Capítulo 18

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A porta se abre revelando um mundo de enlatados. Prateleiras do chão ao teto em cada canto da parede e mais quatro no centro do cômodo. Nos esgueiramos entre uma delas ouvindo apenas o sopro de nossa respiração e os batimentos acelerados.

Ele sorri despretensiosamente, como se não acreditasse no que vivenciou hoje, e pra ser sincera, acho que estou na mesma forma.

— Faz sentido – digo observando o lugar. Ele é apertado devido às prateleiras que nos cercam, cheias de vidros com pimentas, pepinos, azeitonas e algumas latas. Uma lâmpada acima de nossas cabeças pisca algumas vezes quase apagando completamente.

— Sim – Nicolas concorda. — Uma dispensa ao lado da cozinha, é lógico. Devia ter previsto isso

Rimos e só quando me acalmo que eu percebo sua mão ainda envolta do meu braço. A adrenalina da fuga, mais o lugar novo, provavelmente foi o fator decisivo para ele não ter reparado ou talvez tenha percebido e não quis soltar. Não sei qual opção me conforta mais.

— Você reluziu naquele palco, Nina. Você nasceu para estar ali — Ele me encara.

Meu coração erra uma batida ao ouvir aquilo, pois foi exatamente o que eu senti, como se ali fosse o meu lugar.

— Sério? Ali naquele palco de madeira quase caindo aos pedaços? – Tento descontrair o momento.

— Você sabe do que eu estou falando — eleva os lábios em um breve sorriso.

— Sim, eu sei. Fiquei com medo no começo, principalmente no solo que estranhamente a Sara disse que não poderia fazer.

— Eu não sei nada sobre isso... — Ele ergue as mãos ao alto. — Foi uma surpresa pra mim tanto quanto para você.

— Eu duvido muito disso, mas de qualquer forma fico feliz de ter conseguido e tudo isso porque vocês me deram força. — Levo minha mão ao colar de girassol lembrando-me de que não preciso temer, não estou sozinha

Os olhos de Nicolas derrapam para as minhas mãos, ele sorri ao ver o colar e quase posso ver seus olhos se encherem de lágrimas, como se isso despertasse alguma lembrança.

— Eu fico ainda mais feliz por te ver se saindo tão bem. Foi uma atmosfera incrível hoje!

— Esse lugar está quase caindo aos pedaços, tudo tão precário, no meio do nada, e mesmo assim eu senti Deus de uma forma que não sentia há muito tempo – Revelo.

— Deus é especialista em ver o belo onde não vemos.

— Foi incrível!

— Foi Mesmo! Você tem um propósito lindo através da música, eu tinha certeza disso. Quando Ele te criou já sabia o que seria, o que se tornaria. Você aqui hoje, vivenciando essa experiência, não foi coincidência, foi Deus.

Apesar do que vivi minutos atrás, não consigo deixar de pensar no tanto que sofri, e nas coisas que sinto quando estou sozinha. Isso me faz questionar se eu realmente estou nos planos de Deus. Sem saber como reagir às palavras de Nicolas, opto por mudar o assunto.

— É claro que eu não posso deixar de dizer que você foi sensacional, eu nunca tinha te visto em um palco, foi uma novidade pra mim. É difícil te diferenciar daquele garoto recolhendo os cones no campo de futebol.

— Eu ainda sou o mesmo, só com um futuro diferente do que imaginávamos.

— Como isso aconteceu? Como renunciou à medicina pela música?

— Boa pergunta — Ele parece pensar na resposta, desvia o olhar do meu como se procurasse as palavras certas. Sua mão vai a nuca, porém bate o cotovelo na prateleira atrás de si. Um vidro de picles em conservas balança por causa da prateleira solta, por mais que Nicolas já tenha desencostado o vidro continua balançando. De soslaio vejo que está prestes a cair em sua cabeça. Rapidamente me aproximo e seguro ele por cima da cabeça de Nicolas, suspiro aliviada ao impedir uma tragédia.

DEPOIS DO PÔR DO SOL - Romance Cristão (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora