Alvorada

Acidente

 Naquela manhã, quando abriu os olhos, sonolenta, percebeu um tipo de luz diferente penetrando as cortinas. Ela era mais clara do que de costume e o chão estava mais frio do que de costume quando se levantou ainda descalça indo rumo a janela.

Olhou para fora, vendo a mesma camada fina e branca cobrindo as árvores, congelando formas variadas nas pontas dos galhos.

Mais neve. Para seu eterno e profundo desgosto.

Como se já não bastasse o frio. Como se já não bastasse não dormir com o assobio dos ventos. Como se não bastasse a chuva. Como se não bastasse aquela sensação incômoda constantemente nos seus sonhos.

Como se não bastasse sentir as orbes cinzentas da Zaunita lhe observando todas as noites.

Podia jurar ver sua silhueta se esgueirando pelas sombras do quarto. Encarando-a, que nem da primeira vez. Os olhos claros penetravam aquele sentimento: medo.

Sentia-se vulnerável quando dormia com o pressentimento de não acordar novamente. Por isso, quando abria suas orbes e via o cenário nevado, o alívio tomava conta de seu peito. Mesmo não sendo a fã número um da neve pelas calçadas.

O pior era que a chuva da véspera havia se solidificado ainda mais, deixando o quintal branco assim como o horizonte, coberto pela neblina e o ar gelado.

Morar com Tobias era quase que morar sozinha, pois ele saía muito cedo e normalmente voltava tarde.

De certa forma, pode usufruir bem desse tempo a só. Seus devaneios podiam ser melhor escutados e tinha tempo de sobra para pensar se realmente faltaria a aula daquele dia.

Cair por si própria no chão completamente seco e liso era tão fácil, então matar aula em um mísero dia não faria com que ela perdesse uma horda de conteúdos.

O único problema é que se faltasse, perderia mais uma oportunidade de fitar aquele tom acinzentado tão... sedutor, e... perigoso.

A azulada estava mais animada para ir para escola do que estaria comumente, principalmente num dia como esse.

Ela sabia exatamente o motivo disso.

Não era pelo seu novo grupo de amigas e muito menos pelo ambiente de ensino e aprendizagem.

O entusiasmo todo era provocado pela presença da Warwick. Mesmo sabendo que nessa mesma presença sentia a sensação da morte não estar muito longe.

Podia estar maluca, ou, Zaun realmente estava lhe deixando paranoica.

A segunda opção era mais plausível, em sua humilde e sem importância opinião.

Com todo esforço e concentração que conseguiu acumular depois de incansáveis minutos respirando fundo, finalmente saiu de casa, indo enfrentar o chão deslizante.

Foram duas. Duas infelizes vezes que no caminho da escola escorregou e quase caiu. Bem, das duas quase vezes que ela caiu, por alguma sorte desconhecida foram em locais menos movimentados e ninguém passando viu.

Porém, a vergonha tomava conta de sua mente cheia de pensamentos voltados a Warwick. E parando para analisar, o dia no colégio seria totalmente resumido a isso: cair e passar muita, muita vergonha.

Talvez ficar em casa não fosse tão má ideia assim.

Os olhos penetrantes azulados ainda estariam lá no dia seguinte, certo? Não havia como ter essa certeza, e era tarde demais para desistir, uma vez que já se encontrava no estacionamento da instituição.

Ainda era cedo, tipo uns bons dez minutos antes de começarem as aulas. Odiava esse costume de ser tão adiantada que nem sua mãe. Isso rendia esperas e muita perda de tempo. E em outros casos, era ótimo, mas não deixava de ser algo desnecessário como por exemplo para chegar na droga escola.