Todo dia Júlio, seguindo as orientações dos assombrosos, fazia pressão psicológica em Juliana, sua esposa, para que visitasse o centro de prática de magias e feitiçarias, e assistisse uma das sessões dos rituais semanais. O objetivo principal dos assombrosos eram colocar Julia dentro do cento e testar as reais habilidades espirituais da menina, que estava já com idade de seis anos. Júlio diariamente dizia:
- Meu amor, eu sempre apoio você e a sua mãe na escolha pela bruxaria branca, e sempre que pedem explicações sobre algum amuleto usado nas simpatias eu explico as origens e como devem ser usados, contudo, você não mostra que me ama, pois, nunca me acompanhou no centro. Eu sinto falta da minha família e admiro os frequentadores que levam a sua família. Alguns questionam-me quando você, a Julia e o Jordan aparecerão para poderem conhecê-los, e eu fico constrangido e apenas digo, algum dia desses.
Juliana, percebendo o caráter apelativo da conversa, rechaça os argumentos do marido de forma bem amorosa:
- Meu amor, eu apoio você em quase tudo que fazes, inclusive anui em vir para esta cidade para iniciarmos a nossa vida, sem a interferência de ninguém. Também, mesmo que não goste do lugar, apoiei-te na compra da casa que hoje é o centro. Eu te amo, contudo, há diferenças que o casal deve aprender a conviver para viver em harmonia. Eu não gosto e não simpatizo com a magia negra e afastei-me das magias brancas, relacionada a bruxaria, que a minha mãe me preparou para seguir desde a infância. Já te expliquei sobre o fato. Eu me senti mal no dia que te acompanhei para celebrar o acordo de compra e venda com o Sr. Barnabé. Você se lembra de tudo isso?
Júlio insiste:
- Sim! Anuímos na vinda para cá, e eu também me afastei dos meus pais, que moram na capital, para vir morar aqui com você, pois, o "homem deixará pai e mãe e unir-se-á a sua esposa", conforme me tem falado. Todavia, você deve ser uma só carne comigo, e se eu gosto de magia negra, você tem que se unir comigo nisso e ser "submissa ao marido". Você me falou nisso quando fala sobre os seus estudos bíblicos.
Juliana, percebendo que a tentativa de deturpar o real significado do termo "submissa" e que isso poderia ser obra da legião de assombros que manipulavam o seu marido, diz bem tranquila:
- Meu amor eu te acompanho nas suas escolhas e continuo, na medida do possível, vivendo em harmonia com você. Não posso e nem usarei a bíblia como disputa de conhecimento e nem como fonte de acusação como fez o tentador no caso de Jó. No entanto, é bom lembrar que o termo "ser submissa" não está relacionada a fazer as vontades do marido e comportar-se como uma escrava e nem tampouco se anular na vida. Submissão é no sentido moderno de ser companheira, de estar presente nas tarefas da casa como faço para você, cuidar das crianças como fazia Sara e Rebeca. Então sou "submissa", pois, respeito a sua opinião, mesmo que discorde de alguma coisa e não permito que essas diferenças causem a desarmonia no nosso lar.
Juliana: A mulher não tem que se submeter e fazer tudo que o marido pede, quando a própria consciência a inquieta, pois, não faria de todo o coração e não estaria em paz consigo mesma. A mente um dia iria colapsar e a externar isso em forma de depressão e outros males do século. É preciso manter o equilíbrio espiritual. É certo que devemos nos amar e unir-nos em um único pensamento, que nos leve a união com a palavra de Deus. Quanto as questões do mundo, respeito as suas escolhas e vivo em paz com elas, pois aprendi a respeitar o seu tempo. Eu agia inconsciente quando praticava magias brancas, contudo, agora, com um entendimento melhor, não a uso mais, mesmo que o fizesse sob a torta justificativa de ajudar nas despesas da casa. Mas não posso me deixar levar por tudo que me gera o bem-estar, e por isso, filtrei e parei. Melhor é para mim entrar na vida espiritual sem essa renda, que se perder nesse mundo de paixões carnais.
Júlio contrariado, fala:
- Você fala muito da bíblia, eu conheço essas passagens. Mudou rápido né? Nós... eu te conheço Juliana.... Mas, se não quer ir e levar a Julia, não insistiremos, tem outros meios, muitas formas dela conhecer.
Pela mudança de voz e forma como falava, Juliana logo percebeu que algum assombroso estava falando, por tratar-se de conversas desconexas. Contudo, antes que Juliana falasse algo, o marido logo voltou a si, dizendo:
- De que estávamos falando mesmo?
Juliana: Estávamos falando do nosso amor e de quanto eu te amo.
Júlio: Eu também te amo meu amor. E obrigado por tudo que tem feito por mim e por nossa família.
Todavia, todas as noites, antes de ir para o centro de prática de magias e feitiçarias, Júlio dava um beijo e convidava sua esposa para o acompanhar. Juliana sempre arrumava a seguinte desculpa, em revelar que sua maior preocupação era com Julia:
- Meu amor, o Jordan ainda é muito novo e não queria fazer com que ele entrasse no centro ainda. Mas qualquer dia desses eu vou surpreendê-lo e vou acompanhá-lo.
Certa vez, Júlio conseguiu com que uma auxiliar se dispusesse a cuidar de Jordan e apresentou a cuidadora a Juliana, sua esposa. Esta ficou sem ação e, já cansada, pela insistência diária do marido, resolveu aceitar o convite, justamente no dia em que estava com pouca paciência para discutir. Juliana se arrumou e levou Júlia, que pediu para ir com a mãe. Juliano, o primogênito sempre acompanhava o pai.
Ao chegar no centro de prática de magias e feitiçarias, após as tradicionais apresentações, começaram os trabalhos com toques de tambores, e Julia achou interessante o centro e as danças das mulheres, que usavam vestidos brancos e lenço e véu preto na cabeça, enquanto os homens usavam apenas calça preta e um pano vermelho, em volta da cintura, como se cinto fossem, e algum usavam uma bandana vermelha na cabeça.
Enquanto isso, Juliano ficava sentado em uma espécie de trono, usando uma bata negra com para vermelha por dentro e preta por fora e um pano vermelho na mão que usava para fazer um ritual para quem saísse da roda e prestasse reverência, encurvado ao chão. Juliana ficou sentada, em um banco coletivo de madeira que ficava próximo à parede que abrigava os visitantes. Juliana estava com Julia no seu colo e observavam os movimentos ritualísticos comandado por Júlio.
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A ENCANTADORA BRUXINHA ENCANTADA
JugendliteraturLivro aborda a história de Julia Bentez, praticante da bruxaria branca, ensinada por sua mãe Juliana. O seu pai, Júlio Bentez, é praticante da magia negra, sendo o conhecimento herdado do avô de Julia, conhecido como Chiquinho do tambor. Julia tem d...