Capitulo Seis - Borboletas no jardim

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Me desperto com a luz do sol em meu rosto, nunca pensei que Cardedeu fosse tão ensolarada assim. Percebo que eu me esqueci completamente de fechar a janela e a persiana, o que me faz acordar bem cedo e com uma sensação de que estou ficando gripado pois minha garganta está um pouco dolorida.

Sinto o cheiro de café - o melhor cheiro que eu poderia sentir neste momento - vou ao banheiro, escovo meus dentes e arrumo estes meus cachos que mais parecem uma pequena juba desgrenhada, saúdo ao Sergio que está saindo para o trabalho e pego logo uma xicara grande para tomar um gole deste café. Sergio se despede e sai pela cozinha, logo em seguida ouço a porta batendo e ele saindo de carro.

Me bate uma tristeza tremenda em ficar sozinho - nos últimos meses e não tenho ficado só nenhum momento da minha vida, sempre estou acompanhado por alguém - mas não deixo que este sentimento tome conta de mim. Penso que devo ocupar urgentemente meu dia - que por ter acordado tão cedo assim, será muito longo - e vou direto ao meu quarto para fazer uma pequena lista de o que eu posso fazer neste dia. Procuro em meu celular parques, bares, museus, tudo que eu posso me ocupar. Seleciono uma porção de lugares legais e enquanto escrevo, olho para a janela ainda aberta, vejo as plantar mortas e neste momento sinto uma vontade muito grande de cuidar disso.

Me levanto e vou fazer uma pequena avaliação de como estão as coisas por ali - percebo que este jardim nunca foi um jardim - vejo que as jardineiras estavam com várias plantinhas mortas, mas havia uma jardineira que ainda tinha vida. Parei por um segundo para observar o espécime que sobrevivia ali, em meio a séculos sem água, pegando toda a luz do sol e resistindo a tudo que aconteceu, vejo o quão forte e persistente ela foi - me deu inveja dela, pois estas duas características eu não tenho - ela ainda estava bastante machucada, mas viva e com pequenos brotos em sua raiz, ela não era tão bonita, mas o significado dela naquele momento tinha mais sentido que sua beleza.

Retiro esta jardineira, levo à área de serviço e começo a retirá-la da terra, organizo seu vaso e logo em seguida separo teus brotos, replanto tudo e enquanto faço, sinto um preenchimento tão grande em meu coração, como se com este pequeno ato - coisa de velho - eu começasse a entender o que essa pequena Aloe Vera passou e absorvesse algum aprendizado disso, assim como ela extraiu nutrientes de um terreno completamente infértil. Retorno à minha varanda, limpo tudo, coloco as jardineiras - algumas vazias - ao seu devido lugar, lavo minhas mãos e após secá-las, adiciono em minha lista um novo local a visitar: Floricultura.

Volto à cozinha, tomo mais uma xicara de café e enquanto preparava uma torrada me lembro do pequeno momento que tive ontem no fim da noite, percebo que eu não me apresentei e nem perguntei o nome dele, que não prolonguei a conversa e que não fiz nada além de existir.

- Idiota - digo em voz alta, brigando comigo mesmo - como você pode ter sido tão tonto?

Ouço um barulho vindo da lavanderia e tomo um grande susto ao ver uma senhora com um balde e um rodo na mão. Ela não parece nada assustada com minha presença e me olha nos olhos com uma expressão de curiosidade.

- Qué te passa cariño? - me diz com um tom de voz calmo e acolhedor - Tudo bem? Porque está tão chateado assim?

- eh... hmm... - gaguejo, ainda assustado pois não sei quem é ela, como ela foi parar ali e porque me olha assim com tanta... preocupação.

- Ah, perdona-me. Me chamo Peña, mas pode me chamar de abuela. Todos me chamam assim por aqui. - Ela me diz percebendo toda a confusão que existia em mim através do meu rosto.

- Me chamo Hugo... hmm. Prazer. - Respondo, ainda afetado pelo susto.

- Sou a faxineira do prédio - se explica, claramente tentando me deixar mais calmo - Sérgio me disse que você estaria aqui, mas acho que ele não te avisou, né?

Aquilo Que Já Partiu Ainda Deixa Marcas (ROMANCE LGBTQIA+)Onde histórias criam vida. Descubra agora