Prólogo

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Saint-Sauveur, Quebec, Canadá
Janeiro de 2023

Ao amanhecer, a sonolenta cidade de Saint-Sauveur acordou sob o abraço gélido do inverno, com flocos de neve cintilantes, semelhantes a estrelas cadentes, dançando sob o fulgor do sol nascente. Os olhos curiosos e atentos se perderam na paisagem nívea, enquanto o táxi amarelo serpenteava pelas sinuosas ruas e avenidas, mergulhando profundamente no cenário invernal que os cercava. Montanhas majestosas e coníferas erguiam-se no horizonte como sentinelas silenciosas, testemunhando a chegada do novo dia.

À medida que a manhã desvelava sua beleza e o sol despertava sobre a cidade, o táxi encerrou sua jornada, estacionando diante de um edifício de tijolos acinzentados. Uma fina camada de neve macia repousava como um manto sereno sobre os telhados das casas e calçadas circundantes.

Ao abrir a porta do táxi e colocar os pés na calçada, ela sentiu imediatamente o frio penetrante que cortava como uma lâmina afiada. Inspirou profundamente o ar gélido, enchendo os pulmões com a fragrância fresca da vegetação úmida que permeava o ambiente.

Caminhando pela calçada coberta por uma espessa camada de neve, ela finalmente alcançou o interfone, tocando os botões com os dedos protegidos por luvas. Aguardou em silêncio, enquanto a porta da entrada se abriu suavemente, como um convite discreto. Com passos confiantes, adentrou o corredor, subiu um lance de escadas e andou em direção a janela, seus passos abafados ecoando pelo corredor silencioso.

E então, diante da porta número vinte e quatro, sem precisar bater, a madeira rangeu suavemente ao se abrir, revelando um jovem de pele pálida, cabelos escuros e olhos cautelosos. Um sorriso tímido brincou em seus lábios enquanto seus olhares se encontravam, uma troca de reconhecimento sutil que deixava no ar uma tensão palpável.

— Silêncio, por favor. Meu pai está descansando, ele trabalhou a noite inteira — murmurou ele, fazendo um gesto para que ela entrasse.

Ela assentiu em compreensão antes de passar pela soleira e o seguiu pelo corredor, os passos suaves ecoando pelo assoalho de madeira. Ao alcançarem o quarto, os passos desaceleraram, permitindo que os olhos curiosos observassem cada detalhe. Da mesa de estudos com um cronograma fixado na parede logo atrás e uma câmera posicionada em um tripé, até as bolas de baseball autografadas, cuidadosamente dispostas em duas caixas de acrílico, onde ilustrava-se um nome desenhado em tinta preta sobre o couro branco. Um sorriso se desenhou em seus lábios gentilmente, capturando a essência do ambiente – as paixões e cuidados que permeavam o espaço. Mas seus olhos não tardaram em pousar sobre o notebook aberto, a tela refletindo uma realidade alternativa que ele havia habilmente criado – novos documentos sob o nome "Ellie Fleming" e a data de nascimento que permaneceu em uma data simples: 1994.

Enquanto ele falava sobre o processo meticuloso de criação das impressões digitais e das marcas de imperfeição que dariam segurança a seus documentos, ela continuou a analisar o ambiente ao redor. Cada objeto carregava um pedaço da vida dele, e agora um fragmento de história se entrelaçava ao dela. Sua análise foi interrompida quando o rapaz levantou-se da cadeira, entregando-lhe o envelope que continha o seu novo passaporte e identidade. Outro sorriso doce curvou-se nos lábios delicados ao aceitar o envelope.

— Então, por que vinte e nove? — Ele questionou, seu tom de voz revelando uma curiosidade genuína. — Você poderia tirar alguns anos, ninguém suspeitaria.

Ela sorriu para ele, o brilho em seus olhos refletindo gratidão.

— Você é muito gentil, Ethan — tirou alguns dólares do bolso do seu sobretudo e entregou a ele —, bom trabalho.

O rapaz a acompanhou até a porta do apartamento e enquanto andavam ele começou a falar sobre a possibilidade de futuros negócios, mas ela o interrompeu sutilmente.

— Por que você está fazendo isso? — Ela perguntou, a voz suave carregada de curiosidade.

Ethan franziu o cenho, confuso com a pergunta.

— Como assim?

Ela sorriu e continuou seu caminho pelo corredor.

— Você é um garoto esperto, falsificar é crime, com multa alta e tempo de prisão considerável.

Ele então parou, apertou os olhos e levou o polegar e o indicador até o dorso do seu nariz.

— Droga. Você é da polícia?

Uma doce risada escapou dos lábios delicados, o som sutil pairando pelo ambiente.

— Não... Quero distância da aplicação da lei o quanto puder — ela o olhou nos olhos com uma compreensão mútua —, odeio ver potencial desperdiçado, Jeff.

Ethan... é Ethan.

Ela sorriu novamente.

— Eu vi as bolas de baseball autografadas. Feitas para o Jeff. — Ela fez uma pequena pausa sem desmanchar o sorriso em seus lábios. — Pequenos detalhes o entregam, não seja descuidado — alertou, com o tom sutil entrelaçado em suas palavras.

Ela então deixou o apartamento, deixando para trás um vínculo momentâneo, mas significativo. Enquanto o táxi a conduzia de volta ao ponto de partida, a cidade, que se enchia de vida mais uma vez, empreendia seu recomeço diário, mas guardava um segredo compartilhado entre Ethan e Ellie, entre um jovem habilidoso e uma mulher cuja vida desafiava a passagem dos anos.

A jornada de Ellie se estendia por décadas, um testemunho silencioso de eras que vieram e se foram, e dos segredos que ela carregava consigo. Ela havia dominado a arte de desaparecer, de se fundir nas multidões e na história, como se fosse um fantasma dançando nos fios do tempo. Ela se transformava em diversas pessoas, adotando nomes e identidades que lhe permitiam escapar da atenção implacável da imortalidade.

TIMELESS: Bucky BarnesOnde histórias criam vida. Descubra agora