08 | Não confie nele

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OS SENTIMENTOS DE Jay se misturaram, o deixando atordoado, tropeçando nos pés e quase se chocando com o chão pela perda de equilíbrio. Tentou ser racional e manter a calma naquela situação desesperadora, só conseguindo pensar em Jake.

O Park pegou o celular e se atrapalhou em meio à pressa para buscar o número do amigo na lista de contatos. Enquanto tentava iniciar uma chamada, inclinou-se em frente à porta do quarto de Heeseung e colocou o olho na fechadura, não conseguindo encontrar nenhum sinal do mais velho dentro de seu apartamento.

A solução mais lógica seria ligar para a polícia, mas não havia prova alguma contra Heeseung, e por isso poderia se meter em sérios problemas, coisa que ele menos precisava naquele país estrangeiro.

- Jay? - a voz do outro lado soou, causando um sobressalto no americano.

- Jake, você não pode confiar no Heeseung. - tentou alertar baixo, pois se houvesse a possibilidade do Lee estar por perto, não ouviria.

Jay andou apressadamente até o elevador e apertou o botão dezenas de vezes em falhas tentativas de fazê-lo chegar mais rápido, o que só serviu para deixá-lo mais nervoso.

- Do que você está falando?

- Jungwon não existe, Jake. Ele já morreu e pensam que foi suicídio, mas ele me mandou um bilhete avisando que foi Heeseung. - cuspia as palavras com rapidez enquanto apertava os papéis entre a mão.

- Meu Deus, o quê? Isso é...

- Uma loucura, eu sei. - o barulho das portas do elevador abrindo o aliviou - Heeseung é um assassino, você precisa se afastar dele agora-

O olhar de Jay se direcionou para o elevador, reconhecendo o rosto de Heeseung. Aqueles fios esverdeados, nariz empinado e olhos amendoados o fizeram engolir em seco, dando um passo para trás ao perceber a expressão confusa e um pouco curiosa do mais velho.

Houve silêncio entre os dois rapazes, mas a voz de Jake do outro lado da linha ainda ecoava, perguntando se Jay estava ali.

- Quer saber? Acho que vou pelas escadas...

Jay afastou o aparelho do ouvido e tentou sair dali o mais rápido que pôde, mas as mãos de Heeseung foram mais espertas, agarrando seus ombros e o puxando para dentro do elevador antes que as portas se fechassem novamente.

O americano se debatia desesperadamente e tentava gritar por ajuda, o que fez a raiva de Heeseung aumentar junto com a força dos toques, apertando seus braços atrás das costas. Tentou alcançar o celular jogado no chão com o pé, mas o Lee o chutou para mais longe.

- SOCORRO, ALGUÉM, POR FAVOR! - usava todo o oxigênio armazenado para implorar pela vida.

- Quieto! - cobriu a boca de Jay para abafar os gritos - Você tinha que ser curioso, não é? Por sua culpa, eu posso me foder muito.

Jay jogou o corpo para trás e prensou o de Heeseung na parede do elevador, aproveitando a oportunidade para se soltar e se virar, dando uma joelhada entre as pernas dele. O Lee grunhiu de dor ao ser acertado nas partes íntimas e reagiu rápido, levando os dedos até os fios negros de Jay, enroscando de forma desconfortável para poder bater a cabeça do estrangeiro na parede, forte o suficiente para deixá-lo tonto, mas não para desmaiá-lo.

- Matar Jungwon e fazer parecer que foi suicídio foi a coisa mais fácil do mundo. Agora, vou fazer o mesmo com você.

Ameaçou e tornou a ir para cima de Jay, machucando seu corpo com variados golpes.

- Eu vou te matar e te pendurar pelo pescoço, aproveitando os bilhetes que deixou no quarto 237 para copiar sua caligrafia. Prometo ser criativo na carta de suicídio.

O sorriso sádico estampado em seu rosto o deixou amedrontador, e, novamente, mesmo não sendo religioso, Jay implorou para quem o estivesse ouvindo, que o tirasse daquela situação. Que, por favor, ele pudesse escapar vivo.

- "Ele era um louco que conversava com um fantasma suicida, foi obviamente influenciado" - Heeseung dizia, presumindo o pensamento das pessoas com a notícia da morte de Jay.

Um prédio tão velho e bizarro como aquele, não ter uma câmera no elevador era praticamente uma sentença de morte, e as únicas que tinham no corredor, provavelmente tinham péssimas imagens ou sequer funcionavam. Jay começou a pensar que não teria chance alguma, mesmo após reunir as forças restantes para lutar com Heeseung e abrir manualmente as portas do minusculo cubículo

Heeseung envolveu o corpo dele com os braços de maneira ágil e inteligente para impedir a sua fuga, ainda conseguindo proteger sua boca com mais cuidado, mesmo quando Jay não tinha mais forças para berrar tão alto.

Realizar o trabalho doentio que planejava em seu próprio apartamento seria uma escolha estúpida, já que não havia sido pego quando fez o mesmo no apartamento de Jungwon.

Encontrou a porta do quarto 238 e a abriu rápido para não ter o azar de alguém finalmente aparecer naquele corredor que, quase sempre, era deserto. Jogou o corpo de Jay no chão com brutalidade e trancou a porta.

Jay arriscou levantar e correr até a cozinha para encontrar algo que pudesse usar como defesa, mas Heeseung conseguiu agarrar suas pernas e puxá-lo de volta. Justo Jay, que adorava casos criminais, nunca se imaginou viver um. Principalmente ser a vítima dele.

Naquele momento ele deixou a angústia o engolir e, assim, não se lembrou de nenhuma dica que havia aprendido lendo livros e assistindo documentários, podendo seu nível de inteligência ser comparado ao de uma pedra.

Contra a própria vontade, começou a aceitar o próprio destino. Dizem que nos seus momentos finais de vida, você começa a repensá-la por inteiro como se um filme fosse criado em sua mente.

Jay podia finalmente contar a Jungwon que se arrependia, sim, de algo: todas as vezes que ignorou as mensagens e ligações de seus pais, e esqueceu de fazê-las.

Arrependeu-se de não ter descoberto a verdade antes e ter sido mais discreto para conseguir avisar Sunoo e Riki, ainda que temesse que os dois garotos não acreditariam em suas palavras.

Arrependeu-se de, por vezes, não ter dado a devida atenção às coisas que Jake lhe falava de maneira tão empolgada enquanto ambos estavam na cafeteria, mas não pôde deixar de agradecer mentalmente a companhia que o australiano lhe fez, sendo as expressões dele o motivo de seus risos diários toda vez que ele caçoava seu sotaque.

Foi ali, naquele momento, em seu apartamento, durante uma tarde tempestuosa, que ele começou a se arrepender e agradecer muitas coisas, enquanto seu corpo era torturado pelo vizinho do quarto à esquerda, o primeiro a tê-lo recebido quando chegou ao prédio.

Adeus, pai, mãe e suas mensagens e ligações. Adeus, Jungwon e seu cabelo vermelho e seus bilhetes. Adeus, Sunoo e seu cabelo desbotado e seu namorado estranho. Adeus, Riki e sua música alta e sua falta de educação. Adeus, Jake e toda sua positividade, e...

Espera...

Jake?

quarto 237 • jaywonOnde histórias criam vida. Descubra agora