XIV

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Mew

Você está bem? - pergunto preocupado porque ele está quieto demais.

— Estou. - ele responde com a voz baixa e pouco trêmula.

Se retira subitamente do meu colo e começa a se vestir rapidamente, seus olhos estão em todos os lugares da sala menos em mim.

— Você quer ir embora? - pergunto enquanto limpo meu abdômen com um lenço.

— Não! - ele passa a gola da camiseta preta pela cabeça. — Precisamos terminar isso, o prazo final é amanhã.

— Você está bem? - seguro seus ombros olhando em seus olhos.

— Já disse que estou. - ele se solta de minhas mãos, pega os papéis que estava analisando antes e senta no sofá se afastando da mesa.

O resto da noite permaneceu um silêncio absoluto dentro da sala, ele continuou concentrado nas propostas dos novos fornecedores.

***

A chuva que caia cessou, restando apenas os respingos na janela.

O relógio já se aproxima da uma da manhã e Gulf pegou no sono agora de volta a minha frente, ele está com os braços apoiados sobre a mesa servindo de travesseiro para sua cabeça.

A chuva parou, mas o clima é frio, os pelos de seu braço estão ouriçados, parece estar com frio.

Pego o paletó que está disposto sobre o encosto da cadeira e cubro seu corpo, aproveito para olhar seu rosto sereno e calmo, mas ainda com o vinco tão familiar entre os olhos.

Decerto eu poderia passar o resto da madrugada apenas apreciando a paz que estar perto dele me transmite, bem diferente de alguns meses atrás quando cheguei aqui, quando meu único intuito era infernizar sua vida.

Deslizo o polegar sobre sua sobrancelha grossa e massageio sua testa fazendo a linha sumir gradativamente.

Passo algum tempo ali, até que o som do toque do celular me traz de volta a realidade. O nome de Karina brilha na tela, eu já imagino o que está procurando devido o horário avançado.

Encaro o aparelho por alguns segundos, sem entender o motivo de minha hesitação em atender a ligação.

Depois de um tempo passo o dedo na tela finalmente recusando a chamada, deixo um beijo leve em sua testa e volto para minha cadeira para dar continuidade ao trabalho.

Não demora muito e logo o restante da pilha de pastas some por completo, visto minha camisa e deixo a gravata em pescoço, mas sem atar o nó. Sem pressa alguma me aproximo dele e toco seu ombro com calma, ainda assim ele se assusta quando chamo seu nome.

— Os relatórios! - ele fala, sua voz manhosa beirando ao ronronar de um gato. — Precisamos terminar os relatórios.

— Ei, calma! - sorrio entre as palavras por causa de sua cara de sono. — Eu terminei. - não resisto e estendo a mão tocando seu rosto fazendo um carinho em sua bochecha gordinha.

— Desculpe, Ahhh... - ele boceja — Estou com muito sono.

— Eu sei. Venha vamos, já chamei o carro. - ele tenta se livrar do paletó, mas eu o impeço, colocando de volta sobre seus ombros.

Quando chegamos a portaria o carro já está a nossa espera, ele entra no veículo com minha ajuda, me sento ao  seu lado no banco traseiro e indico o caminho de sua casa ao motorista.

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