Desavença

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Meu dia não tinha sido nada fácil. Mais um desentendimento com Clara para a conta, aquilo já estava me cansando mais do que eu gostaria que estivesse.

Fiquei pensando na forma na qual ela reagia quando qualquer coisa fora do seu controle acontecia durante todo o caminho de volta para casa dentro daquele táxi abafado.

Não sei se era por ser uma noite sem brisas ou por eu ter bebido um pouco mais além da conta, mas, de fato, eu sentia meu corpo mais quente do que o normal. As janelas abaixadas não estavam resolvendo também. Queria urgentemente chegar em casa e me enfiar debaixo do chuveiro.

O fato de que a Clara foi embora sem ao menos me contatar, ainda me incomoda. Tenho a sensação de que ela não se importa o suficiente comigo para me contar o que pretende ou não fazer. Como se o que eu sentisse não importasse.

Ela já tinha feito isso na semana anterior, e agora de novo. Mas diferente de antes, ela havia voltado com suas malas, e tudo o que deixou foi uma mensagem: "Preciso voltar pro Rio, o Rafael está internado. Nos falamos depois." Ela sequer me ligou para avisar que voltaria. Bastou eu sair para dar uma volta pela cidade durante a manhã para fazer algumas compras, para que ela simplesmente fosse embora.

Então sim, era claro que aquilo me chatearia.

O táxi já havia parado e eu nem me dei conta. O velocímetro ainda rodava e o homem me encarava pelo retrovisor sem abrir a boca para me avisar que chegamos.

Eu estou um pouco zonza, acho que pela bebida, cambaleei até a entrada do prédio e subi me apoiando nos corrimões da escada, me esforçando para não tropeçar e acabar atraindo a atenção do porteiro.

Eram 2h04 quando olhei meu celular pela última vez, e eu ainda estava sentada no bar, conversando com o homem que preparava os drinks do outro lado do balcão depois que Marina e Rafaela foram embora. Desabafando os rumos que meu relacionamento tomava e quase chorando na frente dele. Beirava o ridículo, na verdade.

Ele parecia incomodado mas ao mesmo tempo era muito gentil. Acho que eles são aconselhados a lidar assim com gente bêbada quando aceitam o emprego.

Clara muito provavelmente já dormia por já ser bem tarde, então nem me dei ao trabalho de interfonar e acabar acordando ela. Sempre ando com a minha cópia da chave, então com isso eu não precisava me preocupar.

Eu tento o máximo que posso não fazer barulho ao entrar em casa, mas minhas mãos estão fracas, assim como as minhas pernas, então assim que entro e tranco a porta, acabo derrubando o chaveiro no chão, causando um som estridente quando as chaves se chocam contra o piso.

Me praguejei profundamente, e então corri para o sofá, me jogando no mesmo e sentindo tudo rodar quando fecho os olhos. Nessa hora eu me xingo ainda mais, eu não deveria ter bebido tantas doses de tequila. Foi um erro.

Estou distraída, pensando em tanta coisa que no fundo, não faço a menor ideia do que esteja se passando pela minha cabeça. Mal escuto os passos se aproximarem de mim.

– Chegou agora? – Clara parecia triste, seu semblante sempre a entregava.

– Acabei de chegar – falo com minha mão esquerda afundada nos meus cabelos, pensando. – Eu te acordei?

Clara fez que não com a cabeça e me encarou de cima a baixo. Não conseguia distinguir o que seu olhar dizia.

– E como foi lá? Suas amigas parecem ter bastante tempo livre, né? – agora sim. Agora eu podia notar um tom irônico em sua voz ao dizer "amigas". Eu quase podia vê-la fazendo aspas no ar com os dedos. – Pra ficar até tarde de uma quinta-feira fora...

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