Livre

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A semana passou rápida, após o episódio com Gianna não a vi novamente e por não termos trocado números tão pouco falei com a mesma. Eu estava organizando tudo para a chegada da minha mãe daqui uma semana. A semana foi lotada de cirurgias e atendimentos, sem perdas o que me deixava totalmente aliviada, desde que exercia a profissão nenhum paciente havia vindo a óbito em minhas mãos, sempre fiz o impossível para recuperar eles. Vincent estava mais calmo e atencioso durante a semana, até havia me mandado um buquê de rosas vermelhas enorme no hospital, que arrancou sorriso de várias enfermeiras, mas ele não me convencia com aquele velho truque, no começo até me fazia esquecer o motivo de eu estar tão enervada com ele, mas agora após anos, sei que ele só queria maquiar seus erros e a distância. Anne passou algumas vezes em casa e me disse que Patrick havia voltado para sua turnê com a banda, ela seguia firme na direção de seu filme e em poucas semanas iria voltar para o Catar terminar as filmagens, o que significava que eu iria ficar sozinha novamente.
Era um sábado anoite, estava extremamente abafado e úmido, era raro noites assim em Seattle mas comum para anteceder tempestades, eu havia colocado algum filme clichê na Netflix mas nem ao menos me dei o trabalho de ver o início, estava reorganizando a agenda para não precisar trabalhar na semana do meu aniversário, havia mandando e-mail para a Humanitis com meu nome e de Vicent, dentro de alguns dias eles retornariam confirmando a data. A campainha toca, levanto a sobrancelha, Anne não havia mencionado que viria até aqui, olho o relógio na mesa de apoio, nove horas. A campainha volta a tocar, me levanto e checo o visor de alarme com câmera, era Anne, respirei já sabendo que sua visita deveria vir com um convite para bebedeira. Sigo até a porta, abro e eu sabia exatamente que era um convite.

- Porfavor Vick, eu vou embora terça! - diz Anne chorosa após eu recusar inúmeras vezes seu pedido para irmos até uma casa noturna - poxa porque é tão difícil você querer se soltar?

- Porque eu sou casada Anne, tenho compromissos - digo com os braços cruzados, em pé no centro da sala - além do mais já tomei meu chá calmante e passei meus cremes

- Você tem quantos anos? 60? - ela diz indignada e eu dou risada - Vamos amiga, a Gianna vai tocar hoje - ela me dá um sorriso de canto

- E? - levanto a sobrancelha como se aquilo fosse de extrema importância para mudar minha opinião - isso não tem relevância

- A tem sim - Anne diz rindo - para de fingir Victoria - ela diz com os olhos cerrados - eu vi o jeito que ela te olha

- Você está ficando louca! Certeza que tanto cinema está mexendo com sua mente

- Vick eu conheço muito bem cenas onde pessoas fingem estar interessadas e Gianna não está fingindo nada, você que está fingindo não gostar desse flerte - ela diz dando de ombros

- Anne eu sou casada! - aponto para aliança - nem se eu quisesse, respeito o Vincent

- Ah então se você não fosse casada, você iria? - ela exclama e logo cai na risada, fico vermelha - VIU SÓ! - ela aponta o dedo para meu rosto - você sente interesse nela sim Victoria, mas respeita o bundão do seu marido, que está socado meses em Milão sem você saber o que ele está fazendo, você já se perguntou se ele também respeita você como você respeita ele? Se perguntou sobre todo esse mistério dele ficar meses lá, nunca vimos UM projeto dele finalizado, ele sempre dá um jeito de desconversar mas nunca vimos
Paro e realmente Anne tinha razão, desde que Vincent foi para Itália com seu sonho de crescer no ramo de empreiteiras jamais havia visto um trabalho seu concluído, eu estava tão absorta em minha rotina que jamais havia notado tal fato. O que será que ele fazia meses em Milão? Teria outra família? Seria outro Vincent? Mas isso seria impossível, com toda a fama indiretamente que a minha mãe fazia termos, em qualquer lugar saberiam que ele é casado comigo, ou não? E se mesmo assim ele fosse outra pessoa? Será que eu não conhecia a pessoa que fiquei anos dividindo a cama? Eu sem dúvidas iria investigar isso, mas não hoje! Hoje eu iria ser livre!

- Você espera eu me arrumar? - assim que disse isso os olhos azuis piscina de Anne se iluminaram e aquele sorriso travesso rasgou seu rosto antes vermelho por ter destilado toda sua raiva

- Eu sempre consigo o que eu quero - se disse por convencida e erguendo a cabeça declarando vitória sob a batalha travada minutos antes
Dou risada e subo para me trocar. Algo em mim havia despertado, como se as palavras de Anne tivesse aberto a cela para algo que vivia trancado, algo que sempre existiu mas nunca permiti sair, pois aprendi nunca fugir dos padrões. Após um banho rápido, abri o closet e nada ali me agradava, tudo chique e social demais, lembrei então de um vestido que havia comprado anos antes de conhecer o Vincent, quando o algo dentro de mim mostrava as garras, eu sabia que se ele sonhasse que sai com aquele vestido, ele iria surtar, mas que se dane, procurei no fundo do closet e achei, meus olhos brilharam. Após anos ele entrou ainda como uma luva, observei minha imagem no espelho, décadas que eu não via aquela Victoria. O vestido preto era composto por duas faixas pretas que cobriam apenas o seio e deixava os ombros e a barriga a mostra, sua parte de baixo era colada o que evidenciava minhas curvas, coloquei minha bota de strass até altura do joelho, fitei minha imagem no espelho, eu não podia crer. Finalizei a maquiagem com algo leve mas um batom vermelho sangue, peguei minha bolsa da Prada, caprichei no perfume e desci as escadas.
Anne estava quase dormindo quando me olhou, sua boca abriu e ela não disse nada:

- Está do seu agrado hoje? - sorri e dei uma volta

- Caramba...- ela disse ainda abismada - será que eu dormi? Tô sonhando? Meu Deus - ela levantou - você está deslumbrante!

- Ha ha - pronunciei irônica - muito engraçadinha, vamos?

- De táxi hoje, por favor!

𝐀𝐭𝐫𝐚𝐜𝐚𝐨 𝐅𝐚𝐭𝐚𝐥 (lésbica +18)Onde histórias criam vida. Descubra agora