Capítulo 9

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Um brilho intrépido surge no céu escuro acompanhado de um som estrondoso. Um arrepio percorre todo o meu corpo. De súbito volto a prestar atenção na estrada, procurando por qualquer local que pareça seguro parar.

Os trovões se tornam cada vez mais altos e frequentes, ofuscando nossos pensamentos. Em meio à visão turva e do balanço agitado das árvores, vemos um carro parado no acostamento da estrada. O capô do veículo está aberto e dois rapazes estão curvados analisando o motor. A chuva não parece ser o maior de seus problemas.

Sara se posiciona entre os pais, atenta ao veículo parado. Sua testa está franzida e os lábios em linha reta, como se mil pensamentos rodeassem sua cabeça, quase consigo ouvir as engrenagens girando.

— Querido, você vai parar para ajudar aqueles moços? – Questiona Tia Tereza

— Não sei se consigo, é arriscado parar aqui, a casa móvel é muito grande. —Responde.

Minha prima volta a se sentar ao meu lado, pega o celular e vasculha as redes sociais.

É sério isso? Como ela consegue estar tão calma?

— Eu sabia que os conhecia de algum lugar — Em um movimento abrupto Sara estende a tela do celular para que eu veja, mas o chacoalhar do motorhome me impede.

Tio Marcos olha os retrovisores, ainda indeciso sobre o que deve fazer. Aos poucos o trailer perde velocidade e em seguida dá sinal para estacionar.

Ele desce em meio à chuva com apenas uma blusa por cima da cabeça. Os rapazes vão até meu tio e uma conversa se estende. Não é possível ouvir nada e não conseguimos enxergar nitidamente. Com certa dificuldade parecem pegar algumas mochilas no carro. Continuo atenta a janela, procurando ver melhor a situação e se vão entrar aqui.

Sara se levanta empolgada e trabalha arduamente em busca de tolhas para os novos viajantes. Ela parece tão distraída que não percebe a bagunça que acaba fazendo. Interrompendo a minha curiosidade, vou ajudá-la.

— De onde você conhece aqueles rapazes? – Questiono enquanto empilho algumas toalhas no braço.

Sara agradece a ajuda e sorri de orelha a orelha pronta para me contar o motivo de tanta empolgação, entretanto antes que tenha a chance de me explicar, a voz grave de um deles se torna familiar.

— Olá— Diz — Me desculpe, eu estou molhando tudo aqui.

Estremeço ao ouvir cada palavra. É grave e sedosa ao mesmo tempo e uma sensação de familiaridade me envolve, como se eu devesse conhecê-la. Ainda de costas e com as toalhas sobre o braço, forço-me a buscar o mais profundo possível na memória. Talvez se eu associar ao rosto seja mais fácil.

Miro o rapaz rente às escadas do trailer, receoso se deve mesmo entrar ou não.

Seus tênis estão encharcados, a calça jeans pesada e a camiseta grudada ao corpo, moldando suas formas musculosas. Água escorre de seus cabelos lisos por todo o rosto, fazendo o ajeitar o cabelo a todo instante para evitar que continue pingando em seus olhos. E são através deles, dos olhos verdes que eu o reconheço. É claro, como poderia esquecer aquele dia?! Quase fui presa.

Lembro-me da sua voz cantando, deve ser por isso que ela me pareceu familiar de um jeito diferente. É o rapaz que se apresentou no programa de televisão no dia em que eu estava na delegacia.

Ele olha para trás esperando pelo seu companheiro, depois se vira de novo para dentro do trailer, ainda indeciso.

Rio da situação, quais as chances? Com vidas tão opostas e vivendo extremos completamente diferentes, aqui estamos. Mas diferente da noite na delegacia, dessa vez eu também sou visível para ele e isso o parece assustar.

DEPOIS DO PÔR DO SOL - Romance Cristão (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora