2014

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15 de fevereiro

Atsumu Miya

Quando acordo, sei que preciso me lembrar de alguma coisa, mas parece que meu cérebro está envolto em feltro. Foi o vinho, penso, grogue, e abro os olhos para descobrir que não estou na cama. Continuo no sofá, mas estou com meu travesseiro sob a cabeça e coberta pelo meu edredom. Uma longa encarada no relógio diz que são seis e pouco da manhã, então volto a fechar os olhos, lembrando aos poucos da noite passada, começando pelo que é mais fácil.
Sorvete. Vinho. Ryan Gosling remando. Cisnes. Com certeza, havia cisnes. E, ah, meu Deus, Oikawa ficou acabado! Já vou dar uma olhada nele — que bom que Sakusa o trouxe para casa. Sakusa. Ah, merda. Sakusa. Minha mente entra em pânico, convencendo-me de que devo ter dito ou feito algo terrível e desleal, que Oikawa vai me odiar. Ele conversou comigo, nós rimos, assistimos ao filme, e aí... Ah. Lembrei. Yachi. Eu me afundo no meu ninho de edredom, fecho os olhos, apertados, e me permito pensar na minha irmã caçula tão linda, tão doce. Dedos finos, unhas tão frágeis que eram quase transparentes, a única pessoa no mundo que tinha olhos iguais aos meus. Preciso me concentrar muito para recuperar sua voz infantil de minhas lembranças, a alegria extasiada de suas risadas, o brilho do sol em seu cabelo louro liso. Memórias fragmentadas, desbotadas como fotos danificadas pelo tempo.

Não me permito pensar em Yachi com frequência no meu dia a dia; na verdade, não me permito pensar nela nunca. Sempre demoro a aceitar o fato de que minha irmã simplesmente não está mais aqui, a não ficar furioso com todas as outras pessoas que continuam respirando.

Agora, me lembro da noite de ontem com clareza. Não fiz nada moralmente errado com Oikawa, pelo menos nada que me faça sentir culpado de uma maneira tradicional; com certeza, não mostrei meu pau ou confessei meu amor. Porém, mesmo assim, não consigo me inocentar completamente, porque a verdade é que cruzei a linha, mesmo ela sendo tênue e quase invisível. Dá para senti-la embolada aos meus pés como uma linha de pesca, pronta para me fazer tropeçar e me transformar em mentiroso. Eu me permiti me aproximar demais. Só precisei de uma garrafa de vinho barato para baixar a guarda; só um comentário infeliz para me fazer desmoronar como um castelo de areia abandonado, atingido pela maré alta da noite.

5 de outubro

Atsumu Miya

— Feliz aniversário, seu velho coroca!

Oikawa assopra uma língua de sogra na minha cara para me acordar, e me
apoio com dificuldade nos cotovelos enquanto ele canta uma versão animada de "Parabéns para você".

— Obrigado! — Eu lhe dou uma desanimada salva de palmas. — Agora, posso voltar a dormir, por favor? São oito da manhã de sábado.

Ele franze a testa.

— Você está brincando, né? Se dormir agora, vai desperdiçar este dia especial.

Ele está falando como uma de suas personagens favoritas do Disney Channel.

— Até onde sei, não somos adolescentes americanos de um seriado bobo —resmungo.

— Pare de reclamar e saia logo da cama. Tenho muitos planos para hoje.

Eu me jogo contra o travesseiro.

— Já tenho um plano: ficar aqui até meio-dia.

— Você pode fazer isso amanhã. — Oikawa acena com a cabeça para uma caneca na mesa de cabeceira. — Fiz café. Você tem dez minutos antes de eu voltar e acordá-lo de um jeito bem ruim.

— Você é mandão demais — resmungo, jogando os braços por cima dos olhos. — Tenho vinte e três anos agora, e você continua com vinte e dois. Sou velho o suficiente para ser seu pai. Vá limpar o quarto e fazer o dever de casa.

Um dia em dezembro ; Sakuatsu Onde histórias criam vida. Descubra agora