Depois do que pareceu uma eternidade, Theo cumprimentou Josh e passou o caminho todo sem dizer uma palavra. Josh por outro lado parecia bem à vontade. Eu comentei que era a minha primeira vez assistindo a um jogo de basquete e ele gentilmente me explicou as regras. Ele devia ser mais alto do que eu uns quinze centímetros e com as suas mãos enormes de jogador de basquete, bagunçou o meu cabelo quando pedi para ele repetir uma parte que não havia entendido.
Theo evitava olhar diretamente para nós dois e me perguntei se ele estaria com ciúmes. Não de mim é claro, mas da minha nova e inesperada amizade com Josh. Mas eu não podia simplesmente contar para ele os motivos desesperados que me levavam a ficar próximo daquele garoto. Não ao menos até recuperar o meu diário e compreender o frio na barriga que Josh me causava quando a ponta de seus dedos gélidos tocavam o meu braço ou resvalavam na minha mão.
Na entrada da quadra da nossa escola Josh disse que se juntaria ao time de basquete no vestiário para colocar o uniforme.
— Boa sorte no jogo e traga a vitória para a escola – desejou Theo sorrindo, me deixando boquiaberto.
Por um instante pensei que ele não havia simpatizado com Josh.
— Pode deixar – respondeu ele e os dois se despediram com um aperto de mão.
Josh se aproximou de mim e passou o braço por cima do meu ombro me puxando para perto dele e abaixou o seu rosto para ficar na mesma direção que o meu.
— Já que pegamos o mesmo trem que tal voltarmos juntos? – sugeriu ele.
— Claro – me animei com a possibilidade de ter novamente um momento a sós para perguntar à ele sobre o meu diário.
Estranhamente Theo não se importou com isso. Talvez o problema dele fosse realmente só com o Tyler.
— Ótimo.
Ele se vira para o lado oposto e começa a se afastar mas de repente para e aponta na minha direção.
— Me espera Ni – grita ele antes de sair correndo.
Ni? Não imaginava que conseguir me aproximar de Josh seria tão fácil e rápido assim. Talvez isso devesse ao fato dele ser acessível. A versão totalmente diferente que eu tinha de um capitão de time.
—Tudo bem voltarmos com o Josh por um tempo?
— Claro. Mas será só vocês dois, eu não pretendo atrapalhar – responde Theo e não há nenhum traço em seu tom de voz de que esteja chateado mas não entendo o que quer dizer.
— Hã?
— Fico feliz que você terá companhia durante o caminho – diz ele entrelaçando os dedos atrás da cabeça, me ignorando.
— Sabe, você não precisa se preocupar comigo.
Às vezes as preocupações de Theo faz eu me sentir um fardo para ele.
— É claro que preciso. Você não tem família aqui e eu me sinto como se fosse o seu guardião.
Aquilo me deixou emocionado e sem perceber os meu olhos se encheram de lágrimas. Theo era um bom amigo.
— Não comece a chorar, os outros vão achar que estou fazendo bullying com você.
— Porque eu choraria? – eu disfarcei com uma tosse a voz embargada.
— Não chore.
— Eu já disse que não vou.
Theo e eu damos uma olhada nos bancos da arquibancada que estão quase todos preenchidos e a agitação torna difícil reconhecer alguém. Com todo aquele barulho provavelmente Tyler não ouviria o celular tocar. Enquanto tentamos achar ele em meio a todos aqueles borrões de rostos misturados e eufóricos, sinto alguém me puxar para um abraço.
— Que bom que consegui ver vocês antes de começar – diz ela com o tom de voz mais alto para que pudéssemos ouvi-la.
— Você fala isso mas só o Nick recebeu um abraço – retruca Theo fazendo beicinho.
Ele ficava tão irresistível quando fazia birra. Lauren apertou as bochechas dele e depois deu um beijo em cada uma. Ela nos mostrou onde Tyler disse que ficaria e correu para se juntar as outras líderes de torcida, que tinham que entrar em quadra para animar o público.
Nós acenamos para que ele nos visse e Tyler aponta para os dois lugares vazios do lado dele. Theo subiu alguns degraus da escada e eu o segui com dificuldade, ele acaba esbarrando em algumas pessoas e move o seu corpo para trás me fazendo passar à sua frente. A minha sensação era de estar competindo por um espaço em um trem lotado de uma cidade populosa. Alguém pisou no meu pé e a força que fiz para desprender me fez cambalear e Tyler segurou a minha mão para eu não tropeçar outra vez. E era por isso que eu não gostava de estar em lugares cheios e barulhentos. De lá eu só sairia quando o jogo acabasse.
— Estava achando que você tinha sequestrado o Nick só para você – diz Tyler um pouco aborrecido com a demora para chegarmos.
— Isso soa como algo que você faria – retruca Theo à provocação.
— É óbvio que faria. Mas que seja, Nick sentará do meu lado.
— Sem chance.
Estávamos algumas fileiras abaixo do topo e sinto os olhares de quem está acima nos observando. Eu sempre tenho certeza que o clima entre eles vai ser assim quando nos encontramos.
— Falem baixo – sussurro para eles. — Estamos chamando atenção demais.
De fato o problema de Mattheo era com o Tyler!!
— Hum. Sinto muito – murmuraram em uníssono de costas um para o outro.
Eu suspirei e decidi sentar no banco do meio permitindo que cada um sentasse de um lado. Os gritos ao redor preencheram a quadra quando as líderes de torcida apareceram e iniciaram uma coreografia sincronizada. A música tinha um ritmo alegre e contagiante e alguns garotos também faziam parte do time de líderes. Lauren e as outras garotas pareciam radiantes mesmo sendo arremessadas a mais de cinco metros do chão.
No intervalo do último tempo do jogo Tyler se ofereceu para comprar mais batatas fritas e refrigerantes, o que confesso foi muito corajoso, mas com toda aquela aparência de delinquente não teria quem ousasse ficar no caminho dele. Ele voltou minutos depois com as mãos superlotadas e um boné do time de basquete da nossa escola na cabeça que admitiu ter roubado de um garoto na fila. Em sua defesa ele disse que o garoto havia derrubado sorvete no seu sapato.
— Aqui. Eles não tinham mais sucos, então trouxe um iogurte para você – diz ele me entregando a garrafinha.
— Tudo bem – respondi.
O jogo termina e tenho impressão de ter comemorado uns três pontos do time adversário porque os olhares ao meu redor praticamente me fuzilavam. E como resultado final, o nosso time escolar perdeu com um ponto de diferença.
— Acho que acabei trazendo azar para a competição – resmungo mastigando o canudinho.
— Você não pode se culpar pelo resultado deles em quadra – me consolou Theo.
— Isso é verdade, até porque você quase me deixou surdo de tanto gritar.
Tyler cobre a orelha direita para enfatizar a sua fala e Theo ri, o que me surpreende.
— Eu quero um milkshake – diz Theo.
— Você é mesmo uma formiguinha – comento.
Tyler abre um sorriso malicioso e se aproxima de Theo com cara de quem está tramando algo.
— Eu compro para você se...
— Ni!
Escuto alguém chamar e meu coração dispara na mesma hora. Não tinha a necessidade de virar para saber quem estava chamando, mas virei. De uma maneira inexplicável eu só queria olhar para ele e não lembro de ter sentindo tanta falta assim de alguém.
— Quem é aquele? – indaga Tyler.
— A nova companhia de Nick para a estação – responde Theo como se isso fosse uma grande conquista.
— Acho que lembro de ter visto ele jogando a pouco.
— Sim.
Simplesmente sou incapaz de participar da conversa entre eles ou argumentar alguma coisa que me faça encontrar a minha voz perdida em algum lugar dentro de mim. Quando Josh para diante de nós, os meus pulmões me obrigam a inspirar o ar. O cabelo dele ainda está molhado e ele tem um perfume agradável de algodão, o que significa que Josh tomou banho antes de sair do vestiário. Balanço a cabeça e tento afastar qualquer pensamento sobre o garoto parado à minha frente.
— Oi. Amigo de vocês? – perguntou ele.
Eu acenei com a mão e Theo respondeu a sua pergunta.
— Oi. Sim, esse daqui é o Tyler, ele estuda na mesma sala que a gente.
— Ah. Prazer em conhecer.
— Só se for para você – retrucou Tyler.
Theo deu uma cotovelada nele que soltou um gemido baixo.
— Não liga para ele, da boca do Tyler às vezes não sai nada que preste. Eu vou levar ele comigo – diz Theo o empurrando.
— Porque eu tenho que ir?
— Porque você disse que me compraria um milkshake. Vamos.
Theo o arrastou sobre protestos e eu ri. Quando os dois não estavam brigando era divertido observá-los.
— Desculpa pelo o que viu hoje. Não estávamos no nosso melhor desempenho – fala Josh.
— T-tá tudo bem.
Não costumo ser tão gago, porém perto dele a minha voz passou me trair com facilidade. Estava escurecendo e começamos a caminhar até a estação.
— Era a sua primeira vez assistindo a um jogo de basquete, sinto que desapontei você.
— Não. Eu adorei cada minuto – minha empolgação saiu do controle e me inclinei segurando o seu braço.
— Que bom – ele colocou a mão sobre a minha com seus dedos gelados e puxei, não tão rápido quanto devia.
Errei a respiração e acabei com uma crise de soluço. Recuperar o meu diário estava sendo trabalhoso demais. Antes do trem parar na plataforma Josh voltou com uma garrafinha de água que comprou para mim. Nós entramos e sentamos no banco próximo a porta. Tomei um gole da água e tentei me acalmar. Estava tão cansado que fechei os olhos e peguei no sono.
A voz de Josh era baixa mas audível o suficiente para me fazer perceber que a minha cabeça estava apoiada no seu ombro. Eu me endireitei e ele se levantou. Havíamos chegado na nossa estação. Josh se despediu com um abraço e me deixou ali sozinho, há alguns quarteirões do meu apartamento. O meu rosto estava queimando. Passei as mãos pelo meu cabelo deixando ele desgrenhando. Não era possível que eu fosse realmente assim. Era!?
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Diário para dois
Teen FictionA adolescência é uma fase de constantes descobertas, e para Nick é ainda mais complicado. Após ser abandonado em uma nova cidade por seus pais que decidiram sair de férias e fugir de seus problemas, ele decide que dessa vez fará com que a sua presen...