Teoria do caos

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— Você não vai comer? Eu sei cozinhar bem, talvez você goste. — perguntou para o rapaz que estava vidrado na tv, mas parecia perdido entre o filme e oque estava acontecendo a sua volta.

Talvez Great não estivesse prestando atenção no que Chon estava falando, pois estava tentando se concentrar na tv, mas não estava entendendo o que estava passando, pois Chon estava falando com ele.

— Não precisa ser tão formal comigo. Vamos passar alguns dias aqui, então sinta-se confortável para ser você mesmo e não se rotule.

— Mas esse é o meu jeito, eu sou assim normalmente.

— Ok, vamos conversar.

Great pegou o prato que Chon segurava na mão e o colocou na pequena mesa de centro, então virou-se para ele e o garoto o olhou sem entender.

— O que quer saber? — perguntou inseguro e estremeceu ao ter toda a atenção de Great voltada para si.

Aqueles olhos eram penetrantes e intensos, ele vacilou para continuar encarando, então mirou suas mãos e passou a desenhar as estrelinhas das mesmas. Chon corava com facilidade quando tinha muita atenção voltada para si, ou alguém era direto demais ao se referir a ele, e alguém como Great o deixava... sem jeito, por isso ele não o encarou.

— Me fala mais sobre. Eu preciso saber com quem estou convivendo. Por que você me beijou — Chon vacilou —, por que estava fugindo, o que você gosta de fazer. Eu quero saber mais sobre você. Você parecia assustado, não está chateado por estar aqui, não me encheu de acusações. Como é?

Todas as perguntas que Chon teria de responder o deixavam intimidado, ele não gostava de se sentir pressionado, mas como Great havia tirado suas dúvidas, ele teria que tirar as de Great. Mesmo que o mais velho tivesse dito para Chon se sentir confortável ao falar com ele, ele ainda não conseguia e seu olhar baixo oscilava entre suas e o rapaz a sua frente, mas nunca o encarando por completo.

— Você é sempre fácil de ser intimidado? — perguntou num tom provocador e Chon sentiu suas bochechas arderem mais uma vez, suas mãos também suaram frio e ele desviou os olhos para a tv.

— Isso não é ser intimidado, você me deixa... — hesitou.

— Como eu te deixo? — insistiu.

Great mirava intensamente os cabelos castanhos de Chon e o dono dos mesmos podia sentir a profundidade daqueles olhos, mesmo sem olhá-los diretamente. Ele o atravessava inteiramente. O mais velho se aprofundava em cada coisa dita por Chon, ele era direto, e isso fazia o garoto corar.

— Você... você me deixa sem jeito... — finalmente deixou as palavras saírem rapidamente e Great sorriu satisfeito.

— Espero que seja de um jeito bom. — tão provocador — Então, espero por ouvir suas respostas — Chon suspirou.

— Tudo bem, mas eu vou parar de respondê-las quando não estiver bem. — Great concordou — O Tonhon é meu namorado, ou era, até ontem... Eu recebi um vídeo no celular e ele estava com uma garota. — ele hesitou, mas Great empenhou-se um pouco para frente, o encorajando a continuar — Eu queria confronta-lo quando fui até ele, mas eu vacilei e então fui até você.

— Ele te seguiu? Ele fez alguma coisa com você?

Great parecia preocupado, e isso o fazia ganhar pontos com Chon, estava nítido em seus olhos, e agora Chon conseguia olhá-lo. Ele lembrou de vários momentos em que se sentiu mal por causa de Tonhon, e aquilo doeu, mas, ao mirar os olhos a sua frente, ele sentiu algo novo invadi-lo. Não sentiu a preocupação de estar com alguém que o fez mal, pois até aquele momento Great só o ajudou.

— Ele só tentou me alcançar, e nunca fez nada diretamente pra mim. Mas algumas atitudes não devem ser tomadas se você gosta de alguém. Então, P'Great, eu estava fugindo do meu ex e beijei você para conseguir sair de lá, mas eu sinto muito por isso, não vai acontecer de novo...

Great engoliu discretamente sua saliva e desviou seu olhar para a tv, tudo isso afim de disfarçar que estava mirando os lábios de Chon enquanto ele falava e tentando disfarçar que estava afim de beija-lo de novo.

"Isso é carência por estar preso aqui... Controle-se e não faça a burrada de machucar ainda mais o garoto!" — absorto em seus pensamentos, Great sentiu um toque em sua perna e voltou a encarar Chon — Uhm? — respondeu em dúvida ao pequeno gesto.

— Vai querer ouvir o resto? Você me perguntou o que eu gosto de fazer e por que não o enchi de perguntas e acusações.

— Adoraria ouvir — disse sincero.

— Eu gosto de cozinhar, ler um pouco, sair com a Miriam ou ficar em casa na maior parte do tempo. Minha rotina é bem pacata e frustrante. E respondendo sua outra pergunta, eu não o acusei de nada porque me senti confortável com você. Você me ajudou a sair da boate e ainda cuidou do meu braço. Eu sou grato por isso e sinto muito que tenha que vir pra cá.

— A causa de vir para cá não foi culpa sua, você só teve que vir porque eu tinha que te deixar seguro. Há pessoas más — hesitou ao não lembrar o nome do garoto, mas logo improvisou e o chamou pelo apelido que o fez corar mais cedo —, pequeno, e uma delas está tentando me matar. Eu não poderia simplesmente negligenciar. Você está seguro aqui e está seguro comigo, posso garantir isso!

As conversas fluíam naturalmente, sem que nenhum precisasse forçar, apenas Chon era um pouco tímido demais para sentir completamente confortável, mas já havia sido um grande avanço ele falar de Tonhon para alguém desconhecido.

O tempo passará depressa e conforme à noite se aproximava, a casa ficava cada vez mais fria. Os ventos sopravam furiosos do lado de fora e o farfalhar das árvores podia ser ouvido de dentro do chalé. Great mal havia comido, de fato ele estava preocupado. Estava preocupado em quanto tempo teria de ficar ali, preocupado com seus homens e preocupado com a segurança de Chon.

Os olhos de Great pairavam distraídos para o mundo através das janelas do quarto. A neve caía lentamente e os ventos que batiam nas árvores as fazia mexer-se ferozmente. Chon estava sentado numa poltrona na sala e fazia exatamente a mesma coisa que Great fazia no quarto.

Ambos só queriam voltar para suas respectivas vidas, mas nem Great saberia dizer quando isso iria acontecer.

"Talvez tudo tenha acontecido por uma razão — pensou Chon ao recostar-se no banco. — Se eu não tivesse recebido o vídeo eu não teria ido até a boate, não teria bebido aquele whisky e fugido do Tonhon, não teria beijado o P'Great, não teria pedido ajuda, não teria tomado um tiro e não estaria na Suíça hoje. Não teria de dormir na cama do garoto estranho que eu beijei e salvou minha vida quase depois de quase ter acabado com ela — sorriu com seu último pensamento —. Eu só quero descansar...

Chon levantou-se e subiu novamente para o sótão, onde encontrou Great parado de costas para ele. Impossível dizer qual dos dois estava mais perdido ali.

— Você tá bem...? — perguntou num murmúrio baixo e Great o olhou.

— Estou. Como está o braço?

— Bem, não foi nada demais.

— Você quer dormir?

Desde o momento em que Great viu Chon e o conheceu, ele sempre fora atencioso demais e estava disposto a fazer o que ele quisesse para mantê-lo confortável até a volta à Tailândia.

O quarto era fracamente aquecido pelo ar-condicionado, que mesmo sendo quente, não era o suficiente para mantê-los totalmente aquecidos. Os dentes de Chon batiam uns nos outros e ele sentia como se fosse congelar, mesmo Great o entregando um casaco enorme e quente. Ele estava receoso quanto a abraçá-lo, ele poderia entender errado, mas Great estava preocupado que ele pudesse adoecer já que fora impedido por seus pensamentos de se aproximar. Seu corpo tremia junto aos seus dentes, então ele tocou o ombro do garoto que estava de costas para ele.

— Quer vir aqui, pequeno?

Algo dizia que era só isso que Chon estava esperando. Sua pele estava fria e ele apenas se virou para Great, que o abraçou e imediatamente transmitiu seu calor corporal para Chon, então ele sentiu seu corpo relaxar ao ser aquecido. Great o abraçava com cuidado para não machucar ainda mais seu braço, mas o abraço era forte, quente e seguro. Seus dentes não rangiam mais e seus olhos finalmente fecharam.

Um Presente do AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora