Az travou a mandíbula e fechou os olhos. Agradeceu aos deuses o fato de ter mantido em segredo o que ele estava fazendo. Podia imaginar seus irmãos fazendo piada da situação em que se encontrava, podia visualizar Amren o olhando com deboche enquanto cedia aos comandos de Nuala e abria minimamente os botões de seu casaco.
— Só isso ? — perguntou maliciosa.
— Não... — começou ríspido — exagere — soltou entre os dentes.
A fêmea ergueu as sobrancelhas e o encarou com olhos desafiadores, a soberba iluminou suas pupilas. Az desviou-se do olhar dela e se virou para seguir pelo corredor que havia entrado. Agora que não estava mais envenenado, via as raízes e a parede com outros olhos. Pareciam mais sombrias, opressoras... sufocantes. Andou mais alguns passos até pararem na abertura, Nuala cedeu seu lugar a Az que pegou o braço solto de Lucien. A mulher abriu a passagem e deu de cara com dois Feéricos corpulentos, suas peles eram grossas e enrugadas como tronco de árvore e não tinham narizes. Pareceram surpresos ao ver a mestra deles enrolada em uma manta.
— Vocês, vão embora — Nuala disse com um movimento de cabeça em direção a Az — e vocês, entrem — completou olhando para os guardas.
Az apressou o passo em direção à saida, mas antes que pudesse cruzá-la, a mulher o deteve colocando a mão em seu peito e aproximou a boca de sua orelha.
— Prenda a respiração gatinho — assoprou com sensualidade e o soltou.
— Até mais, Milady — respondeu depois de instantes e seguiu seu caminho.
O salão havia piorado no tempo em que ficara preso. Os corpos se enroscavam uns nos outros pelos cantos e no centro do salão, Az pode ver quatro machos se servindo em uma fêmea. Uma Baobhan estava bebendo sangue das coxas de uma pixie de cabelos brancos e três kelpies montavam uns nos outros. As imagens que testemunhou o lembrou das pinturas que decoravam as paredes da Cidade Escavada... a selvageria o deixou sensível.
— Inale o veneno e se torne presa, beba o vinho e se torne um predador em êxtase — Eris comentou observando a cena.
Ainda que parecesse que tudo não passava de uma grande orgia coletiva, podia se notar que aqueles que estavam em posição passiva, não conseguiam se mexer. A fêmea que estava entre os machos, não movia um único membro enquanto os machos se lambuzavam nela. Az travou a mandíbula e quis intervir, mas Eris puxou sua manga, chamando sua atenção.
— Eles vêm aqui em busca disso — tranquilizou — a maioria deles tem esse fetiche... essa vontade de ser dominado — a voz do macho pareceu se infiltrar em sua mente — a vontade de estar a mercê dos outros, ser subjugado-
— Pare! — Az ordenou — vamos sair logo daqui — seguiu em direção ao Aldrava com determinação, não queria passar mais nenhum segundo ali.
— Onde estão indo ? — ouviu uma voz masculina questionar a suas costas, virou a cabeça para encarar uma gárgula.
— Não lhe interessa — Az respondeu hostil.
O macho pareceu surpreso com o tom, mas logo sua expressão estampou um sorriso amargo.
— Sabe que podemos compartilhar as presas... — respondeu lançando um olhar lascivo em direção de Lucien — não pode simplesmente escapar com uma coisinha dessas nos braços.
Eris ergueu as sobrancelhas diante do tom do outro e se preparou para intervir e falar algo antes que as coisas piorassem.
— Saia da minha frente ou eu abrirei você — Az rosnou em ameaça e trouxe Lucien para mais perto de si.
— Parece que alguém não sabe brincar — o macho respondeu estufando o peito.
Parecia que ele não queria recuar, o Illyriano se aproximou da gárgula.
— S a i a —disse pausadamente enquanto liberava o controle sobre seu poder.
"Puta merda, Az!" Eris pensou consigo e olhou envolta com medo de que estivessem chamando a atenção. A gárgula expandiu seu sorriso enquanto fitou o Illyriano de cima a baixo, trocou o peso de um pé para o outro e depois de alguns minutos, se afastou minimamente. Parecendo satisfeito, Az avançou com a cabeça erguida em direção da saída, a Aldrava percebeu que se aproximavam e esticou a lança bloqueando a passagem.
— A festa ainda não acabou — sua voz parecia com folhas secas sendo amassadas.
— Lady Ilana permitiu que saíssemos — Eris respondeu com cortesia.
— O que pode me provar que ela fez tal coisa ? — o guarda perguntou com desconfiança — voltem para a festa.
— Ela me deu isso e me disse para entregar a você — o Feérico enfiou a mão no bolso de seu casaco e a puxou em punho.
O Aldrava esticou a cabeça na direção da mão de Eris, procurando ver o que era, em um movimento rápido, o macho assoprou um pó em direção do guarda que se encolheu e cambaleou, soltando um chiado quando inalou a substância. Eris e Az aproveitaram a brecha para se jogar com rapidez em direção da porta que cedeu com o peso deles. O cheiro de terra e a escuridão os envolveu em um abraço úmido enquanto um grito agudo soou por todo o ambiente. O Aldrava os olhou com a boca escancarada, de onde um líquido negro começou a escorrer, a visão causou arrepios em Az.
— Corre!— Eris indagou em pânico se virando em direção às escadas — corra antes que nos enterrem nesse lugar.
Az se lançou em uma corrida frenética quando a porta se fechou com um baque e sentiu as paredes tremerem e a escada oscilar. Os degraus começaram a se desfazer com o peso deles e as paredes se moveram em sua direção. Eris enrugou a testa com preocupação. Az praticamente voou escada acima com Lucien em seus braços e quando percebeu a abertura por onde tinham entrado, concentrou uma bola de poder na palma de sua mão e a lançou. Os três foram atingidos por pedaços de terra quando a abertura explodiu revelando o céu noturno. Assim que passaram para fora, a escadas em que estavam desabou completamente e a paredes se fecharam com violência.
~
Um mês passou como se tivesse duração de dois dias. Ficara acordado que iriam se encontrar entre as fronteiras e que Atlýs não participaria da negociação. Ficaria no castelo e caso algo não desse certo, estava autorizado a liderar o exército em um ataque. O príncipe havia odiado cada detalhe do plano quando ouviu Leon explicar, mas por mais que argumentasse contra, foi uma guerra inútil. Quando viu que isso não funcionaria, implorou ao seu pai que não fosse em encontro com Orion, mas suas súplicas se mostraram em vão quando o dia chegou. Altýs acordou antes do sol nascer com o barulho da preparação para a assinatura. Lohan já se encontrava vestido com trajes de combate e suas coisas estavam empacotadas em dois sacos pequenos. O príncipe sentiu seu coração se apertar com a visão e suas pernas falharam, Lohan pareceu notar e o olhou com gentileza.
— Finalmente acordou — comentou com um sorriso de lado.
Atlýs o encarou por alguns segundos antes de avançar e tomar seus lábios em um beijo desesperado. Não queria que o outro fosse embora, não queria que esse último mês tivesse passado tão rápido. Se perguntou se conseguiria usar o corpo para atrasar sua partida... queria usar todos os meios, inclusive o sexo. Mas sabia que Lohan nunca cairia em um truque tão barato e por alguns segundos, se sentiu envergonhado. Quando se separaram, sentiu suas bochechas úmidas.
— Por favor, não vá — se pegou suplicando de novo.
Lohan segurou seu rosto entre suas mãos e respondeu com determinação.
— Eu preciso — seus olhos estavam tristes.
Lohan se afastou e foi em direção da espada. Atlýs o observou ansioso.
— Se vista, temos que sair em 2 horas e seu pai quer falar com você — disse fixando a arma nas costas.
O príncipe afirmou com a cabeça e chamou as criadas para que o ajudassem a se vestir. Lohan o deixou e seguiu em direção da sala de reuniões. Sentia seus dedos tremerem e seu coração pressionado, finalmente o dia havia chegado e cada aspecto dele o deixava temeroso.
— Lohan ? — ouviu uma voz feminina e se virou em sua direção.
Suri o olhou preocupada.
— Está tudo bem com Vossa Alteza ? — perguntou de maneira contida.
Por mais que Lohan não tivesse muito contato com ela, sabia que Suri se importava com Atlýs e via o quão abalado ele estava.
— Não, mas vai melhorar... ele precisa — Lohan disse resoluto.
Eles não podiam se dar ao luxo de serem tão sentimentais, isso poderia os deixar fraco, vulneráveis. Atlýs teria de lidar com isso de maneira rápida e silenciosa, era o que se esperava dele.
— Sei que não nos conhecemos bem, mas queria lhe agradecer — Suri começou a falar com as mãos unidas — desde que entrou na vida de Vossa Alteza, você o tornou melhor... maduro.
— Não precisa me agradecer, Suri — Lohan cortou com simplicidade — Eu não fiz nada, e se alguém aqui deve agradecer, esse alguém sou eu.
Suri permaneceu em silêncio por alguns segundos e o encarou com um olhar deprimido.
— Entendo — disse incerta e se curvou em despedida — que sua vida seja longa, Lohan, e que os deuses lhe proporcionem fortunas.
O guerreiro devolveu o aceno e seguiu em direção à sala de reuniões.
Leon estava debatendo algo quando Lohan bateu à porta, o Rei respondeu um "entre" abafado.
— Como esperamos que seja uma assinatura pacífica, não levaremos muitos outros soldados tirando as tropas Illyrianas.
Atlýs vincou a testa quando Leon moveu pouco mais de 20 bonecos em volta do boneco que representava o Rei.
— Sei que é um número baixo e que é arriscado, mas a melhor estratégia nesse momento é demonstrar que somos inofensivos — Leon explicou.
Lohan percebeu que aquilo também não lhe agradava, mas que não podia intervir uma vez que seguia as ordens de Ravi.
— Se tudo ocorrer de acordo com o planejado, assim que os papéis e os laços forem afirmados, as tropas Illyrianas voltarão com o Rei Orion para Vermell e os soldados que ficarem serão capazes de escoltá-lo de volta. Um encantamento será usado na área em que os Reis se encontrarão para que as habilidades mágicas fiquem inacessíveis — Leon traçou um círculo com o dedo numa pequena área do mapa — ao todo não poderemos usar nossos poderes por cerca de 10km.
Lohan ouviu toda a explicação com as sobrancelhas franzidas. Era uma plano arriscado e dava para ver o quão vulnerável eles estavam, sem mencionar a desvantagem. Ainda que fosse um campo aberto e não fosse possível encontrar pontos cegos, Lohan não gostou da maneira que sentiu que Zalaty estava praticamente se rendendo aos caprichos de Orion.
— Bem, acho que passamos os pontos mais importantes — Ravi disse depois de algum tempo — Sei que estamos tensos e que hoje será um dia de perda... — Lohan notou o olhar de tristeza quando o Rei olhou para Leon — mas temos que permanecer fortes e pensar no bem do povo — completou encarando Atlýs dessa vez.
— Preparem-se, saíremos daqui a uma hora.
~
— O que faremos com ele ? — Eris perguntou largando o corpo de Lucien no chão — mais importante, que merda foi aquela ? — indagou apontando para o buraco.
A última coisa que Az queria era que Eris soubesse da existência do livro e sua conexão com ele... e agora com Lucien. Sua mente estava trabalhando em busca de respostas e todas elas levavam a uma conclusão nada agradável. Sabia que ao cavar o passado esqueletos seriam descobertos, mas não pensou na gravidade da situação. Por mais que quisesse acreditar que era um equívoco, cada vez que olhava o rosto de Lucien, mais ele se assemelhava ao rosto do parceiro.
— Porra! — soltou andando em círculos.
Eles tinham atravessado para longe da toca assim que conseguiram sair, a urgência de escapar sem serem percebidos ou seguidos tinha ocupado a mente dos dois. Mas agora que estavam fora de perigo, estavam absorvendo e processando tudo que havia sido revelado.
— Irei levá-lo a Velaris, ele precisa ver uma curandeira — Az disse por fim, se aproximando de Lucien.
Eris se adiantou e se colocou entre os dois.
— Você não irá sair daqui enquanto não me dizer que porra aconteceu — disse em um tom sério — Diga Az, porque estou pensando em coisas e, se eu estiver certo, teremos um problema muito maior do que nós dois e você sabe disso melhor do que ninguém.
Az sabia. Se Lucien fosse... se Lucien fosse filho do Helion, o cenário mudava totalmente. Não seria mais uma questão sobre um livro qualquer ou um passado enterrado. Beron teria direito de declarar guerra contra Helion pela humilhação, isso sem mencionar o que aconteceria com a Senhora da Corte Outonal. As coisas que eles tinham descoberto eram armas poderosas e Az lamentou cada segundo em que decidiu fazer essa parceria com Eris.
— Uau, agora você realmente está com cara de quem vai me matar e queimar os restos — Az fixou seus olhos no macho.
Talvez devesse, pensou, assim ele seria o único a saber, estariam seguros, Helion estaria seguro. Seu treinamento como espião o compelia a fazer isso, eliminar as ameaças e pontas soltas, nenhum segredo permanece escondido quando mais de duas pessoas sabem e ele estava certo. Se Oriana tivesse mantido a gravidez em total segredo, se não tivesse confiado em Ilana, nada disso estaria acontecendo.
— Lucien irá comigo — Az começou por fim — e acho que nem preciso mencionar as implicações que podem ocorrer com as informações que temos — disse sério.
Eris ponderou com cuidado e afirmou com a cabeça.
— Aceitarei que leve Lucien, mas tenho uma condição — falou com calma.
— Você não está em condições de exigir nad- —
— Faremos um trato — Eris o cortou — não falaremos nada sobre essa noite, para ninguém... nunca — disse com firmeza — Helion não deve saber que tem um herdeiro, ninguém pode saber da vergonha da Corte Outonal.
Az ficou em silêncio. Seu coração e mente se dividiram brutalmente, Helion merecia saber, mas não era possível prever sua reação. Mas era seu parceiro, a que ponto ele seria perdoado caso Helion descobrisse sua mentira ? A indecisão de Az pareceu eterna em sua mente, mas durou segundos no mundo real quando forçadamente:
— Feito — e sentiu o trato ser marcado.
Olhou para a lateral interna do dedo anelar e a gravura de um sol partido o soou como um presságio.
— Poético eu diria — Eris comentou amargo. Antes de usar um anel para cobrir a marca — aqui nos despedimos, Encantador de Sombras, espero nunca mais fazer negócios com você.O Illyriano aguardou o macho partir e, pela primeira vez, dividiram os mesmos sentimentos. Pensaria sobre suas más escolhas no futuro, não queria carregar em suas costas a morte de seu... afilhado, e por isso, atrevessou com Lucien para o primeiro lugar que veio à mente.
~
— Onde Cass e Nestha foram ? — Mor perguntou oferecendo um ursinho para Nyx.
— Trepar em algum lugar — Helion respondeu.
— E Feyre e Rhys ?
— Trepar em outro lugar... espero — Mor ficou em silêncio e observou o macho.
Estava deitado com as pernas jogadas sobre o sofá e comia alguns biscoitos de cereja.
— E por que você e Az não estão fazendo o mesmo ? — Helion suspirou mordendo o petisco.
— Talvez esteja fazendo um a três com Rhys ou Cass — respondeu desgostoso e começou a encarar o teto.
Prometeu a si que não ficaria bravo por seu parceiro ter sumido, prometeu que não levaria isso para o coração. Quando o outro chegasse, teria uma explicação... talvez Rhys no meio da festa tivesse lhe dado uma missão ou algo tivesse surgido.
— Ei, não pense muito sobre isso — Mor aconselhou com seriedade — O Az é assim, sabe... ele tem o péssimo costume de se fechar e de fazer as coisas sozinho — abriu um sorriso solidário.
— É só que... — Helion começou e parou por alguns instantes.
Mor o olhou com expectativa e esperou.
— Espero que ele não esteja se divertindo sem mim — disse de maneira leve.
A fêmea o fitou por mais alguns segundos, ambos sabiam que não era isso que ele ia falar e essa era de longe a menor das preocupações que tinha. Mas Helion não queria ter essa conversa, confiava em Az, na medida do possível, ainda era tudo muito recente e sabia que a confiança verdadeira viria com o tempo.
— Tinha que ver o estado que ele estava quando você se feriu... — Mor começou — acho que nunca o vi assim com ninguém antes.
Helion sabia que ela estava dizendo isso para lhe agradar, já tinha visto Az se desesperar por alguém antes... por ela. Mas do que adiantaria remexer em chamas apagadas ?
— Você sabe que isso-
Antes que ele terminasse de falar, a porta de entrada foi aberta com violência e Az entrou carregando alguém para dentro do hall de entrada.Helion ouviu a voz abafada de Az pedindo que chamassem uma curandeira e se apressou em ver o que tinha acontecido. Mor pegou Nyx no colo e o seguiu. O Grão-Senhor não pode evitar de vincar as sobrancelhas quando viu Lucien praticamente morto nos braços do parceiro que não era pra ter sumido desde o princípio. Eles se encararam em silêncio enquanto Helion absorvia toda a terra, sujeira e sangue que deveriam ser Az, tentando encaixar as peças. Depois de alguns minutos, foi Mor quem quebrou o silêncio.
— O que diabos aconteceu ?
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O Deus do Sol (Hiatus)
FanficAz não tinha uma opinião formada a respeito do Grão-Senhor da Corte Diurna, mas uma noite pode mudar tudo. Se ele tivesse ouvido sua intuição, as coisas não teriam se tornado tão complicadas. Uma noite sem compromisso, um livro misterioso e desconhe...