END

457 68 54
                                    

18h24 Hora da Costa Leste - 23h24 Hora de Greenwich

Um homem caminha com seu chapéu em mãos. Uma mulher caminha usando um par de botas exageradamente altas. Um menino caminha, segurando um videogame. A mãe com um bebê chorando. Um homem com bigode de vassoura. Um casal de velhinhos com casacos que combinam. Uma mulher com camisa azul sem migalhas da rosquinha que comeu. A história podia ter sido tão diferente. Imagine se ela fosse outra pessoa, pensa, coração disparado só de pensar nisso.

Mas foi assim:
Uma mulher caminha, segurando um livro.
Uma mulher caminha com um lenço no ombro. Uma mulher caminha e se senta a seu lado.

Tem uma estrela inquieta no céu. Jenna percebe que é um avião e que, na noite anterior, eles foram aquela luz. As duas ficam em silêncio. Gwendoline se senta bem perto dela e olha para a frente, enquanto espera que o choro termine. Sente-se grata por isso, porque a atitude dele transmite compreensão.

— Acho que você esqueceu uma coisa — diz ela, depois de certo tempo, e mostra o livro que está sobre suas pernas. Ela não responde, apenas limpa os olhos e funga. Gwen finalmente se vira para ela. — Você está bem?
— Eu nem acredito que já tenha chorado tanto num dia só.
— Nem eu — diz Gwen, e ela se sente péssima porque é claro que ela tem mais
direito de chorar que ela.
— Eu sinto muito — comenta ela com calma.
— Bem, não podemos dizer que ninguém nos avisou — continua Gwen com um
pequeno sorriso. — Todo mundo sempre diz que é bom levar um lenço para casamentos e funerais. Apesar de tudo, ela ri.
— Acho que ninguém nunca me sugeriu um lenço na vida — diz. —Talvez de papel.

Ficam em silêncio de novo, mas não da mesma maneira conturbada de antes,
na igreja. Alguns carros sobem a entrada do hotel, com os pneus fazendo barulho e as luzes em cima delas, forçando-os a fechar os olhos. — Você está bem? — pergunta, e Gwen faz que sim com a cabeça.
— Vou ficar.
— Deu tudo certo?
— Acho que sim — fala ela —, considerando que era um enterro.
— Claro — diz, fechando os olhos. —Desculpa. Gwen se vira para ela, de leve, e seu joelho toca o dela. — Eu tenho que pedir desculpas também. Aquilo tudo que eu falei sobre o meu pai...
— Você estava chateada.
— Eu estava com raiva.
— Você estava triste.
— Eu estava triste — concorda. — Ainda estou.
— Ele era seu pai. Gwendoline concorda de novo.
— Por um lado, eu queria ser como você. Queria ter tido coragem de falar com ele antes que fosse tarde demais. Talvez as coisas tivessem sido diferentes se eu tivesse falado. Todos esses anos de silêncio... — Gwen para de falar e balança
a cabeça. — É que é um desperdício tão grande.

— Não foi culpa sua — diz Jenna, olhando para ela. Ela se lembra de que nem sabe como o pai de Gwendoline morreu, apesar de imaginar que tenha sido repentinamente. — Vocês deviam ter tido mais tempo juntos.
Gwendoline tira o lenço do ombro deixando ele exposto.
— Não sei se isso faria muita diferença.
— Faria — insiste ela, com a garganta apertada. — Não é justo.
Gwen olha para o outro lado e aperta os olhos. — É que nem a história da luz noturna — diz ela. Mesmo que ele tenha começado a balançar a cabeça, ela continua. — Talvez o importante não seja que ele não tenha ajudado no começo. Talvez o importante seja que, no final das contas, ele percebeu o que tinha que fazer. — Ela fala com a voz branda. — Talvez vocês dois só precisassem de mais tempo para se dar conta das coisas.
— Ela ainda está lá, sabia? — diz Gwendoline, depois de certo tempo. — A luz noturna. Eles transformaram o meu quarto num quarto de hóspedes depois que fui embora e a maioria das minhas coisas está no sótão. Mas notei que a luz ainda está lá quando fui deixar a mala em casa. Aposto que não funciona mais.

— E eu aposto que funciona — diz ela, e Gwendoline sorri.
— Obrigado.
— Pelo quê?
— Por isso — responde ela. — O restante da minha família está em casa, mas eu não conseguia mais respirar. Eu precisava de um pouco de ar puro. Gwendoline concorda.
— Eu também.
— Eu precisava... — Gwen para de falar de novo e olha para ela. — Não tem problema eu estar aqui?
— Claro que não — diz ela rápido demais —, principalmente depois de eu...
— Depois do quê?
— De eu ter chegado sem avisar no funeral hoje — diz ela ainda afetada pelas memórias. — Não que você não tivesse companhia. Gwen franze a testa, olhando para os sapatos até que a indireta dela faz sentido.
— Ah — diz ela. — Aquela é minha ex-namorada. Ela conhecia meu pai e
estava preocupada comigo. Mas estava lá como amiga da família. De verdade.
Ela sente uma onda de alívio. Não tinha percebido o quanto queria que fossem apenas amigos, antes de ouvir que realmente eram.

A Probabilidade Estatística do Amor À Primeira VistaOnde histórias criam vida. Descubra agora