Minha paixão por livros vem desde pequeno, quando comecei a morar na casa desse senhor. Eu digo "senhor" pois não sei o nome dele. Na verdade ele nunca me disse e, sempre quando perguntava, ele dizia: "Ah, eu sou só um homem velho desejando uma boa morte! Não preciso de um nome para ser lembrado!". Em questão dos livros, comecei a ler os mais simples que ele tinha. Algumas fábulas, crônicas curtas e umas histórias sobre marinheiros. Foi em um desses que aprendi a ler, com a ajuda dele. Eu lembro que, às noites, de frente para aquela lareira (ele amava aquela lareira) sentado na sua cadeira de balanço, ele me colocava no colo, e lia algumas daquelas aventuras clássicas de viajantes marítimos. Ele também me ajudava a entender as palavras que eu tinha mais dificuldade.
Com o tempo, passei a ler sozinhos todos aqueles livros. Havia de todos os gêneros, mas os que eu mais me interessava era os de aventura. Um homem que tomei por inspiração foi Marco Polo, filho de um mercador, que aos 17 anos, junto ao seu pai e tio, traçaram a Rota da Seda em busca de riqueza e aventura. Juntos, eles percorreram por mais de 15 mil milhas em 24 anos! O que me deixa mais animado é saber que tudo isso realmente aconteceu. Graças a outros e principalmente esse livro, é que estou aqui agora, neste barco, para um dia quem sabe, chegar vivo à Ilha. Bem, antes de contar do por que estou nesse barco, contarei tudo que aconteceu antes. Já com os meus 20 anos, juntei todas as minhas econômicas adquiridas com um emprego de ferreiro que fiz, já pensando na possiblidade de uma viajem; Conclui meus estudos básicos e, antes mesmo de entrar na Universidade de Viena, no qual minha mãe sempre tinha sonhado, decidi mudar os planos dela. Claro que ela a princípio não permitiu que eu fizesse tal loucura, apesar da grande quantia que tinha conseguido. Usei o pretexto de que papai não mandava cartas à 9 meses. Na verdade, ele esclareceu já na segunda carta que diminuiria o ritmo, e que enviaria uma a cada 4 meses, mas que multiplicaria o dinheiro. Nessa mesma carta reparei em sua escrita, que parecia estar levemente diferente, tanto no modo de redigir a carta quanto à caligrafia. Nela, ele apenas dizia estar tudo bem, que havia conseguido uma moradia, um bom emprego negociando vários tipos de mercadoria que vinha dos portos financiados por ele e que estava sem tempo para as cartas. Certamente algo estranho tinha acontecido. Além da escrita diferente, seu rápido crescimento na cidade e a falta de preocupação conosco, que pelo menos era seu foco principal, sempre repetia quase que o mesmo discurso, em todas as cartas. Notei que mamãe ficou pensativa naquele momento, andando de lá pra cá como se estivesse pensando em uma ideia genial, ao mesmo tempo em que parecia extremamente apavorada. Nesse instante, eu disse que iria para Roma descobrir por que papai ter diminuído o ritmo das cartas e desvendar todo aquele mistério. Antes mesmo de concluir meu raciocínio, ela diz: "É uma boa ideia .. É uma boa ideia .. Não para Roma, ainda é muito cedo .." Ela falava olhando para o chão, como se estivesse falando comigo e com ela mesma. Andando pra lá e pra cá, eu a segurei pelos braços, interrompi seu movimento, e perguntei: "Mãe, a senhora está bem? Há algo te perturbando?" Ela não conseguia olhar para mim. Olhando para o chão, começou a chorar. Meus olhos começaram a lacrimejar, quando um misto de tristeza e desespero tomava conta de mim. Eu perguntei de novo, mais aflito: "Mãe, me diga, o que aconteceu?!". Enxugando as lágrimas, ela me levou ao quarto, trancou a porta e me disse: "Filho, não há tempo para explicações agora. Quero apenas que vá a onde essa carta diz - Nela havia o endereço de uma casinha - junto a ela há uma chave. Deixe a casa muito bem trancada e não a abra para ninguém, você entendeu?". Sem saber o que dizer na hora, arrumei todas as minhas coisas que podia. Enquanto arrumava, mamãe dizia para ir mais depressa. Mil coisas se passavam em minha mente, mas nenhuma palavra conseguia sair da minha boca. Após ter terminado de juntar minhas coisas, ela ficou me olhando, com um olhar de despedida. Me abraçou forte e disse que me amava, várias e várias vezes. O senhor estava na sala, ouvindo tudo, mas se recusou a falar algo. No estado em que eu estava, não pensei em me despedir dele. Ela trancou a porta, mas eu ainda fiquei por lá, do lado de fora, escutando a conversa entre o senhor e minha mãe. Lembro me apenas da frase do meu senhor: "Já chegou a hora?" Ela disse: "Sim, está pronto?" Ele concordou com a cabeça. Em seguida, fui o mais rápido possível, como mamãe tinha dito, para a tal casinha. Queria muito ter ficado por lá e ajudar a mãe seja lá o que tivesse acontecendo. Infelizmente, nesse caso, tive que ser obediente a ela. Até hoje não sei se tomei a decisão certa. A casa não ficava muito longe dali, mas foi construída em um lugar bem escondido. As árvores e a vegetação do local escondia a moradia. Nela havia uma mesa, uma cadeira e uma cama. Em cima da mesa, mais uma carta. Já era noite quando tinha chegado por lá. Apesar do horário, não conseguia dormir. Queria muito deitar minha cabeça, acordar e perceber que aquilo tudo era apenas uma história de fadas que eu tinha sonhado. Sentei na borda da cama, levei a mão na minha cabeça, pensando em tudo que poderia ter acontecido. Será que alguém estava atrás dela? Ou tudo aquilo era apenas um devaneio de minha mente sonhadora? Só o tempo dirá. Depois que me acalmei um pouco, peguei a carta sobre a mesa e, com muita calma, comecei a ler.
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O Manuscrito Venicci
Science FictionEu, Lorenzzi di Viena, escrevo essa carta, certamente sem destino, para relatar e documentar tudo o que sei é descobri até agora. Algumas dessas coisas que serão contadas nesse livro não podem em hipótese alguma parar nas mãos da Igreja. A você, dou...