Interlúdio: Recomeço

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Interlúdio: Recomeço

Todas as noites, assim que fechava os olhos, Wednesday era teletransportada para o mesmo local. De pé, em um enorme salão repleto de pessoas, encaradas nada sutis queimavam suas costas, sussurros invadiam seus ouvidos e uma voz rouca temia escapar de sua garganta, rogando por perdão, por outra chance, por esperança. A voz não saia, mas a dor presente em cada poro de seu corpo vazava e a dominava completamente. A Addams estava estática, encarando uma Enid em prantos, decepcionada e enfurecida. Um misto de emoções era visível no rosto da streamer, e ela as mostrava ao público sem receio.

Wednesday estremeceu quando Enid, chorando, lhe virou as costas. Suas últimas palavras ainda vibravam forte em seu cérebro e a cada novo soar um pedaço de seu coração era destroçado.

"Se você queria tanto ficar sozinha, Wednesday, fique sozinha."

A cantora não pôde se mexer. Ela mal se virou. Algo colova seus pés no chão e sufocava sua voz na garganta.

Nada foi dito. Nada foi feito.

Enid partiu.

Partiu de novo. E de novo. E de novo.

Infinitas vezes Wednesday viu os resultados de suas ações, de sua estupidez, de sua covardia e de seu medo. Ela os reprisou no cérebro como um disco arranhado que só toca a mesma música.

Torturante.

Era uma tortura completa, mas os pesadelos funcionavam como um purgatório para seus pecados e o inferno do qual ela fazia parte agora. Todas as noites Wednesday relembrava que, graças ao seu egoísmo, ela perdeu a única pessoa que amou, a garota cuja lhe ensinou que cores são bonitas, arco-íris são majestosos e algodão doce pode ser gostoso.

Para Wednesday, Enid não somente lhe ensinou a amar, mas também lhe deu forças para conhecer o novo, enfrentar desafios pessoais e seguir em frente. A Sinclair foi um pilar que sustentou sua vida e a impediu de cair, mas o pilar rachou, tornou-se fraco e desmoronou. Ele soterrou Wednesday com seus escombros e manteve a Addams em uma prisão escura. Ali só havia mágoas, lamúria e uma quantidade avassaladora de arrependimento.

Era culpa dela. Obviamente era.

Ela não falou a verdade por medo, não foi atrás de Enid por medo e a abandonou por medo.

Não tão forte quanto aparentava, agora Wednesday era apenas uma mulher vazia, quebrada e desestabilizada. Mas acima de tudo, ela estava completamente amedrontada.

Quase duas semanas depois de deixar Jericho, Wednesday encostou a cabeça no travesseiro outra vez, esperando, repleta de uma ansiedade negativa, pelo pesadelo já decorado.

Naquela noite, a Addams voltou de seu primeiro show em Nova Iorque, e no dia seguinte já estaria preparada para embarcar no avião e partir para o próximo local. O combinado era aguentar os seis meses de turnê, e usá-la como motivo para esfriar a cabeça, conhecer novos ares e recuperar um pouco de sanidade.

Quando subiu no palco, entretanto, Wednesday não se sentiu uma cantora, tampouco uma artista. A voz saiu de sua garganta de forma robótica, e por mais que implorasse fervorosamente para seu cérebro funcionar normalmente, nada adiantava e seus olhos vagavam pela multidão de fãs procurando algo, alguém, ela. Enid não estava lá, nunca esteve, mas a Addams mantinha uma frágil, ignorante e estúpida esperança de que a Sinclair a veria. Era aquilo que a mantinha viva, de pé e cantando.

E então, o show acabou, ela foi elogiada, tirou fotos, cumprimentou fãs e fingiu estar bem quando lhe perguntaram sobre Enid. Obviamente todos já sabiam.

Wenclair: Chaotic RomanceOnde histórias criam vida. Descubra agora