2 - E caem na terra viva

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    Desde que o jogo e as regras foram anunciados, eu me mantive em silêncio e pensando no porquê estavam fazendo aquilo. Eu sabia que tentariam nos aproximar, para depois pedir que a gente mate um ao outro. Assim, a pessoa viva ficaria traumatizada pelo resto da vida, mas a questão é que eu já estou traumatizado, desde que vi aqueles monstros devorarem o meu melhor amigo bem na minha frente.

Mas talvez eu estivesse enganado. E foi apostando todas as minhas fichas nesse mísero talvez que eu me senti disposto a conhecer mais o Max, mesmo que ele tenha esse jeito meio sério de poucos amigos e de quem odeia conversas.

  Estava a observá-lo enquanto acendia a fogueira, não deixando muito perto da barraca, mas também não tão longe dela. Ele parecia saber fazer aquilo há muito tempo, deduzindo pela forma como sabia as técnicas certas para que o fogo acendesse mais rápido.

Assim que terminou, ele se sentou em uma pedra que estava ao meu lado, porém um pouco afastada. Sabia que ele queria falar, mas não sabia como começar.

── Me diga o básico sobre você, não vim aqui para fazer amiguinhos ── sem me olhar diretamente.

── Você é sempre assim tão rude? ── vi ele piscar diversas vezes.

── Apenas com pessoas incovenientes ── ai.

── Tenho dezoito anos, e você? ── tentei algo fácil.

Ouvi ele bufar em frustração. Provavelmente desejando que eu explodisse.

── Dezoito também

── Onde morava? É...mora, quero dizer ── perguntei, ainda olhando para ele.

── Krabi ── respondeu simplesmente, fazendo uma longa pausa em seguida. ── E você?

── Em Krabi também ── adverti. ── Há quanto tempo está aqui? ──

E mais uma vez ganhei o seu silêncio. Ele estava inclinado para frente, com as mãos sobre o joelhos e entrelaçadas. Por uma curta fração de segundos seu rosto se virou para mim, e eu tive a visão do seu olho escuro e meio fundo -provavelmente pelo sono-, a franja cobria a metade do seu rosto que estava com o curativo, e de alguma forma, aquela maldita franja tornava ele mais intimidador.

── Cerca de cinco meses...── sua voz continuava no mesmo tom.

── Parece meio irreal pensar no tempo aqui ── proferi. ── Muitas vezes eles me disseram anos errados para me atrapalharem na contagem, como hoje de manhã, me disseram que estávamos em 2045, ou algo assim ──

Ele não disse nada, e eu também não disse mais nada, apenas fiquei brincando com um galho pequeno que catei do chão.

── Está aqui faz quanto tempo? ── ele me perguntou, fazendo minha atenção voltar-se para ele novamente.

── Um ano e meio ── Max me olhou, esperando algum sinal de brincadeira, mas não era.

No final do meu primeiro dia aqui, quando me perguntaram o que eu queria de suprimentos, disse um kit de primeiros socorros, um caderno e uma caneta, onde comecei a anotar dia, mês e ano todos os dias. Talvez se eu não tivesse feito isso, já teria ficado completamente louco.

── Sinto muito.

── Você se lembra dos seus familiares? ── e eu vi um brilho no seu olho, mas era pelas lágrimas acumuladas.

── Me lembro de ter pais muito carinhosos, mas seus rostos e nomes são desconhecidos por mim ── respondeu.

Inicialmente achei que tivesse uma péssima relação com os seus pais, a julgar pelo seu jeito de se portar. Tenho que parar com a terrível mania de fazer análise nas pessoas que acabo de conhecer.

Jogador 59 - [LGBTQIA+]Onde histórias criam vida. Descubra agora