Capítulo 8 - NICOLAS

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5 ANOS ANTES

Abro a porta que dá acesso ao terraço da escola e cubro o rosto enquanto minha visão se ajusta à luz. Mais a frente vejo a sombra de alguém encostado sobre uma mureta.

Marina tem os olhos fixos na paisagem. O prédio de cinco andares nos proporciona uma boa visibilidade da cidade e do pôr do sol no horizonte. A paisagem favorita dela.

Nina evita amizades, pois nunca sabe quando precisará trocar de família, mas acho que eu fui o único que realmente insistiu e fez com que ela abrisse uma exceção e que bom, pois eu também conto todos os meus maiores segredos a ela. A ajudo em suas crises de ansiedade, vou com ela depois da aula uma vez por semana no psicólogo, a ouço gritar o quão insatisfeita está, a admiro sorrir e fingir ser forte quando percebo que não aguenta mais. Gosto de fazê-la esquecer por um momento que seja do caos que é a realidade. Então aqui em cima falamos de tudo, brincamos, rimos, contamos piadas e às vezes não falamos nada.

Sento-me ao seu lado, entretanto ela não parece notar que cheguei. É como se somente o corpo estivesse aqui e os pensamentos há anos luz de distância.

Me remexo mais um pouco, para me aproximar, encosto a cabeça na mureta e apoio os braços no joelho. É melhor não a incomodar, sei como ela valoriza os momentos de solitude. Então espero na posição que acho mais confortável no momento...

Sinto sua cabeça se apoiar em meu ombro antes mesmo de concluir o pensamento.

— Estou com frio — Finalmente diz.

Abro os braços para que ela se aconchegue melhor e não digo muito, pois sei que no momento certo ela vai se abrir sobre o que a incomoda se achar necessário. Entretanto sei que agora apenas preciso mostrar que estou aqui.

Lembro de quando tentei a abraçar pela primeira vez. O tempo estava frio com rajadas de vento e estávamos sem blusa. Observei os pelos dos seus braços eriçados e abracei para aquecer, esperava algum tipo de agradecimento, mas a resposta que tive me surpreendeu:

— O que você está fazendo? — Questiona ainda envolta em meus braços

— Eu...hmm, estou te dando um abraço

Ela ri como se eu tivesse dito algo idiota

— Isso eu sei, mas por quê?

Percebo pelo seu tom de voz a sinceridade da pergunta e estranho, mas respondo a verdade.

— Você está com frio, então vou te aquecer.

Marina assente e eu a aperto mais. Ela não parecia estar acostumada com esse tipo de comportamento. Abraços deveriam ser obrigatórios para todo ser humano.

E desde então, sempre que ela diz que está com frio eu sei exatamente o que fazer, mesmo que esteja de moletom.

— Eu gosto dos nossos encontros ao pôr do sol. — Acrescenta

— Eu também. — Respondo.

Nuvens escuras começam a se formar no céu depois que resta apenas uma fração do pôr do sol. O vento está frio como um alerta para uma possível chuva.

— Eu vi o que aconteceu no jogo hoje — Nina ergue os olhos e me encara

Prendo os lábios e reclino a cabeça. Não queria que ela tivesse notado

— Eu não queria atrapalhar — Acrescenta.

Por que ela sempre acha que é um incômodo pra mim?

— Não foi culpa sua Nina, eu somente me distrai

— Pode admitir, eu sei que é difícil não notar minha extraordinária beleza. — Nina joga o corpo contra o meu me fazendo rir

— Ei, não precisa exagerar também — Rebato

Ela dá de ombros, ainda com um sorriso no rosto.

— Está tudo bem, foi só um treino — Reafirmo. — Me conte como foi seu dia, aconteceu alguma coisa? Estou te achando mais quieta que o normal

Marina se levanta, olhando para o céu e limpando as mãos na calça jeans, como se fosse embora. Parece que levantei um muro gigante e espesso entre nós, seja o que tenha acontecido, com certeza foi algo muito pior do que eu imaginava.

— É melhor irmos antes que a chuva nos pegue — avisa.

— Tem razão — Deixo Nina pensar que realmente vamos embora. Levanto e começo a sentir pingos gelados pelos meus braços.

Ela começa a recolher suas coisas e coloca a mochila nas costas, sem terminar de guardar todo o material, mas antes que alcance a maçaneta da porta eu a seguro exibindo o meu sorriso mais conquistador

Ela sorri enquanto a chuva molha seu rosto.

— O que você está fazendo?— Ela pega um dos cadernos e cobre a cabeça. — Vamos ficar encharcados.

— É essa a intenção

Com uma das mãos em sua cintura a puxo para mais perto e com a outra livro-a dos cadernos e da mochila.

As gotas de água cada vez mais constantes escorrem pela sua pele, seus cabelos, olhos e boca seduzindo meu olhar para cada detalhe.

Ela sorri, ansiando pelo que está por vir e é daquele jeito feliz, me fazendo sentir o menino mais sortudo do mundo.

Seguro uma de suas mãos ao alto e a conduzo em uma dança desengonçada. Começo a cantarolar uma música romântica enquanto contornamos todo o terraço. Rodopiando e indo para trás e para frente. Ela solta altas gargalhadas quando pisa sem querer em meu pé ao mesmo tempo em que somos consumidos pela chuva e as rajadas de vento. Ela joga o corpo para trás enquanto giramos, fecha os olhos e deixa a água escorrer. Marina tinha razão, estamos de fato encharcados, mas vale o preço por sua alegria.

Ficamos assim por um tempo, e não me incomodo com a dor dos pés e muito menos com o frio. Cada sorriso me enche de adrenalina e aquece mais um pouco meu coração.

Ela ergue o olhar novamente quando já não sei mais o que cantarolar e me fita. Seus olhos brilham, a pele cintila, os lábios estão semiabertos soprando sua respiração quente contra a minha pele. Nunca a vi tão bonita! E foi ali, naquele momento. Isento de tudo e todos, encharcado, com o dedo doendo e com frio que eu percebi o quão apaixonado estava. Por que não importava essas coisas, era indiferente o lugar ou em que condições estávamos, desde que estivéssemos juntos.

DEPOIS DO PÔR DO SOL - Romance Cristão (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora