Onze| 𝑃𝑎𝑠𝑠𝑎𝑑𝑜

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"[...] 𝐴 𝑚𝑒𝑚𝑜́𝑟𝑖𝑎 𝑣𝑜𝑜𝑢 𝑑𝑎 𝑚𝑖𝑛ℎ𝑎 𝑓𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒. 𝑉𝑜𝑜𝑢 𝑚𝑒𝑢 𝑎𝑚𝑜𝑟, 𝑚𝑖𝑛ℎ𝑎 𝑖𝑚𝑎𝑔𝑖𝑛𝑎𝑐̧𝑎̃𝑜...
[...]"

- 𝐶𝑒𝑐𝑖̄𝑙𝑖𝑎 𝑀𝑒𝑖𝑟𝑒𝑙𝑒𝑠

G A I A

A noite está gelada quando entro pela janela de Ivana. Toda vez que sua mãe está em casa tenho que entrar por aqui, o que não é muito difícil, já que o quarto de Ivana, mesmo sendo no segundo andar, possui uma escada que usam para limpar a calha.

Angela Ferragni sabe das minhas visitas escondidas, mas prefere que seja desta maneira. Durante muitos anos, Ivana e eu só podíamos nos ver durante a escola e, quando entramos no ensino médio, começamos a nos inscrever em atividades extracurriculares para termos mais tempo juntas. Assim ela podia ficar o dia inteiro fora sem que sua mãe reclamasse.

Após ela ir à minha casa pela primeira vez, só nos encontramos lá. A mãe dela nunca gostou de mim, dizia que eu tinha uma "energia gay" muito evidente e influenciaria sua filha; sobre a energia gay ela não estava errada.

Ivana já está falando a mais de trinta minutos sobre a morte do Neil e como isso afetou profundamente o seu ser. Depois de assistirmos Sociedade dos Poetas Mortos ela não para de filosofar sobre como a vida é curta para ficarmos seguindo regras sem sentido que são impostas.

A loira joga o balde vazio de pipoca em minhas mãos e se estica, mostrando as saliências de sua costela. Fico observando sua pele branca e imaculada, uma corrente elétrica passa por todo meu corpo quando nossos olhos se encontram e ela sorri.

- O Neil não deveria ter morrido.

- Você já disse isso, mezzo.

- Porque não deveria.

- Ah, é? E por que não?

Ela me olha como se eu tivesse acabado de falar a maior atrocidade do mundo.

- Stai scherzando, vero? Ele passou a vida toda fazendo tudo o que o pai queria.

- Algumas pessoas têm que escolher entre a liberdade e um lugar para morar. - Inclino minha cabeça para a esquerda bem a tempo de ver um franzido se fincar em sua face.

- Não é justo! Ele morreu e não conseguiu se tornar o que sempre sonhou. Não conseguiu viver! Dios mio!

- Mas ele vivia quando estava com os amigos, isso não conta?

- Conta, mas não na maioria das vezes. Imagina só você ter que viver duas vidas totalmente separadas, onde em uma delas você simplesmente não pode ser quem é por causa de uma pessoa que deveria te amar incondicionalmente e te aceitar independente de qualquer coisa.

- Merecia mais do que teve, nisso eu concordo. O pai dele não fazia nada de bom para ele... - Paro um pouco. - Bem, quase nada, o dinheiro era bom.

Ela joga o travesseiro em mim e ri.

- Acredite em mim, Gaia, dinheiro só serve para as questões financeiras. Não adianta de nada ter um rio de dinheiro e não ter um pingo de amor e respeito pelo filho.

- Ainda existem muitas pessoas que não têm dinheiro igual ao pai de Neil e mesmo assim não respeitam os filhos.

Ivana fica em silêncio observando os créditos do filme subirem na tela do aparelho. Lábios franzidos e para o lado; dedos apertados ao ponto dos nós ficarem esbranquiçados; uma típica reação de quando ela está pensando em coisas que a deixam ansiosa.

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