XVII -- Minha primeira fuga

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 Além do celular, foi me tirado a chave do meu quarto, a que eu carrego como um pingente em meu colar. Fui trancado nos meus aposentos após o almoço e estava proibido de sair. Hades tirou de lá minha TV e boa parte dos meus livros. Meu videogame foi confiscado até segunda ordem.

 O pior de tudo era ouvir as mensagens chegando e as ligações de Will sem poder responder ou atender. Reconhecia que eram chamadas dele porque eu coloquei um toque especial para seu contato. Meu pai recusava as ligações e ignorava as mensagens. Doía de mais pensar que ele ainda queria que eu terminasse com o meu raio de sol.

 Bia vinha me trazer as refeições, mas voltava a trancar o quarto por fora antes de sair. Me recusei a comer. Eu estava irritado. Irritado com todos eles. Foi só um amasso. Que droga! Nunca desejei tanto que minha mãe estivesse ali. Ela poderia acalmar o meu pai e trazê-lo a razão. Ela sim tinha a capacidade de me ajudar. Ela me entenderia.

 Hades não falou comigo e ameaçou me bater de novo quando comecei a xingá-lo em italiano. Me encolhi quando ele ergueu a mão. Hazel me protegeu com determinação. Se pôs na minha frente, usando o corpo como barreira e xingou-o em francês, olhando-o fundo nos olhos. Quando levei o tapa, gritou e veio em meu socorro imediato. Tentou impedir que ele falasse mais algo que pudesse me machucar.

 No primeiro dia que fiquei trancado, mandei meu pai e mais três gerações antes dele irem tomar naquele lugar. Era uma quarta-feira, mas essa era a pior que eu estava vivendo. Tentei me distrair com livros, entretanto eu só conseguia pensar em William e no quanto eu sentia sua falta.

 No segundo dia que fiquei trancado, a raiva ainda queimava em mim. Pela janela pude ver que Hades e Haz estavam limpando o quintal. Vasculhei minhas coisas e encontrei minha chave reserva, bem escondida em minhas roupas íntimas. Arquitetei um plano de emergência.

 Peguei minha mochila de viagens, a que usei para ir a casa de praia de Leo, e coloquei mudas de roupa. Peguei dinheiro suficiente. Coloquei com cuidado a vhave da fechadura, virando devagar para que não fizesse barulho. Não achei meu celular. Deveria estar com ele. Fui a passos lentos para a sala.

 Bia estava na cozinha e me viu. Mordeu o lábio, como se eu estar ali fosse ruim. Percebeu o que eu pretendia assim que viu a mochila. Indicou a porta com a cabeça e sussurrou "Vai". Disparei porta a fora, indo para o ponto de ônibus. Peguei um que me deixaria perto do prédio de Will. E foi assim que eu fugi de casa pela primeira vez.



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 Solace me recebeu com surpresa, o telefone na mão, enquanto tentava me telefonar de novo. Me fez entrar e contei tudo a ele. Eram umas cinco horas quando cheguei. Chorei de alpivio por estar perto de Andrew outra vez. O loiro perguntou se eu ia para outro lugar, mas neguei.


一 Nesse caso... 一 Coçou a nuca. 一 ... você pode ficar aqui até as coisas se ajeitarem. Ou até quando quiser.


 Assenti. Sexta-feira teria aula e meu pai notaria que eu não estava mais lá. Eu ia falar com ele, mas depois de me preparar mentalmente e emocionalmente para isso. Recordo-me que esperava que meu pai ficasse bravo por ser chamado na escola, mas não esperava que me batesse e fosse me dar um castigo tão duro. Agora, esperava pela pior que pudesse ocorrer. Esperava o pior dele.


一 Sole, você vai amanhã? 一 Perguntei, vendo-o pegar outro lençol no armário porque fiquei com frio.

Primeiras & Únicas Vezes (Solangelo)Onde histórias criam vida. Descubra agora