boa leitura!
•
Você precisa saber da piscina
Da margarina, da Carolina, da gasolina
Você precisa saber de mim- ...e, mesmo assim, eu poderia – a frase morre na garganta pela batida fraca na porta do quarto. Ela cerra os olhos, o coração agitado batendo contra a caixa torácica de forma que desafiava até a própria biologia. Ela dobra o papel branco no meio e passa as palmas suadas das mãos no tecido champanhe – Pode entrar.
O barulho arrastado da porta abrindo foi o que a acordou para aquele ínfimo instante de glória. Os olhos esverdeados inundaram no instante em que a tocaram, de longe, cruzando o quarto de cortinas brancas e luz do sol banhando o carpete. Sabia também que os seus próprios olhos deveriam estar tão molhados quanto os do filho a sua frente.
- Mãe...
- Para, Rafael! Não chora agora – Rafael mordisca os lábios em resposta, descendo os olhos em direção ao resto da vestimenta sofisticada e, ao mesmo tempo, simplória da mãe. A câmera fotográfica esquecida e pendurada delicadamente no pescoço. Precisava registrar aquela cena primeiramente com os olhos, disso ele sabia – A Kate acabou de terminar minha maquiagem. Eu não quero borrar nada.
Dito isso, ela olha para o teto branco. O nó apertado na garganta enquanto engolia a seco. Como um lampejo, sentiu os braços quentes se enrolarem em sua cintura. Suspirou. Um suspiro de vida, de dor misturado com amor e saudade e felicidade e veracidade. Seu filho estava consigo em um dos dias mais importantes de sua vida. O filho que viu crescer com os próprios olhos, se tornar um homem de boa índole, coração gigante e olhos amáveis. O filho sangue de seu sangue. Amor de seu amor.
Rafael deixa um beijinho em sua bochecha, descansando o queixo em seu ombro.- Você tá linda demais.
Clara retira os olhos do teto para olhar em direção ao espelho à frente dos dois. Pôde sorrir com a imagem de um Rafael entornado em um paletó azul marinho e gravata de listras a abraçando por trás, a fitando como se Clara fosse tudo. A pessoa mais importante do mundo.
E então se viu.
Viu o vestido champanhe até os calcanhares, as mangas soltas até metade dos bíceps, a parte do quadril presa ao corpo com o decote em V ressaltando seu busto veementemente, assim como as costas desnudas. Os cabelos estavam presos em um coque frouxo com duas mechas soltas moldando o rosto angelical. Ela não precisava de muita maquiagem, mas agradeceu mentalmente à Kate pelo batom rosado e os olhos marcados naquela hora. Se sentia linda. Se sentia pronta para, enfim, declarar o seu amor completo à mulher que a esperaria no altar.
- Obrigada, filho – Rafael sorri – E...
- Não. Não vou dar nenhum spoiler de como ela está, mãe – Clara faz um biquinho tão fofo nos lábios que Rafa vê uma imagem de si mesmo refletido no espelho – A Kate me prometeu castigo caso eu fizesse isso.
- Mas eu sou sua mãe!
- Acredite, o castigo dela pode ser bem pior que o seu – ele levanta as duas sobrancelhas divertidamente, e Clara solta uma careta desgostosa com o nariz encolhido ao entender exatamente o que o filho estava falando.
- Certo. Eu esqueci que você cresceu! – diz, a pose se desfazendo à medida que a mão alcançava a bochecha pálida do filho. Ela suspirou com as linhas de expressão cheias de mudança. Os mesmos olhos do bebê que ela carregou no braço, deu de mamar, ensinou a ler, a escrever e a ver a vida de uma forma menos brutal. Seu legado, era isso que Rafael era. Sua família. Mas, agora, ele não era mais o único.