Cáp 1 .

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RET.

Som alto, mulher descendo até o chão e os caras com a pistola colado na cintura, e algumas pessoas que nunca vi na vida.
Odeio época verão por um único bagulho: turistas.

Os caras querem subir na morro a qualquer custo, querem subir no baile pra ver como realmente é. Se tem fuzil, se tem droga da boa. É lucro, com certeza, mas como que tu sabe que não é gente de outro morro infiltrado?
Tu pode ter o melhor malandro pro teu lado, mas nunca se sabe o que o outro também tem.

- Tá brisando em que, ret? - Passa a parada pra cá. - Lennon fala quando me vê analisando a aglomeração daqui de cima.

- Só fazendo a vistoria. - Levo a mão no bolso e tiro algumas gramas de coca. Lennon é meu braço direito aqui de cima, além de Víctor, que me ajuda a manter esse morro.
Nunca tive problema com o cara, sempre entregou o certo pra nós.
Como diriam: Meus olhos, meus ouvidos e meus braços em qualquer lugar. Nada pasa.
- Checa os olheiros e fica ciente de que ninguém tá pirado. Hora de serviço, é hora de serviço. Ninguém usa nada. Depois, é liberada aquela quantia pra quem mereceu. - Apenas o vejo acenar com a cabeça e logo descer pra fazer seu trabalho.

Trabalhar com viciado é foda, não digo que não uso, mas ter a parada no teu controle é muito melhor.
Hipócrita já que faço grande parte do meu lucro com cargas e mais cargas, mas sei separar bem. Sempre soube. Se não soubesse. Esse morro todo aqui, não seria meu. E em breve, outro também.

- Cê tá maluca, caralho? - Quem a porra do Victor trouxe pra cima? Nem comunicou no bagulho. Viro minha cabeça rapidamente pra ver o que tá rolando - Mina tu não é daqui, não pode sair empurrando maluco e jogando parada na cara deles não. - Victor falava com uma mulher que não conseguia ter visão. - Tu não tá ligada no que um perreco maluco pode fazer contigo aqui. - Deve ser conhecida pra ele ter a confiança de trazer pra cima sem me comunicar antes. - Tu é da pá virada mermo. - O cara tá sem paciência com mulher e nenhuma nunca tirou a dele desse jeito. Sei que vive com a mãe, Dona Vera, que é quase que uma mãe pra mim, que é mãe de sangue do Lennon e o irmão mais novo, mulequinho bom, inocente e cheio de sonho. - Até explicar que tu é nossa irmã. A parada complica muito. - Minha cabeça travou ai.

Tá ligado a sensação de que um soco no estômago te atingiu?

Lembranças.

- Eu quero que você saia daqui. - A voz de Laura saiu nervosa. Seu olhar estava fixo no meu e sua postura tinha mudado perto das outras brigas. Sua mão apontava para a direção da porta.

- Eu não vou sair, caralho! Eu quero que você me escute. - Tudo se resolvia uma hora ou outra, eu insistia uma, duas.. Deixava ela de molho, mas ela voltava na terceira. Às vezes na quarta, mas voltava.

- Não, cara. Não adianta eu te escutar hoje, não adianta eu te escutar amanhã porque agora quem não quer mais essa merda, e eu tô falando sério, sou eu! - A sua voz estava começando a ficar mais alta. Nada do que não tô acostumado. - Eu cansei dessa merda. Se limpa num dia. Fica de boa uma semana. Algo dá minimamente errado nessa sua vida de merda e toma pó nessa porra desse seu nariz. - A raiva ficava mais evidente, além da raiva, a decepção. Vai começar o show de consciência na minha cabeça de novo.

- Você me conheceu assim. Não vem encher o caralho da minha cabeça como se não sabia. - Toda vez que a briga rola, a pauta volta sobre a minha vida. Me conheceu aviãozinho, me viu tomando tudo e aprendendo com o meu padrinho. Enche o saco uma hora esse discurso.

- Eu te conheci sendo menino. Pronto pra virar homem digno. Você e Victor foram se enfiando nesse merda. Dinheiro fácil, vida fácil. - Ela ri, mas é aquela do mal que ela dá mesmo quando tá puta. Aquela que tu sabe que é porque ela tá tirando contigo. - E aí você virou isso. Um maluco que cheira e joga tudo pro ar. Tô cansada dessa porra. - A raiva deixa ela com a boca suja. E isso não me agrada e nem me desagrada. Traço meu que ela pegou. O diferente é que a minha boca tá sempre suja.

- Vida fácil? - Minha vez de rir. - Matando meia dúzia de leão por dia pra tua casa aqui continuar de pé, pra tua vidinha ser mais fácil.

- A minha? - O tom de deboche tá misturado com todos os outros. - Eu tô falando sério, sai da minha frente. Some da minha vida, pelo amor de Deus! - A convicção dela nessa ideia tá começando a me irritar.

- Eu vou. - Solto uma risada fraca e ergo minhas mãos. Antes que a parada fique maluca como nunca ficou. - Não vou gastar saliva contigo quando tu insiste em se fazer de puta tonta. - Consigo sentir a ira dela em mim quando solto a frase. - Mas fica ciente que a conversa não acabou e você tá ligada.

Eu não posso acreditar que essa maluca tá no morro de novo.
Depois de 7 anos...
7 anos fodidos atrás dela.

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