01 | Ninguém nunca o viu

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GRAÇAS AO AVANÇO da tecnologia, Jay conseguiu fazer um currículo digital incluindo algumas mentiras sobre sua experiência na área, esperando que pudesse esconder isso e fingir que sabia exatamente o que estava fazendo. Levou um tempo até concluir para ficar livre de mais uma preocupação (ou quase, pois ainda lhe assustava a possibilidade de não conseguir aquele trabalho) e, enfim, descansar.

Deitou-se naquele colchão para se acostumar com aquela grande falta de conforto e achou um de seus livros sobre casos criminais na mala, catando para ler até que o sono viesse. Mas nem isso pôde fazer direito quando começou a escutar um choro no quarto ao lado. No início não lhe incomodou, um choro baixo e sofrido, como se a pessoa estivesse tentando contê-lo ao máximo, mas logo se tornou insuportavelmente alto e isso impossibilitou a continuação de sua leitura.

Jay largou o livro sobre a mala jogada ao lado da cama e desligou a luz para tentar dormir. Tentativas fracassadas pelo incômodo choro no quarto da direita, mesmo se apertasse o travesseiro aos lados da cabeça para cobrir os ouvidos e abafar o som.

Não quis ter a insensibilidade de bater na parede e pedir que a pessoa chorasse mais baixo, seria um pedido terrivelmente egoísta, então se levantou e se esgueirou pela porta, tentando dar passos leves até o quarto de onde vinha o choro. O piso ainda fazia um barulho assustador mesmo com toda a delicadeza no andar.

Quarto 237. Bateu à porta.

- Com licença. - ele pediu - Está tudo bem aí?

Talvez oferecer ajuda a pessoa para livrá-la daquilo que ocasionava seu sofrimento também serviria para ajudá-lo a dormir melhor e parecer apresentável no dia seguinte para entregar o currículo na cafeteria.

- Pode conversar comigo, se quiser. Posso ouvir seu choro do meu quarto.

O som cessou e Jay continuou parado em frente a porta por um instante, certificando-se de que estava tudo certo com a pessoa do outro lado. Ele voltou para seu respectivo quarto um pouco mais rápido do que saiu, deixando de se importar com o barulho do piso.

No dia seguinte, acordou antes do despertador que havia programado em seu celular e não conseguiu dormir mais mesmo tentando, e tendo custado a dormir devido ao choro na noite anterior. Ele levantou e aproveitou para tomar banho naquele cubículo que chamava de banheiro, mas não reclamava do espaço por ser mais limpo do que esperava. Tinha de deixar a porta aberta ao tomar banho quente para deixar o vapor sair, assim evitando uma queda de pressão e um possível desmaio.

Vestiu uma camiseta branca e uma bermuda jeans com um par de tênis igualmente brancos que tivera usado poucas vezes enquanto estava em Seattle por pena de sujá-lo. Não que fosse o tipo de garoto que vive se metendo em encrenca em lugares de teor duvidoso, mergulhando na sujeira.

Enquanto colocava um relógio no pulso direito para complementar o visual, ouviu batidas na porta e deu uma última ajeitada no cabelo antes de atender.

Do outro lado, um garoto de nariz arrebitado e fios em tom esverdeado, vestido como o presidente de um grêmio estudantil, por mais que parecesse ter idade o suficiente para já ter se formado na escola. Uma calça marrom e uma blusa de mangas longas pretas, com um quadriculado na parte do peitoral que se estendia até o abdômen.

- Sunoo já esteve aqui? - ele perguntou e olhou em volta.

- Quem? - Jay pensou que o garoto podia ter errado o quarto.

- Parece que não. Me surpreende que ele não tenha vindo aqui para te dar as boas-vindas antes de mim. - ele estendeu uma torta de frutas vermelhas para Jay. - Prazer, Lee Heeseung, o vizinho do quarto à esquerda.

Jay segurou a torta e a aproximou de seu nariz para sentir melhor o maravilhoso cheiro.

- Está com uma cara ótima, você quem fez? - ele perguntou levantando o olhar para o vizinho da esquerda.

quarto 237 • jaywonOnde histórias criam vida. Descubra agora