│3│böötes

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Eu odeio hospitais.

Sempre odiei! Minha mãe costumava dizer que não passava de algo psicológico, mas era um fato, bastava por os pés dentro de um e eu imediatamente me sentia doente. Como se uma gastura surgisse na boca do estômago e minha garganta fosse fechando, pouco a pouco.

É o tipo de ambiente que tento evitar ao máximo. Principalmente depois de passar os quatro piores meses da minha vida preso em um, mais precisamente em uma cama, sem tevê a cabo, com vista para um monte de mato, recebendo visitas curtas e esporádicas de Harry que precisava se dividir entre eu e os bebês, que naquela época eram recém nascidos e não podiam ficar saindo de casa o tempo todo.

Meus pais e minhas irmãs não podiam vir todos os dias, afinal, todos tem suas vidas independentes. Anne era a pessoa que eu mais vi durante aquele período, ela vinha sempre pela manhã, quando o restaurante estava fechado e passava horas sentada ao meu lado, sem conversar sobre nada em especial, apenas mantendo a solidão longe. Hoje eu sei o quão fundamental foi sua atitude, porque a solidão se aproxima e domina com tanta facilidade.

Ainda mais no meu caso.

Evangeline tinha morrido, eu me encontrava em um estado delicado com uma recuperação lenta, Harry era como um fantasma que só se lembrava de trocar fraldas e fazer mamadeiras, eu não falava com ele. Não falava com ninguém e pensamentos ruins sempre culminaram em minha mente.

Acredito que o suicídio seja algo que todo mundo já considerou. Pelo menos uma vez.

Viver não é fácil, o mundo e as pessoas nunca colaboram para que possamos nos abrir ou tentar mudar nosso pensamento. Cada um de nós enfrenta uma batalha, mas não era nisso que eu pensava quando estava encarando a banheira cheia em um dos quartos deste mesmo hospital, pra mim eu era o único que sofria.

Mas não era verdade.

Bastava olhar ao redor, fazer uma pergunta para qualquer paciente ali e você veria. O sofrimento é coletivo. Eu não era o único, tantos outros ali se encontravam em uma situação semelhante ou até pior e mesmo assim, de alguma forma, eles conseguiam seguir em frente. Conseguiam viver mais um dia, vencendo a vontade de desistir, porque vale a pena lutar, para mim, valia a pena ouvir a risada dos meus irmãos mais novos, valia a pena provar as delícias culinárias da minha sogra, valia a pena receber flores de um batalhão inteiro, valia a pena segurar meus filhos nos braços e valia a pena beijar meu marido e dizer que eu não iria a lugar nenhum.

Mesmo com todas as possibilidades eu não desisti. Cada dia é uma luta e a cada noite uma vitória.

Eu sabia que Harry enfrentava algo parecido, mas imaginei que ele fosse me dizer algo. Que ele ao menos daria um sinal.

Bem, talvez ele tivesse dado, caso estivesse ao seu lado e não no Queens fumando maconha com um ex amante.

Eu deveria ter estado com ele quando seu mundo veio abaixo.

É por isso que eu odeio hospitais, porque eles sempre estão presentes em nossos momentos de fraqueza e dor. Estar aqui só me faz ter certeza absoluta do quão fodida nossas vidas estão.

Três anos e nada muda.

Dobro a coluna, a procura de um médico, todavia, nenhum circula pela sala de espera. Não me lembrei de pegar o celular, apenas agi totalmente por impulso, checando a pulsação dele e enrolando as toalhas mais grossas que encontrei ao redor dos seus pulsos, liguei para a emergência e em três minutos estavam colocando-o em uma maca e saindo às pressas.

Não pensei em ligar para ninguém, apenas deixei água e comida para os bichos, vesti Spencer e Blake no primeiro conjuntinho que encontrei e mesmo sendo fim da primavera e o tempo não sendo exatamente agradável pela manhã eles foram de bermuda jeans e t-shirt. Não vejo a hora de Harry acordar e me dar um sermão por não ter colocados roupas decentes nos garotos.

ANDRÔMEDAOnde histórias criam vida. Descubra agora