CAPÍTULO 8

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A noite estava quente no litoral de Iapraq. O vento forte que vinha do mar invadia as ruas depois de passarem pelo porto, trazendo um cheiro ocre de ferrugem e gasolina, além de uma sensação opressiva de umidade salina que anunciava uma provável tempestade naquela noite.

Carla suspirou ao descer do carro que a trouxera até aquela mansão e encarou os grandes portões, deformando os lábios com uma micro expressão de nojo. Estava atrasada. Não porque tivera muito trabalho na sede, mas porque realmente não queria ir ao compromisso que sua mãe tinha jogado sobre suas costas.

Já tinha que lidar com as outras famílias originárias diariamente na cúpula por todos aqueles anos, além de fingir uma cordialidade que não queria ter com muitos dali, para ter que se forçar a ir em confraternizações eletivas.

Das famílias de CLASSE A, as agregadas às originárias eram as mais cansativas, como se um tipo de superioridade tivesse subido às suas cabeças apenas por terem sido incluídas ao hall da fama que era os eventos próprios para essa Classe. E a família originária que mais tinha agregados era a dos Vertheimer.

Ela estalou a língua e ajustou o vestido preto decotado de tecido leve que aderia às suas coxas. Não podia mais fugir.

A grande estrutura da mansão estava bem iluminada, contrastando com o céu obscurecido e nublado da noite avançada. Enquanto atravessava o amplo jardim, Carla analisou a mosaicultura da grama aparada e os arbustos em topiaria cônica. Era um belo jardim, com coretos ao longe, cobertos e obscurecidos por trepadeiras floridas.

Ela emitiu um som de desgosto, seu Louboutin degrastrass preto estava se desgastando naquele caminho de pedras alvas, um esforço que não valia em nada. "Espero que já esteja no fim", ela pensou enquanto entregava seu sobretudo para o mordomo que a recebeu na entrada.

— Por aqui, senhora Moretti. — Ele fez um sinal com a mão enluvada, algodão puro.

Carla jogou a massa de cabelo castanho que repousava sobre seu ombro para trás e seguiu pelos corredores rumo à sala de jantar.

Estava absorta demais nos próprios pensamentos para reparar na luxuosa decoração interna, na iluminação dos lustres ou sequer nos grandiosos quadros de família dos Vertheimer, acumulando séculos de uma linhagem impecável. A mente de Carla, desde a tarde daquele mesmo dia, era tomada por apenas uma coisa, ou melhor, alguém: Thiago.

A aproximação repentina dele. O cheiro gostoso de cama em manhã fria. A sensação do corpo dele, pressionando-a contra a mesa. Aquele olhar sonolento e a barba rala, os cabelos castanhos à altura do queixo. Tudo nele e, mais especificamente, o pedido para ser seu submisso.

Carla precisou respirar fundo, controlando pela milésima vez a galgada que seu coração deu no peito. Por que ele tinha pedido isso? Por que justamente isso? Ele podia ter se declarado, falado sobre suas emoções, mas preferiu pedir para ser submisso dela. Será que queria apenas uma experiência sexual? Porque se fosse isso, ele estava muito enganado sobre como funcionava aquele jogo.

"Não... Ele é bobo demais pra querer apenas isso" ela pensou mordendo o lábio levemente enquanto seguia pelo corredor para a ala Oeste da mansão, guiada pelo mordomo. De fato, Thiago sempre teve uma personalidade muito retraída, não exatamente tímido, mas também não um extrovertido falador. Ele não combinava com modos libertinos, então só restava à Carla duas opções sobre as verdadeiras razões o italiano.

O primeiro palpite era que Thiago era apaixonado por Carla, e que pedir para ser seu submisso foi a única forma que ele conseguiu de se aproximar dela. Uma interpretação plausível, já que ela tinha plena consciência das barreiras que impunha ao seu redor para se proteger.

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