Era sexta-feira, e sai do colégio mais cedo. Não que eu gostasse de ficar em casa com aqueles doentes megalomaníacos, mas eu queria ficar o máximo de tempo possível na cama e não pensar em nada. Era tenso tudo o que eu vivia naquele inferno de escola, mal sabia eu que o inferno de verdade estava por vir. Corri pelas ruas pavimentadas de Flerton, o ar estava soprando frio em meu rosto, enquanto as nuvens tapavam a luz solar de nos aquecer. Era outono e as folhas alaranjadas das árvores caiam pelas vielas daquela cidade, que era repleta de casas vitorianas sem muro, e com jardins cheios de gnomos. Eu não morava muito longe da escola, sendo a residencia Parker a duas quadras dali. Ao me aproximar, reduzi o passo, e observei aquela casa de janelas altas e portas robustas e pretas, que se destacava com as paredes de madeira branca. Olhei para o segundo andar e observei, que a janela estava aberta, com as cortinas brancas sacudindo ao vento. Observei com atenção, e vi que havia uma mulher pálida e de vestido branco em meio a cortina “Será que temos visita?” — pensei.
— Ei Jannie! — ouvi tia Valéria me chamar. Nisso olhei em direção a porta, e lá estava a senhora magrela, e enrugada. Usava uma tiara para segurar sua franja sobre, seus cabelos curtos e grisalhos. — Vem para dentro, antes que pegue um resfriado, e contamine seu tio eu!
Eu olhei para ela, e assenti com a cabeça, olhei de novo para a janela, e já não havia mais ninguém ali. Cogitei a perguntar a tia Valéria se tínhamos visita em casa, mas preferi ficar calada, afinal não recebíamos visitas. Mas afinal, quem era essa mulher no andar de cima? Ao chegar na porta de entrada, tirei os meus sapatos, e entrei somente de meias. Não queria ouvir a ladainha da tia Valéria me importunando com a sua mania de limpeza. Então cruzei a sala de estar e subi até o quarto, arremessei a mochila sob a poltrona e me joguei na cama. Meu quarto era enorme assim como aquela casa vitoriana. Tudo bem vou ser sincera, o meu quarto era sótão. Mas ninguém em Flerton precisava saber disso, certo? Fiquei ali deitada por alguns minutos, e sem perceber adormeci.
Quando abri os olhos, o sótão parecia mais sombrio que o normal. Levantei e fui em direção a pequena janela de frente a rua Dominic. Mas não parecia a mesma que eu havia visto hoje de manhã.
Estava tudo escuro. Os carvalhos floridos pareciam estar podres. Aquilo não era normal, até mesmo a casa dos Dawson estava sinistra. Não que não fosse estranha antes, mas agora estava bem pior. Tudo aquilo era muito estranho, porém decidi deixar de lado me deitei de novo. Estava cansada demais para me preocupar com o clima de Flerton. Deitei minha cabeça no travesseiro, e tratei de dormir. Sem muita demora peguei no sono, porém logo meu sono foi interrompido. Tinha alguém que não parava de bater as panelas uma na outra. Botei o travesseiro sobre a cabeça para tentar não ouvir aquele som. Aquela barulheira já estava passando dos limites. Então decidi levantar da cama, mas assim que abri os olhos “cadê o sótão?” Aquele não era o meu quarto, olhei para os lados e havia ali no canto várias seringas e agulhas jogadas no chão. Pela cor das paredes, se tratava de um hospital. Era da cor branca, ao menos as partes que não estavam descascadas.
Era um ambiente tenso, pude perceber assim que abri os olhos. Era como se algo ali não estivesse certo. Não sei como eu fui parar ali. Talvez fosse só um sonho ruim. Lembro-me, que além da cama onde eu estava deitada. Haviam várias outras. Todas de hospital, com aqueles lençóis azulados e outras esverdeados. Por curiosidade, desci da cama e caminhei descalça, por aquele chão sujo. Era irritante a sensação de estar com os pés sujos. Por um instante entendi porque a tia Valéria não gosta de sujeira. Caminhei entre as camas, passei por três até chegar na janela. E ao olhar para fora, vi um campo cinzento. Estava todo queimado até aonde a vista alcançava. E para todos os lados que eu olhava, não havia ninguém. A casa dos Dawson não estava ali. Mas era óbvio: aquela não era em hipótese alguma a minha casa “meu Deus onde eu vim parar” pensei.
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Sanatório do Medo
KorkuJannie era uma garota normal, que vivia um uma vida restrita e cheia de regras impostas por seus tios Valéria e Eddie Parker, que viviam em extrema obediência com o Altíssimo e de maneira inevitável esse fanatismo religioso afetava de maneira direta...