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Alfonso

   Eu não tinha a intenção de comparecer. Pelo menos, foi isso que eu disse a mim mesmo. O fato de que marquei um compromisso com um vendedor em potencial na parte de Cobble Hill, no Brooklyn, não tinha nada a ver com os testes que estavam acontecendo a doze quarteirões dali no mesmo dia.

   Minha reunião terminou às seis e meia, e dirigir pela Smith Street me fez passar por uma certa igreja enorme. Quando percebi, já havia estacionado e estava seguindo uma horda de pessoas como uma ovelha desatenta.

   — Bem-vindo ao Tabernáculo. — Um homem mais velho na entrada me entregou um folheto com um sorriso caloroso. — Talento é um presente de Deus. Compartilhá-lo é a sua maneira de retribuir. Boa sorte esta noite.

   Por mais que o gesto convidativo devesse ter me feito sentir mais à vontade, aconteceu o completo oposto. Eu queria dar o fora dali. Mas já que eu já estava ali, abafei a vontade de fugir, sentei-me em um lugar na última fileira e observei todos os rostos animados nos bancos da frente da igreja.

   — Posso sentar aqui? — O cara que havia me recebido estava no corredor, na extremidade do banco no qual eu me sentei. Olhei em volta da igreja. Devia haver umas trinta fileiras completamente vazias à minha frente. Ele leu a minha expressão. — Eu gosto de me sentar próximo à porta caso haja alguma interrupção ou pessoas atrasadas causem tumulto.

   Assenti e deslizei no banco para dar-lhe espaço. Passava das sete da noite. As pessoas haviam parado de chegar, mas as audições ainda não haviam começado.

   — Você é novo? Não lembro de tê-lo visto por aqui antes.

   — Eu só parei aqui para... — O que diabos eu estava fazendo aqui? — Dar uma olhada.

   — Então, você não canta?

   — Não. Sim. Não. Sim. Quer dizer... eu cantava. Faz muito tempo.

   Ele assentiu.

   — O que te fez parar de vir à igreja?

   Eu não disse que tinha parado de frequentar a igreja. Apenas deixei implícito que costumava cantar e não cantava mais.

   — Como pode saber se não frequento outra igreja?

   Ele sorriu.

   — Você frequenta?

   Não pude evitar uma risadinha.

   — Não. Não frequento.

   Ele gesticulou para os bancos dos fundos.

   — Quando as pessoas vêm aqui depois de um longo tempo de ausência, tendem a sentar nas últimas fileiras.

   Assenti.

   — Facilita a fuga.

   — Quanto tempo faz?

   — Desde que cantei pela última vez?

   Ele balançou a cabeça.

   — Não. Desde a última vez que esteve na casa de Deus.

   Eu sabia a resposta sem ter que pensar sobre ela. A última vez que coloquei os pés dentro de uma igreja foi com a Allison. Havíamos ido para a missa antes da nossa reunião marcada com o diácono. Faltavam duas semanas para o dia do nosso casamento, e nós entregamos a ele as leituras e as músicas que escolhemos para a cerimônia. Ironicamente, o dia em que fomos à casa de Deus também foi a noite em que ela escolheu mudar de ideia.

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