Laura
7 anos longe do morro.
respiro a brisa fresca que o fim de tarde aqui na laje me proporciona. o por do sol aqui foi uma das coisas que eu mais senti falta enquanto estive fora.
morar em outro estado, longe de tudo, me fez aprender que devemos dar valor até as coisas mais pequenas como essa daqui. quando a saudade aperta, é doloroso demais.
- Tem certeza que não se viram? - A voz de Lennon, meu irmão mais velho, me fez sair do transe que estava
- Com ele quem? - Viro de frente pra ele e pego a xícara que ele tinha trazido pra mim. O café de minha mãe tinha o mesmo gosto de sempre.
- Se você ganhasse dinheiro a cada vez que se faz de sonsa, você estaria com muito mais dinheiro que eu agora. - Lennon agora estava ao meu lado, analisando a vista que a laje proporcionava do morro que também era seu. - Ele pirou quanto você foi embora e você sabe disso. Vacilei com o meu irmão pra proteger você. E também ele. - A culpa na sua voz era evidente. - Ele te procurou em cada canto do morro, do estado, contratou gente pra ficar de olho na casa do seu pai.
- Precisávamos disso. - Disse ao dar de ombros. Nunca mais havia falado sobre o Ret. Última vez nos vimos, estávamos brigando porque ele tinha enchido o nariz de pó após algo dar errado. - Mas uma hora ele parou, não foi? Deixou de perguntar e procurar. Se tornou o dono disso tudo aqui, junto de você.
- Antes dele parar, ele se afundou de um jeito que você não tem noção. - Lennon não me olhava, nem por um segundo. - Chegou perto da morte diversas vezes. Misturava os bagulhos, bebia, dirigia que nem um maluco. Seu nome foi proíbido de ser falado. Não porque ele pediu, mas porque toda vez que era tocado. Isso era o fim. Ele ficava transtornado. - Lennon levou meses pra descobrir que nos envolviamos. Éramos novos, os dois estavam começando a vida. Eu focada na minha faculdade que tanto lutei e estudei pra conseguir. Ret e ele focados em serem donos da Rocinha.
- O que importa é que ele se recuperou. - O assunto já estava me dando agonia. Não lembro de ter trombado com ele nem por um segundo ontem. Ele pode estar diferente, com toda certeza, assim como eu também estou, mas reconheceria o olhar dele em qualquer lugar. Sempre.
- Não deixa acontecer de novo se vocês se trombarem. - Finalmente Lennon me olhou. Seu olhar tinha uma súplica. Era por mim, e por ele também.
- LAURA, LAURA, LAURA. - A voz de Joaquim tomou meus ouvidos e sorri ao ver ele na laje. - Nem acredito que você tá aqui. - Sua voz era de animação e em poucos segundos ele já estava agarrado em meu pescoço.
- Oi, meu menino. - Enchia seu rosto de beijos e apertava seu corpo magro e pequeno como nunca. - Você tá enorme, meu deus! - Falei ao colocar ele no chão e analisar sua estatura. Quando sai daqui, Joca tinha apenas 1 aninho. Éramos grudados, eu, ele e Ret. Uma vez decidimos que fingiariamos ser pais de primeira viagem e a vez dele trocar a fralda foi um fiasco.
- Sim, eu já posso ir na roda gigante. Tenho tamanho. - Joaquim me contou de um jeito animado. - O Lipe me levou lá.- Ele continuou sendo extremamente presente na vida da minha família. O que não era algo que não fosse esperado, já que Vitin, Lennon e ele se criariam juntos, mas o amor dele por minha mãe e Joca tinha continuado.
- Sério? - Olhei pra Lennon que estava com um cigarro na boca agora. Era outro que havia crescido muito, sua fisionimia tinha mudado. O rosto agora tinha um ar mais sério, o pequeno cavanhaque havia deixado ele muito diferente. - E você gosta bastante do Lipe né? - Voltei toda a minha atenção ao Joca.
- Se você não colocar a fralda rápido, ele vai fazer xixi em você. - Falei ao finalmente conseguir parar de rir depois da crise de ânsia de vômito que Filipe teve ao limpar a primeira bunda de neném da vida dele. - É sério e a pontaria dele é boa.
- Laura, caralho. Para. Me ajuda aqui! - Seu olhar e sua voz tinha uma desespero imenso.. Como se o xixi de uma bebê fosse uma arma letal. - Meu deus, ele tá armando isso. - Ele tentava achar o lado certo da fralda.
- Amor, o lado exato da fral... - Antes que eu terminasse de falar, o xixi saiu feito um jato, molhando a blusa inteira dele. Joca dava pequenos sorrisos analisando tudo e eu me matava de rir. - Eu avisei. Deixa que eu termino isso. - Tomei a fralda da mão dele antes que ele morresse por estar mijado - Bom garoto, já descobrimos do que ele tem medo agora. - Falo baixinho pra Joaquim ao beijar a testa dele.
Trocar uma fralda é a coisa mais simples do mundo, eu não sei como ele conseguiu causar tanto caos. - Pronto, tá limpinho de novo. - Passar um tempo com Joaquim nos faz bem, é um dos poucos momentos em que parece que Ret esquece aquele rádio maldito e consegue ficar sem aquelas coisas enormes em volta da cintura ou ombros.- Tenho vontade de meter um time de futebol em você. A casa cheinha de pivete. - Olhei pra Filipe na porta que agora já estava sem camisa e um pouco menos aterrorizado. - Tu fica linda demais assim.
- A casa cheia de pivete. - Só de imaginar uma casa com minis Filipe minha cabeça já entrava em parafuso. - Um menino e uma menina. É ótimo assim.
- Tá maluca? Tenho saúde pra ser pai de menina não. A garota ia ser que nem você, ia misturar os meus gênios. - Ri na parte do gênios.- Eu ia ter que mandar prender em algum lugar. - Seu corpo estava estendido na cama. Cuidar de Joaquim deixava ele cansado, de alguma forma, acho que era algo que deixava ele tenso por medo de machucar.
- É genes que se fala, besta. E vai pro lado, ele dormiu. - Ret ajeitou os travesseiros como ensinei pra que eu pudesse colocar Joca. Seu corpinho pequeninho era menor que um travesseiro daquele, mas tinha medo de que ele se machucasse. - Você sabe que os seus "gênios" são piores que os meus né?
- Meus, GENES, são bons quando você tá perto. - Ele fez uma pausa dramática pra me corrigir e aquilo me fez rir.
O barulho do radinho de Lennon me fez sair do mar de coisas que estavam rondando minha cabeça, percebi que Joaquim me olhava de um jeito.
- Você ficou em silêncio por um tempão. - Ele disse rindo e fazendo circulos com o dedo ao lado da cabeça - Você ficou maluquinha, maluquinha.
- Você vai ver o maluquinha. - Falei ao pegar ele no colo e apoiar sobre o pedaço de concentro que tinha. - Você tá ficando muito saidinho pra sua pouca idade sabia.
- Tá na escuta, caralho? - A voz de Ret saiu no radinho. Eu não a escuto a tanto tempo, mas sabia que era a dele. Meu coração palpitou. - Desce, tem serviço. - Lennon nem responde direito, só fala um mísero ok e me encara.
- Vai lá. A noite, descemos em algum dogao. - Sorri pra ele de canto antes de ver ele sumir e fazer um "joinha" com a mão.
Minha cabeça parece que vai explodir a qualquer segundos e todos os meus miolos saírem pra fora. Não é como se ainda fosse apaixonada por ele, mas ter que voltar a encarar depois de fugir. É bem complicado.
VOCÊ ESTÁ LENDO
CAIS.
ActionRet tinha um sonho desde moleque: Dominar o Complexo. Junto de seu irmão de consideração, Lennon. Os planos mudam quando Laura entra pra sua vida de um jeito diferente, mas tudo desmorona quando ela subitamente some do morro após uma discussão. A...