31 de outubro de 1975. Quando as flores se esconderam, assim como o calor, e o destino das folhas era nada mais do que o chão frio e úmido. Foi assim que eu vim ao mundo.
Não foi por uma coincidência infeliz que nasci no outono. Assim como as folhas, meu destino sempre foi cair. Hoje consigo ver com certa clareza como a miséria foi destinada a mim desde que abri meus olhos pela primeira vez. Desde que a sensação desconhecida do ar nos meus pulmões foi concebida.
Ao contrário das garotas da minha idade, minha mãe me odiava. O impacto dessa frase é grande, não é? Mas desde os 9 anos, sei que quando ela olha nos meus olhos, vê meu pai. Eu sempre carreguei a frieza dele em mim, mesmo nunca o conhecendo. É estranho saber que carrego comigo a aparência de alguém que nunca vim a conhecer.
Para minha mãe, nunca importou o fato de eu não ter escolhido a aparência que tinha, nunca importou eu ser apenas uma criança. Fui punida com frieza, crueldade. Por mais que eu comesse, implorasse, ingerisse o que fosse, aquela fome nunca passava.
A fome de ser amada.
Mas nada disso importava quando eu estava com ela, quando eu estava com a minha irmã. Camilla era a personificação de um anjo, ela era tudo que eu almejava ser. Ela era minha maior inspiração. Infelizmente, eu sempre tive uma tolerância maior em relação ao ódio, eu sempre aguentei calada, sem demonstrar um pingo de tristeza. Camilla era uma criança presa no corpo de uma mulher e eu uma mulher presa no corpo de uma criança.
Minha mãe tolerava Camilla mais do que tolerava a mim, afinal, ela sempre fez o impossível para agradar nossa genitora. Mas, isso nunca a deixou livre da fúria, dos gritos, da degradação lenta da alma a cada palavra que saía da boca da mulher que deveria nos amar incondicionalmente.
Às vezes ser forte é uma maldição, aguentar demais é uma maldição. E por essa praga que caiu sobre mim, tive que ver Camilla indo embora aos poucos, tive que ouvir a frase mais cruel que saiu da boca de minha mãe...
"Louise, Camilla se foi."
Camilla havia cometido suicídio.
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Alma Faminta
ChickLitLouise nunca foi amada do jeito que uma filha deveria ser, isso fez com que, desde cedo, sua alma almejasse por migalhas de afeto. Sua irmã mais velha, Camilla, era seu porto seguro, sua fortaleza. Era quem mais amava. Até que um dia, Camilla comet...