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Não fiquei nem um pouco surpresa com tudo o que vi quando cheguei. O zelador, no entanto, estava completamente envergonhado. Ele entrou primeiro no apartamento, cabisbaixo, mas era um senhor muito gentil. Eu retribui com um sorriso.

O cheiro de mofo era tão desagradável quanto a pintura desgastada da parede. Haviam goteiras no teto, teias de aranha nas janelas e rabiscos nas paredes.

– Sinto muito por isso – ele disse. – Nem todos os moradores respeitam as regras.

Dei de ombros. Eu já sabia que encontraria algo assim quando decidi procurar um que coubesse no meu orçamento.

– Você pode pintar como quiser. Tem água encanada e a taxa de energia é dividida entre os moradores – ele explicou. – A privada está entupida, mas já estou resolvendo isso.

– Está ótimo pra mim, Carl.

Vi seus olhos encherem de lágrimas e me contive para não abraçá-lo.

– Obrigada.

– Tudo bem – ele sorriu um pouco mais aliviado. – Então vou deixá-la descansar. Se precisar, estarei lá embaixo.

Agradeci. Quando ele saiu, meu celular tocou. Era minha mãe. Suspirei antes de atender.

– Mãezinha!

"Oi querida, já está no apartamento novo?"

– Sim.

Passei o dedo pela bancada da cozinha. Ele voltou sujo.

"Você gostou?"

– Sim, mãe, é lindo! A vista é incrível.

"Ah que bom, meu anjo. Quando posso te visitar?"

Nunca, pensei.

– Eu preciso fazer alguns ajustes ainda. Deixar mais a minha cara sabe?

Ela riu do outro lado da linha.

"Claro, meu bem. Me avise se precisar de ajuda ok?"

– Não precisa se preocupar com nada, mãe.

"Tudo bem, então vá curtir sua nova casinha. Te amo, tchau"

Com um suspiro, encerrei a ligação.

Estava preparada para todos os problemas que eu enfrentaria morando sozinha. Com meu novo emprego e uma bolsa integral para estudar biomedicina como sempre sonhei, nada poderia me abalar.

Com o meu primeiro salário, consegui comprar um colchão novo e pintar as paredes. Conforme o tempo foi passando, as coisas foram melhorando. Enquanto eu me virava no dia-a-dia, inventava várias desculpas para que minha mãe não viesse me ver e descobrisse onde sua "princesinha" estava morando.

Três meses depois, eu já podia chamar aquele pequeno apartamento de "lar". Mas nem todos os problemas haviam acabado.

Estava estudando quando ouvi o barulho novamente. Vinha sempre do apartamento de cima. Às vezes eram crianças correndo, às vezes uma bola batendo no chão. O fato é que eu estava cansada de aguentar aquilo. Então larguei meus livros e sai de casa.

Subi a escada para o terceiro andar e fui até a porta de número 17. Bati quatro vezes, com força. O Sr.Carl havia dito que os vizinhos eram muito rudes, mas eu precisava estudar o suficiente para conseguir pelo menos um 5 na prova.

Bati novamente e dessa vez ouvi passos. Para a minha surpresa, fui atendida por uma garotinha pequena com lindos olhos verdes e lábios cheios. O cabelo, embora todo desgrenhado, alcançava sua cintura. Ela me olhou meio confusa, com as bochechas rosadas. Era graciosa, mas não pude deixar de notar suas roupas sujas e seus pés descalços.

A HerdeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora