Nós descemos as escadas do terraço, e para mim cada degrau parecia pesar mais do que o anterior. Ao meu lado, Josh permanecia incrivelmente à vontade, um sorriso tranquilo em seu rosto que contrastava com o tumulto que estava sentindo em meu peito. A brisa daquela manhã estava fresca, mas eu sentia o calor tomar conta da minha face, uma mistura estranha de nervosismo, felicidade e de algo mais. Algo que eu não conseguia entender, ou talvez não quisesse.
Josh não me acompanhou de volta até a minha sala pois dois de seus colegas do basquete apareceram diante de nós e o levou embora, os mesmos que estavam com ele quando o meu diário caiu em sua bolsa. O tom de suas vozes ecoava pelos corredores enquanto reclamavam, eles pareciam mais inseguros com a organização do evento de sua sala do que realmente bravos com Josh por ter sumido. Ele gesticulava calmamente tentando tranquilizá-los.
Josh parou de repente, olhou para trás e sorriu.
— Te vejo depois Ni?
Eu concordei com a cabeça. No momento em que fiz isso uma pergunta surgiu em meus pensamentos. Droga!! Isso não podia ser considerado um encontro podia? Considerando que estávamos na escola, acho que estaria bem longe de ser um.
Assim que Josh e seus amigos desapareceram de vista, Theo surgiu, olhando para mim com uma expressão curiosa.
— Onde você estava Nick? Sabe o quanto é difícil circular pela escola em dias como esse? – ele perguntou, e sua respiração indicava que tinha corrido uma maratona até chegar ali.
Era melhor não mencionar que estava com Josh. Seria embaraçoso explicar isso, então dei de ombros, tentando parecer casual.
— Apenas dando uma volta, vendo o que as outras turmas estão fazendo. Na minha antiga escola não fazíamos esse tipo de coisa – a minha voz soou mais sincera do que eu esperava. E quase senti pena de mim mesmo.
Theo se aproximou de mim e passou o braço por trás da minha cabeça e agarrou meu ombro me puxando para perto.
— E deixou a nossa turma com os cartazes colados pela metade? O maid café não vai se organizar sozinho, sabia? – Théo disse, mas havia um sorriso em seu rosto que tirava qualquer seriedade de suas palavras — Ah, sinceramente. Eu tenho sido muito mole com você. Vamos. Depois que o movimento diminuir eu levo você para fazer um tour pelos outros eventos espalhados pela escola.
Nós caminhamos de volta para a sala, onde Tyler já estava se preparando para servir as mesas do café. Ele olhou para a gente com uma expressão de alívio.
— Finalmente! Já estava nervoso só de pensar em ter que fazer tudo sozinho e acabar assustando todo mundo.
Não consegui evitar de sorrir, apesar do nó em meu estômago. Eu também queria que tudo ocorresse bem naquele dia.
— Não se preocupe, Tyler. Estamos aqui agora.
E, com isso, nós nos juntamos ao restante da turma, preparando-nos para o dia agitado que teríamos pela frente. Mas, mesmo enquanto atendia as mesas, a minha mente continuava voltando para o terraço, para Josh, e para a confusão de sentimentos que ainda não conseguia entender.
A manhã passou rápido e meus pés não aguentavam mais andar de um lado para o outro. O festival da escola estava em pleno andamento, com risos e músicas preenchendo cada canto. E eu estava no meio disso tudo, tentando me concentrar em minha tarefa de colaborar atendendo às mesas com os outros garotos da sala. Por mais que tentasse, meus pensamentos insistiam em permanecer no Josh.
Deixei as bandejas sobre à mesa e esperei que o pedido fosse preparado. As vozes e gargalhadas do lado de fora me fizeram olhar pela janela e lá estava Josh sentado nos degraus da escada que ficava perto de onde as barraquinhas foram montadas, rindo e conversando com seus amigos do time de basquete. Senti um aperto no peito. Eu não conseguia entender o que estava sentindo por ele. Era amizade? Admiração? Ou talvez...
Balancei a cabeça tentando afastar esses pensamentos. Eu ainda tinha um trabalho a fazer, afinal. Não podia me dar ao luxo de ter esses sentimentos confusos agora. Eu assumi responsabilidades com o festival, e não podia deixar que nada me distraísse. Voltei para a mesa onde Alyssa já tinha deixado a bandeja com o pedido.
— Que tal uma volta? – pergunta Theo com a mão no meu pulso, como se estivesse pronto para sair correndo dali comigo.
— Sinto que você está querendo arrumar briga com o Tyler – provoco estreitando os olhos e ele faz uma careta.
— Na verdade já está quase tudo terminado por aqui. Vocês podem ir e aproveitar esse tempo para almoçar – diz Tyler com uma das mãos na cintura enquanto a outra desgrenhava o seu cabelo que em seguida apontou para a mesa. — Deixa que essa eu levo.
— Ei. Não haja como se eu estivesse pedindo a sua permissão – retruca Theo me soltando enquanto virava-se para encará-lo, com uma irritação quase fingida na voz.
Dessa vez Tyler não rebateu apenas abriu um sorriso de lado, provavelmente se divertindo com a reação dele.
— Você tem certeza que está tudo bem em sairmos antes? – pergunto.
— Claro. Já vamos encerrar aqui.
— Vamos – diz Theo indo em direção à porta.
— Ah, esperem – começa ele e Theo agarra o meu braço. — Eu ainda preciso que vocês voltem depois para ajudar a limpar essa bagunça – gritou ele assim que Theo saiu correndo da sala agora com a mão firme fechada no meu pulso, e tive que correr também para acompanhar os seus passos.
Arfei quando chegamos aos degraus da escada no fim do corredor, havíamos parado de correr. Os meus ombros subiam e desciam quase que no mesmo ritmo das batidas frenéticas do meu coração. Com as costas apoiadas contra o corrimão da escada Theo sorriu para mim, ou melhor, de mim por estar com uma cara de acabado e apesar de ser sua culpa ele não demonstrava nenhum remorso, o que me fez sorrir também.
— Você é um péssimo corredor – comentou ele indicando as minhas pernas. — Se Tyler estivesse nos perseguindo já teria nos alcançado.
A expressão em seu rosto era de puro deboche com a situação. Eu não acredito que estava sofrendo bullying do meu próprio amigo.
— Eu nunca fui do tipo atlético, e você deveria ter avisado antes de sair daquele jeito – retorqui tentando manter a voz estável.
— Ao menos conseguiu me acompanhar – disse me dando as costas e descendo a escada em um ritmo acelerado.
Pulei dois degraus de cada vez para alcançar Theo, que já estava quase no último. Nem parecia que havia acabado de correr pelos corredores da escola, a sua recuperação de fôlego era algo que não deveria me deixar tão surpreso. Afinal, para ele foi muito fácil subir até o meu apartamento depois de me enganar.
Desviamos de algumas pessoas pelo caminho enquanto visitavamos várias salas, cada uma mais vibrante e animada que a anterior. A escola estava viva com a energia e a criatividade dos estudantes, cada turma tentando superar a outra com suas decorações e apresentações. A sala de Lauren foi a última que fomos, pois pretendíamos passar mais tempo lá. Quando entramos as garotas estavam no meio de sua última apresentação. Assim que a performance acabou, Lauren se aproximou de mim e de Theo, ofegante e com um sorriso brilhante no rosto.
— E aí, o que acharam da nossa performance como WJSN?
Eu sorri encantado e entreguei a ela uma garrafinha com água.
— Vocês foram incríveis, Lauren! A sincronia, a energia... foi tudo perfeito.
A empolgação dela me contagiou que até esqueci que estávamos competindo, Theo, por outro lado, tinha um sorriso travesso nos lábios.
— Bem, eu diria que vocês foram... interessantes – ele disse, provocando Lauren.
Ela se preparava para retrucar, mas a música começou a tocar novamente. Os garotos subiram ao palco, prontos para a sua apresentação. Assim que os primeiros acordes de Dynamite do BTS encheram o ar, as meninas começaram a gritar em euforia e balançar as armys bombs - um bastão de lá luz oficial do grupo usado em seus shows - que foram distribuídas na entrada. Na sequência dançaram Mic drop e encerraram com Best of me.
Theo cutucou o ombro de Lauren e sussurrou algo apontando para a porta, e em seguida caminhou até lá fazendo um meneio de cabeça para que eu o seguisse.
Quando chegamos a parte de trás da escola, Theo começou a comentar, com olhos arregalados, sobre a decoração, as competições acirradas dos clubes e as barraquinhas da turma de culinária, que exalavam um aroma delicioso que atraiam filas. Eu, no entanto, mal notei tudo isso. Meus olhos estavam fixos em uma única figura no meio da multidão - Josh. O garoto que, eu suspeitava, poder sentir algo além de amizade. Josh estava ali, rindo e conversando com seus amigos, completamente alheio ao meu olhar intenso.
Mas, enquanto falava, Theo notou que eu não estava prestando a mínima atenção. Antes que eu pudesse disfarçar, ele acabou percebendo para onde eu estava olhando, e decidiu agir.
— Ei, Josh! – gritou ele, acenando para que se juntasse à nós, o que me fez lembrar de quando ele chamou por Tyler e gelei novamente.
— Oi! Parece que vocês também já terminaram o evento da sala.
— Sim. Tyler nos deixou sair mais cedo, porém ainda temos que voltar para ajudá-lo na limpeza – desejei que a minha voz não soasse tão vacilante quanto as batidas do meu coração.
— Por que não nos acompanha para dar uma olhada nas barraquinhas? – convidou Theo.
Josh aceitou o convite e se juntou a nós, o que me deixou nervoso e feliz ao mesmo tempo. Enquanto caminhávamos, não percebi quando Theo havia ido embora, nos deixando a sós. Passamos então algum tempo juntos, rindo e conversando. Quando eu disse que estava quase na minha hora de entrar, Josh se virou para mim.
— Eu vou esperar por você – disse ele. — Para podermos voltar para casa juntos, depois que você terminar de ajudar a arrumar a sala.
Sacudi a cabeça concordando e percorri o mesmo caminho que fiz com Theo.
Todos já estavam na sala quando retornei e peguei uma das vassouras encostadas no quadro. Theo não me perguntou nada, e por mais que eu tivesse curiosidade também não ousei perguntar o motivo de seu sumiço.
— É só uma pena não termos ganhado apesar de todo o nosso esforço – resmungava Tyler.
— O pessoal do segundo B fizeram uma casa do terror muito boa – comentei e ele fez careta.
Nos despedimos antes de chegar no portão, o que para mim foi um alívio. Lancei um olhar para Josh que me esperava sentando perto da entrada, ele estava olhando para frente quando os nossos olhares se encontraram, e um sorriso sedutor surgiu em seus lábios. Senti como se algo se agitasse dentro de mim, algo que eu não conseguia identificar. Essas sensações eram todas novas para mim. Eu estava confuso, assustado, e acima de tudo, surpreso. Nunca pensei que poderia sentir algo assim por um garoto.
Estou começando a gostar mesmo dele? Me perguntei, mas a resposta parecia muito complexa e assustadora para eu considerar naquele momento. Então, em vez disso, sorri, como se estar perto do Josh não me deixasse nenhum pouco em conflito com o que estava sentindo. Porque, no final das contas, independente de tudo, eu precisava acalmar o meu coração para conseguir pensar com clareza.
Como combinado fomos juntos para casa e descemos na estação de sempre. Josh evitou me abraçar dessa vez e deu apenas um breve aceno, eu o observei se afastar aos poucos. Uma agitação crescia no meu peito. Em meio a tudo isso eu tinha só uma certeza, o meu modo de vê-lo mudou. E isso, pelo menos, era algo que eu podia entender.
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Diário para dois
Teen FictionA adolescência é uma fase de constantes descobertas, e para Nick é ainda mais complicado. Após ser abandonado em uma nova cidade por seus pais que decidiram sair de férias e fugir de seus problemas, ele decide que dessa vez fará com que a sua presen...