A pista de boliche tinha uma iluminação a meia luz o que era perfeito para esconder a minha cara de derrota. Eu estava com o rosto apoiado sobre a mesa enquanto Mattheo e Tyler disputavam os pontos na pista. Eles pareciam se divertir, o que era um pouco estranho já que viviam se confrontando na escola. Mas eu lembro de quando Mattheo me apresentou para Tyler e o clima entre eles naquele dia dava a entender que em algum momento já haviam sido amigos. No entanto, nenhum dos dois nunca mencionou nada da relação deles para mim e nem o porque de Mattheo ser tão avesso a Tyler.
Eles conversaram sobre alguma coisa e depois Theo olhou na minha direção e sussurrou no ouvido de Tyler antes de se afastar da pista.
— Você não gosta de boliche? – perguntou ele sentando ao meu lado.
— Para ser sincero essa é a minha primeira vez – digo, mas logo me arrependo de não ter formulado uma frase que soasse menos virgem possível.
— Interessante – é tudo o que Tyler responde e não consigo decifrar a sua expressão. — Não é tão difícil quanto parece e eu posso ajudar você.
Por causa do barulho ao redor Tyler estava com o rosto próximo demais do meu e a música me deixava um pouco zonzo. Ele pediu para que eu levantasse uma das mãos e dobrasse os dedos para frente. Em seguida, juntou a ponta dos seus dedos aos meus ajeitando a posição deles. Ouvimos um estalo sobre a mesa quando Theo largou a bandeja com os hambúrgueres, os refrigerantes e o suco e partiu para cima de Tyler.
— Se você colocar as mãos nele de novo eu te arrebento! – ameaçou Theo o segurando pela paleta do blazer.
— Tá-tá tudo bem – disse. — Ele só estava me mostrando como carregar a bola de boliche.
— Uh. Tem certeza? – indagou ele virando para mim e eu balancei a cabeça. Theo passou a mão pelo cabelo, envergonhado.
— Sabe, eu não faria nada sem o consentimento de Nick. Não fazia ideia de que você levava tão a sério as minhas provocações – diz ele se afastando de mim.
— Cala essa boca – retrucou sentando ao meu lado mas evitou nos encarar. — Me desculpem, eu acabei exagerando.
— É cla.. – tento dizer mas sou interrompido.
— Não – fala Tyler com a voz ríspida.
Theo apoia os cotovelos na mesa e se inclina para frente o desafiando a repetir o que disse. Minha respiração para. Eles não pretendem começar a brigar ali, certo? Talvez não devêssemos ter vindo. Começo a pensar em uma forma de quebrar aquela tensão no ar mas Tyler se levanta antes que eu consiga dizer qualquer coisa.
— Uma partida.
Theo e eu nos entreolhamos sem entender e voltamos a olhar para ele.
— Uma partida – repete ele. — Você me derrotou todas as vezes em que competimos, eu quero uma revanche.
Então era disso que tratava. Meu corpo relaxou. Theo ficou de pé e empurrou a bandeja para o centro da mesa.
— Está bem. Mas não me culpe se você perder novamente – provocou ele.
— Humpf – desdenha Tyler. — Vamos logo.
— Ainda não. Eu acabei de trazer os hambúrgueres, não seria legal deixar Nick comendo sozinho.
— Tem razão.
— Ah, não precisam se preocupar comigo. Podem ir – digo, mas os dois me ignoram e volta a se sentar.
Cada um pega o seu da bandeja e eu levo o canudinho que está no copo à boca mas não sugo nada. Minha cabeça não consegue parar de pensar em como vou fazer para recuperar o diário. Eu nem conhecia aquele garoto. E se ele já tivesse encontrado o diário? E se ele estivesse lendo naquele exato instante? Não iria demorar muito para ele descobrir quem escreveu. Tirei o canudinho seco da boca e mordisquei o hambúrguer. Estava tão concentrado nos meus pensamentos que nem havia notado os olhares me encarando e me dou conta de que suspirei em voz alta. Eu pigarreei para disfarçar e eles desviaram o olhar.
— Você não parece muito animado – comenta Tyler.
— Eu estou, é só que não sei muito bem como fazer isso – falo, o que não chega a ser uma completa mentira.
— Eu lhe disse, não é tão difícil quanto aparenta. Já sei – diz ele colocando a mão no meu ombro naturalmente como se estivesse esquecido da ameaça e troca um olhar rápido com Theo que não se opõem ao toque. — , eu vou buscar os sapatos para você para irmos para pista.
Eu começo a finalmente beber o suco assim que ele sai me deixando a sós com Theo. Tiro a folhinha de alface de dentro do hambúrguer e coloco na boca.
— Deixa eu provar o seu – diz Theo roubando o copo da minha mão. — Sem emoção, saudável mas sem emoção. Quer provar o meu?
— Só um gole – a expressão em seus olhos mudou um pouco. Sugo o refrigerante dele e me engasgo. — Gás demais.
Ele ri e me dá um guardanapo de papel. De soslaio o vejo tirando a folhinha de alface do próprio hambúrguer.
— Você gosta, não é? – fala esticando o braço para me oferecer.
— Sim – repondo antes de comer o alface da mão dele. Minha mãe era ex-modelo e nós costumávamos ter uma dieta saudável.
Ele continuou me encarando e eu sorri para ele.
— Percebi que desde que chegamos você está meio aéreo – diz ele.
É um pouco engraçado, porque sei que ele sente que tem alguma coisa errada desde o momento em que saímos da escola, mas não me perguntou nada. Com a gente as coisas se tornaram assim, não precisávamos expressar com palavras o que estávamos sentindo. Passamos a conhecer o tom de voz, as manias e interpretar os nossos silêncios. Mesmo que às vezes as suas atitudes me deixassem confuso.
— Estou é – digo dando uma risada sem graça.
— Aqui. Esqueci de perguntar o tamanho, espero que sirva – fala Tyler me entregando os sapatos.
— É o tamanho certo – respondo.
Desamarro os cadarços dos meus tênis para tirá-los e calço os que Tyler trouxe para mim.
— Venha – me chama ele, indo para a pista.
Theo e eu nos levantamos ao mesmo tempo e o seguimos.
— Segure – diz ele me entregando a bola de boliche quando nos aproximamos. — Coloque o dedo polegar no furo de baixo e os dedos médio e anelar nos furos de cima. Use a outra mão para apoiar a bola antes de começar o movimento de balanço.
— Certo – fiz o que ele pediu. E céus como aquilo pesava.
— Caminhe em direção a linha de falta em um movimento constante e incline o seu corpo para frente enquanto balança a bola de boliche para trás – orienta Theo.
— Mantenha o seu pulso firme e a sua mão esticada, não queremos que você se machuque – aconselha Tyler e eu balanço a cabeça. — Solte a bola na fase mais baixa quando o seu corpo já estiver completamente inclinado e puxe o polegar para fora antes dos outros dedos.
— Agora é só você derrubar os dez pinos e marcar um strike – conclui Theo apontando para o outro lado da pista. Como se isso fosse a coisa mais fácil do mundo.
— Entendi.
Faço os movimentos que eles me disseram e solto a bola de maneira que permitisse que ela escorregasse primeiro do meu polegar. Ela segue em linha reta mas na metade do caminho começa a oscilar. A bola acerta três pinos e os derruba. Mattheo e Tyler comemoram, eu escondo o meu rosto com uma das mãos. Eles riem e me entregam outra bola. Depois de mais cinco tentativas enfim consigo fazer um strike. Eles me abraçam me carregando do chão.
Não tenho noção de quanto tempo passamos jogando mas quando saímos já estava de noite. Tyler se despediu e agradeceu por eu ter aceitado o seu convite e Mattheo disse que me acompanharia até a estação. Senti que tinha algo a mais por trás disso e aceitei.
— Você está bastante calado hoje. Quer dizer, normalmente você é mas hoje está mais – seu tom de voz sai baixo e preocupado.
— Eu estava pensando – respondi e senti que ele ainda me encarava de esguelha.
Ele estava caminhando a dois passos atrás de mim. Eu ainda não conseguia lhe contar o que havia acontecido porém mesmo sem saber, Theo poderia me ajudar. Desacelerei e o empurrei com o ombro e ele devolveu o empurrão.
— Meus pais me ligaram. Disseram que mandaram dinheiro para os próximos meses e que não era para eu esquecer que eles me amavam – falei. O que era quase uma piada dada a situação em que eles me abandonaram.
— Então era isso?
Eu não sei se tinha conseguiria falar sem que ele notasse a diferença na minha voz e resolvi concordar com a cabeça. O tal garoto era o maior dos meus problemas agora, gastei a minha tarde inteira pensando nele. De repente sinto umas leves pontadas no meu braço direito e massageio o local.
— O que houve?
— Nada demais – digo. E logo me lembro do motivo da dor. — Foi o braço que bati a tarde.
— Ah. Está doendo?
— Não muito.
— E nós ainda o trouxemos para jogar boliche. Sinto muito.
— Está tudo bem. Eu me diverti muito com vocês – eu apertei as alças da mochila nervoso. — Quem eram aqueles garotos na porta da sala hoje mais cedo? Não pareciam ser da nossa série como a Lauren.
— Porque não são. Aqueles eram o trio inseparável do time de basquete. Alex, Justin e Josh Evans, o capitão do time de basquete.
Você deve lembrar dele, é o garoto que esbarrou com você. Os três estão no terceiro ano.
Josh. Josh Evans. Repeti em pensamento. Definitivamente eu iria recuperar o meu diário nem que para isso eu precisasse me aproximar dele.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Diário para dois
Teen FictionA adolescência é uma fase de constantes descobertas, e para Nick é ainda mais complicado. Após ser abandonado em uma nova cidade por seus pais que decidiram sair de férias e fugir de seus problemas, ele decide que dessa vez fará com que a sua presen...