Memórias

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Assim que abro a porta de casa, o cheiro fresco de café invade minhas narinas e relaxa meus músculos.
Solto a mochila no chão e tiro meus tênis, os deixando na sala de estar antes de correr para a cozinha.

Passo pelo corredor e vejo os quadros gigantescos de papai, alguns recentemente pintados e outros não.
Vejo-me no enorme espelho da sala e também no quadro na varanda.Posso sentir o cheiro fresco de tinta vindo dele, uma obra recente que trás tanto sentimento e conforto.

Fico inebriada com todas aquelas sensações.Me aproximo do quadro, estendendo a mão para que meu dedo fique manchado de tinha e para que eu sinta o papel gelado.

Sei que sou eu ali, lembro-me desse momento e fico feliz por poder relembra-lo dessa forma.
Meu rosto está virado por conta da vergonha, foi tão de repente que meus reflexos agitam por instinto.
Minhas mãos tocavam páginas cheias de letras e ensaios e roteiros, enquanto meus pés se deslocavam do pequeno pedal do piano.

Sorrio ao lembrar da voz de papai me chamando, dizendo que eu estava linda e que não era preciso me esconder.






—Nourriturie.

Não, senhorita Boeth.Tente novamente, Nourritere.—Minha professora diz, como se a língua fosse um chicote e ela estivesse me torturando.

—Ela não vai aprender, Sra.Brian. Pessoas assim...Não tem tanta facilidade como nós.—Uma garota do fundão disse, rindo com as amigas em seguida. Escondi o rosto dentre o caderno e tentei me manter o mais firme possível.

—Shhh!—Sra.Brian esperneia, apontando a caneta para a garota enquanto tenta ao máximo, enfatizar sua expressão irritada.—Continuando, Boeth.

Passo as mãos dentre os cabelos e respiro fundo.Minha mente se enche de mentiras e as destrói ao mesmo tempo, faz com que meus objetivos sejam levados para longe e que a esperança apodreça como uma fruta velha.

Sei que, talvez, isso faça parte da minha grande história fatídica de honra e glória, mas quero pular essa parte.

—Que droga...—Murmuro, tampando o rosto com as mãos enquanto escuto os sussurros covardes e maldosos atrás de mim.

—Sabe que eu não permito palavrões na minha sala, Quinny.—Sra.Brian diz.Sinto que ela quer jogar aquela caneta em minha cabeça, com bastante força.

—É  Quinn.—Corrijo-a, tirando as mãos do rosto e respirando fundo.
E desde quando "droga" é um palavrão?

—Vai precisar de mais aulas de francês, Quinny.

Quinn...—Sussurro, sendo totalmente ignorada.

Meu Deus, como você é chata Sra.Brian!
E por que é tão difícil dizer meu nome corretamente?

Quando o sinal toca, sou a primeira a sair da sala. E tenho certeza de que estou parecendo uma maluca correndo pelos corredores.
Mas eu estou certa, tenho de correr para não me encontrar com o pior.E o pior com toda certeza está me esperando dentro de um carro, do lado de fora dessa escola.

Quando Vincent me mandou uma mensagem de texto a dois dias, não fiquei surpresa. Eu sabia que ele iria falar comigo, que iria me procurar de alguma forma enquanto estava viajando.
Ele perguntou se podia me ligar, e eu respondi que sentia muito pela sua mãe e que sentia sua falta.

The impossibleOnde histórias criam vida. Descubra agora