- O que você quer dizer com folclóricos de olhos vermelhos lá fora?
Talvez fosse o fato de estar sonolento por de acordar, mas, ou eu tinha ouvido errado, ou minha nova irmã estava piradinha.
Sofia ajeitou o óculos.
- Sim, disse. Sendo mais específica, um boi voador. Eu chutaria não vieram para tomar café.
Eu escutava, mas não conseguia entender.
- Você disse que tem um boi voador lá fora?
Ela rolou os olhos.
- Você não é surdo, é? Ou lerdo? Eu disse exatamente isso. Ah, e tem um menino com um cajado com a cabeça de uma cobra, também - falou Sofia. Ela sorriu. - Boi Vaquim e Jaci Jaterê. Os dois são seres do folclore brasileiro. Eu sabia que eles existiam.
Ver a Sofia empolgada com aquela situação me deixou mais confuso ainda. Aquilo não podia estar acontecendo. Não de verdade. Mas Sofia não brincava. Pelo menos não tinha feito uma única piada desde que a conheci. Lembrei do aviso da garota dos meus sonhos.
"Os corrompidos te encontraram."
Respirei fundo. O coração batendo a mil por hora. Eu tinha certeza de que Sofia não estava mentindo. Nem pregando uma peça. Os folclóricos, ou corrompidos, tanto faz, tinham chegado.
Talvez você ache que eu ficaria animado em ver folclóricos de verdade. Só que não. A maioria das lendas que eu conhecia eram macabras e sombrias. Sempre terminavam com um folclórico matando alguém. Tá é doido que eu queria encontrar essas coisas. Para mim, folclórico bom era folclórico nos livros. Piorou se tivessem sido corrompidos. Mesmo que eu não soubesse o que isso significava. Não podia ser boa coisa.
Me ocorreu algo enquanto eu acompanhava Sofia para ver as imagens das câmeras de segurança. Na noite anterior, Luiza tinha dito que pessoas comuns não conseguiam ver folclóricos. Quando perguntei o que ela queria dizer, ela deu de ombros e desconversou. Como se tratava de lendas e folclore, não esquentei a cabeça.
Quando parei em frente às telas de segurança no escritório do Sr. Sgarbi, desejei ter insistido um pouco mais. Chegando perto das escadas da entrada, estava um garoto com cabelos loiros encaracolados. Ele usava trapos como roupa, tinha muitos colares com miçangas. E segurava um cajado com uma cobra na ponta. Era uma cobra mesmo. A cabeça se mexia e a língua provava o ar, vez ou outra. Do lado dele estava um boi com asas de águia. Atrás dele vinham sete das criaturas mais estranhas que eu já tinha visto. Até o momento. Pareciam cachorros, mas tinham escamas. Os focinhos eram deformados. E tinham rabos de lagarto.
Minhas pernas começaram a tremer.
- Você disse que tinham dois folclóricos - falei para Sofia. - Aquilo é um exército.
- É, não é? Muito legal.
Eu não achava legal. Nem um pouco.
Os folclóricos pararam em frente à porta e olharam para a câmera. Mais uma: lendas que sabiam o que era sistema de vigilância. O garoto, o tal de Jaci Jatere, apertou o interfone.
- Queremos que abram a porta e entreguem Miguel. Assim poderemos matar o resto da família e destruir essa casa.
Sofia e eu nos olhamos.
- Já não acho eles tão legais - ela disse.
- Onde estão os Sgarbi?
Sofia me olhou feio.
- Que falta de educação, Miguel. Eles são nossos pais. O termo correto para se dirigir a eles é: pais, ou papai e mamãe. São as convenções sociais mais aceitas.
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Miguel Oliveira e a Árvore de Eldorado
FantasyUma história baseada nos universos de Percy Jackson, As Crônicas dos Kane e Harry Potter. E na experiência com adoção que eu tenho, minha e das minhas filhas. Miguel era um adolescente que adorava histórias mitológicas. Ele só não esperava que, ao s...