boa leitura! :)
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Clara já tinha os horários da academia decorados religiosamente dentro da mente. Sequer precisava mais dos antigos post-its coloridos colados por toda a casa, informando os dias e séries que Helena havia separado para ela. Mesmo nos dias de pouca disposição, ela se despia na frente do espelho com um suspiro, tomava um banho gelado e lembrava de Helena. A Personal de sorriso gigante e cheio de intimidade. A Personal de cabelos bonitos e risada engraçada. A mulher por quem Clara estava curiosa há mais de dois meses – o mesmo tempo que começou a frequentar a academia do prédio.
Então, pensando em Helena, toda a falta de animação escorre grosseiramente pelo ralo e ela se força a vestir as roupas de lycra, planejando brevemente na frente do espelho o que deveria fazer ou falar na frente daquela mulher tão interessante.
Clara nunca teve problema com os homens, isso era fati. Os conquistava em um piscar dos olhos, na praia de Copacabana, falando algo sobre como aquela bebida parecia terrível e, o fim da noite era com ele em sua cama. Já Helena, nossa, com Helena cada átomo de seu corpo gritava para ir com cuidado.
- ...vinte! Ótimo, Clara. Você está evoluindo muito bem, meus parabéns – Clara sorri quando o sorriso de Helena alcança seus olhos e seu elogio alcança seus ouvidos. Especialmente hoje, a Personal parecia ainda mais bonita coberta por um conjunto vinho de lycra, o cabelo metade preso e metade solto – Como você se sente?
- Como se precisasse deitar na minha banheira com uma taça de vinho por umas meia hora, ou mais, para me recuperar de todas essas séries.
Helena ri, Clara sente um mal estar no pé da barriga. Quando ela se tornou essa bagunça em flerte, tal qual um adolescente virgem de quinze anos de idade? Era vergonhoso.
- Bom, e é isso que você vai fazer daqui a pouco.
A modelo cerra os olhos ao perceber que as duas eram as únicas naquela grande academia. As portas automáticas fechadas, Lana Del Rey tocando em plano de fundo como se estivessem em um provador de loja no shopping e Helena a olhando com aqueles grandes e hipnotizantes olhos cor de chocolate que pareciam sempre enuda-la.
- Estamos sozinhas aqui – constata.
- Sim, estamos. A maioria dos meus clientes costuma gostar de vir mais cedo, antes do trabalho, ou no final de semana – Clara acena com a cabeça – Tudo bem por você? Temos só mais dois aparelhos, e então você acaba.
Clara quase se jogou no chão. Merda, por que o tempo ao lado de Helena precisava passar tão rápido assim? Ela tinha chegado ali há uns dois minutos atrás, como assim já estavam quase acabando?
- Claro.
- Bom, então vamos para a cadeira extensora. Três séries de vinte, por favor.
A modelo obedece, caminhando atrás de Helena com os olhos de águia observando cada movimento da Personal. Helena se abaixa, dentro de suas calças de lycra, para pegar os pesos e Clara estica o olhar para o teto. Queria olhar, mas sabia se controlar.
- Prontinho. Pode se sentar.
- Obrigada – ela abre e fecha a perna duas vezes quando estica o olhar para uma Helena concentrada em sua ficha, murmurando baixinho enquanto passava o marca texto em algumas palavras – Sabe – a Weinberg a olha, atenta – eu não sei muita coisa sobre você, Helena.
Helena arquea as sobrancelhas grossas pela surpresa aparente.
- Eu também não sei muita coisa sobre você.