqui? - pergunto.
— Sim, fiquei sem sono e aproveitei para trabalhar. - ele vira para me encarar e me surpreendo ao vê-lo usando um óculos, desvio o olhar para disfarçar minha surpresa e o fato de eu ter achado ele extremamente sexy usando aquilo.
Ele é um babaca eu não posso pensar essas coisas sobre ele, vem fazendo da minha vida um inferno desde que chegou e em que eu penso? Como deve ser transar com ele usando aqueles óculos.
— Você é produtor musical? - pergunto quando consigo ver uma parte da tela em que está um equalizador.
— Sim, eu tenho uma produtora, é pequena, mas é minha.
— Achei que vivesse de mesada. - eu tentei não verbalizar isso, mas quando me dei conta já era tarde demais.
— Eu não querer assumir a empresa não quer dizer que seja um inútil.
— Não foi isso que eu disse. - me aproximo da mesa de centro onde o notebook está apoiado e vejo que sua xícara está vazia, estendo a mão e pego a caneca — Quer café?
— Pensei que não fosse mais me trazer café.
— Olha Suppasit, não sei porque eu ainda tento. - digo deixando a caneca de volta na mesa.
Quando dou um passo à frente, sinto ele segurar minha mão, mas dessa vez o toque é leve e suave nada parecido ao de ontem.
— Gulf, eu estou brincando, tá legal? - Puxo a mão me soltando, pego a caneca outra vez e vou em direção a cozinha.
— Você sabe fazer café? Porque acabou e Caio e Olívia foram embora ontem a noite.
— Por que?
— Não sei, ela apenas não quis ficar.
— Aposto que você falou alguma merda pra ela e por isso ela foi.
— Vocês dois combinaram para me atacar?
— O quê?
— Nada!
Balanço a cabeça e desistindo de continuar aquela conversa vou para a cozinha e começo a preparar o café da manhã.
O aroma do café começa a invadir a casa, sorrio automaticamente ao sentir o cheiro, cinco minutos depois ele surge com uma bandeja cheia de comida.
Afasto o notebook dando espaço para que coloque a bandeja na mesa, ele faz isso e senta ao meu lado. Permanecemos calados por um longo tempo, até que não consigo mais segurar minha curiosidade e pergunto de uma vez.
— De onde você conhece o Kalleb? Vocês dois pareciam tão próximos na reunião. - ele parece não querer responder, me olha como se eu tivesse feito uma pergunta absurda — Foi a primeira vez que vi você sorrir.
— Quando saí do orfanato...
— Orfanato? - interrompo ele.
— Sim, orfanato. Eu fui encontrado em um banheiro público quando era recém nascido, fui adotado duas vezes, mas me devolveram quando tiveram filhos biológicos.
Uma tristeza repentina cai sobre mim, seus olhos parecem tristes, ele força um sorriso, mas eu sei que não é verdadeiro.
— Não me olhe assim. - fala sério.
— Assim como?
— Como se eu fosse um pobre coitado, que mereço toda piedade do mundo. - ele toma gole da bebida que está na xícara, me parece ser chocolate quente. — Enfim, quando fiz dezoito anos tive que sair, morei por duas semanas na rua, me virando como podia pra comer. Até que um dia, estava chovendo muito forte e eu andava na rua procurando um lugar para me abrigar e aí um carro desgovernado me atingiu.
Presto tanta atenção no que ele fala, que esqueço completamente do café, eu não fazia ideia que ele tinha sofrido tanto, eu sabia que ele não tinha ninguém, nenhum parente só não sabia que tinha sido praticamente jogado fora.
— Quando acordei estava em quarto de hospital caro demais para que eu pudesse pagar e Kalleb estava lá, dormindo em uma cadeira ao lado da cama.
— Ele foi quem te atropelou?
— Uhum! - ele sorri como se fosse bom — Era aniversário dele, tinha ganhado o carro de presente do pai, mas não sabia dirigir, pegou o carro para se exibir para os amigos, perdeu o controle e me atingiu. Me levou para seu apartamento quando disse que não tinha onde morar, comecei a trabalhar no café próximo a faculdade para ajudar nas despesas porque não gosto de depender de ninguém, mas mesmo assim ainda era muito caro pra eu pagar então nós mudamos, me fez fazer o vestibular pra faculdade e eu passei com 80% da bolsa, mas um dia ele foi embora, então tive que arrumar outro emprego para conseguir arcar com as despesas sozinho, comecei como estagiário na cervejaria, fazia de tudo. Um dia esbarrei no Sr. Edgar em um dos corredores...
— Claro! Se não fosse assim não seria você. - falo e sorrio ele me olha por alguns instantes antes de responder.
— Do jeito que você fala parece que eu vivo caindo por aí. Enquanto recolhia os papéis notei que havia alguns cálculos errados, ele verificou e realmente estavam errados, me colocou como secretário e aqui estou eu, ontem foi a primeira vez que vi o Kalleb depois que perdemos contato.
— Você os odeia? Quero dizer, seus pais. Você os odeia?
— Não! Talvez se eles não tivessem me abandonado eu não seria quem eu sou hoje.
— Você não tem curiosidade de saber quem eles são, você não sente falta deles? - ele franze a testa juntando as sobrancelhas.
— Não. Eles que me deixaram, qual o sentido de eu querer conhece-los? Se não me quiseram antes não vão me querer agora. Você encontrou sua mãe mudou alguma coisa? - então ele realmente ouviu a conversa — Eu não estava bisbilhotando, só passei na hora e escutei.
— Mudou que agora eu não espero mais ela voltar.
— Engraçado eu não achei que você fosse do tipo que precisa ver para crer.
— Como assim?
— Você não precisou me ver dando em cima de alguém, pra deduzir que eu sou uma vadia que faz sexo em troca de favores profissionais.
Permanecemos por longos minutos em silêncio, ele encara a tela do computador atrás da bandeja com os alimentos que nós sequer tocamos, depois de um tempo sem dizer nada ele se levanta e sai.
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Acontece
FanfictionO amor! Há quem diga que é o sentimento mais forte do mundo que pode nos tornar em pessoas melhores, mas também há aqueles que acham que esse sentimento nos deixa fracos e vulneráveis. Bem este último era o pensamento de Mew Suppasit, um homem no au...