Capítulo 03

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"But the real world is
different from what's promised
We need to run, we need to step on it
There's no sceneries at all
Until your breath comes up to your chin"
– Paradise, BTS

Shin Soomin

É muito louco pensar que a percepção do tempo varia de pessoa para pessoa. E, na maioria das vezes, essa percepção é bastante injusta. Nos momentos em que nos encontramos no ápice da felicidade não percebemos o tempo passar, isso porque é algo bom. Agora, caro leitor, quando estamos em um momento difícil, não há coisa alguma que faça o tempo passar mais rápido.

Perceba como as coisas são inversamente proporcionais. É como um eclipse. Quando prevê-se que um desse vai acontecer, muitos se preparam para presenciar o fenômeno, passam dias se planejando, mas no final são apenas alguns minutos de euforia, na grande maioria das vezes.

Não que isso não valha a pena. O ponto é: passamos muito tempo da vida nos agarrando aos nossos objetivos (e não, isso não é errado), mas não aproveitamos o caminho que percorremos. Pense... Quantas coisas você não presenciou apenas essa semana mas a deixou se perder em seu subconsciente?

Desde a morte da mamãe, penso muito sobre a efemeridade do tempo. Principalmente ao olhar para Nabi e vê-la cada dia mais crescida. Dói admitir isso, mas por mais que eu tenha apreciado cada segundo ao lado de minha mãe, é sem a presença dela que realmente percebo o quanto eu poderia ter aproveitado mais.

Lembro de vê-la chegar do trabalho com um sorriso largo no rosto, dando um beijo em meu pai e nos recebendo calorosamente em seus braços.

Lembro da sua habilidade sem igual na cozinha, sempre se aventurando em receitas novas e louca para ver a nossa reação ao prova-las.

Lembro de cada vez em que eu a chamei para falar sobre as minhas primeiras vezes. O meu primeiro dente de leite a cair, o meu primeiro prêmio escolar, o meu primeiro beijo...

E em todas as vezes eu acabava em seu abraço, com a cabeça apoiada em seu ombro e sentindo seus dedos acariciarem meus cabelos. Ela sempre estava lá por mim.

Por outro lado, penso muito em como são as coisas onde ela se encontra agora. Não vou mentir, não sou uma pessoa muito religiosa mas gosto de acreditar que perto de mim, num plano logo ali, Xi-Wang, minha querida omma, guarda a mim e meus irmãos todos os dias. E quem sabe meu pai também, seja lá onde e como ele estiver.

Isso, de uma forma instigante, se aproxima muito do meu trabalho. Ser enfermeira é viver pelos corredores de hospitais. E, se tem uma coisa que mexe muito comigo, é entender que o hospital é um lugar de energias de todos os tipos. Talvez por isso eu me entregue tanto à profissão e tenha tanto respeito pelos pacientes, seus familiares e meus colegas de trabalho.

No mesmo hospital podemos encontrar dois tipos de situação ao mesmo tempo: o nascimento e a morte. O início e o fim. A introdução e o desfecho. A apresentação e a despedida. O prólogo e o epílogo.

Apesar de ser uma coisa complexa e que exige amadurecimento para entender, eu consegui isso aos poucos, dia após dia, em uma luta incessante contra o luto. Afinal, quando nos dizem que "a dor diminui com o tempo" estão balbuciando palavras em vão. A dor se camufla, mas não vai embora.

Ainda assim, procuro não deixar essa dor aparecer no meu dia a dia. Não desfrutamos de uma vida luxuosa, nossas condições são básicas e arrisco a dizer que abaixo da média do país. Fora a situação com o meu pai, que se recusa a aceitar a morte de mamãe e está se perdendo no meio do caminho.

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