CAPÍTULO 12 - Uriel
Orion e eu estamos nos olhando há uns bons vinte minutos sem saber como começar, sondando um ao outro minuciosamente. Depois de toda aquela cena, voltamos para sua casa mudos e sem ao menos olhar para o lado naquele carro intimista de janelas escuras.
Respiro fundo tomando fôlego para começar, sua pulseira bem visível sugando minha atenção mais do que gostaria e me distraindo do enredo mental que estava construindo de forma que não o deixasse assustado. Ou desconfiado de que eu havia fugido de uma daquelas casas de apoio mental.
Sei que nem todos os humanos crêem em nossa existência ou de nosso Pai, mas creio que até mesmo os que crêem não acreditariam que sou um deles.
– Então...?
– Eu sou um anjo, que circulava entre vocês, humanos, protegendo e ajudando quem nos pedia e em um dia desses comuns três diabretes e um demônio arrancaram minhas asas e me deixaram naquele beco sem a minha figura angelical. Porém, quando eu toquei nesse pingente com a minha pena, a qual você encontrou presa a mim, consegui ouvir as vozes dos fiéis que pediam ajuda e calhou de ser a mesma menina que me ajudou quando fui roubada.
Despejo tudo – ou quase tudo – de uma vez em seu colo, sem pausas para não desistir ou deixá-lo contestar e quebrar minha confissão.
Por um momento, Orion permanece me fitando sem esboçar uma reação. Para em seguida começar a rir, gargalhar como se eu tivesse lhe contado algo extremamente impossível.
– U-um anjo?
E ri mais, se dobrando sobre a barriga.
– Sim, um anjo. Uriel, um dos anjos da justiça de Deus.
– Espera, espera, tipo, com asas e tudo?
Assinto e provando ser possível ele ri mais ainda, secando entre uma gargalhada e outra as lágrimas nos cantos dos olhos. Permaneço aguardando que organize as ideias com o que acabei de confidenciar, tentando ser paciente.
– Uriel, não sei se você joga rpg com um grupo de amigos chapados e acabou parando aqui em uma dessas "missões" de mesa – ergue os dedos para fazer o sinal no ar – Mas já deu, vem, vou te levar de volta para casa.
Puxa o ar com a mão, indicando que devo acompanhá-lo porta afora, mas finco os pés no chão de modo irredutível.
– Não estou mentindo!
Zadkiel, anjo precursor da justiça, por Deus exijo que apareça!
– Não está mentindo... Olha, isso já deu mesmo, pensa que sou idiota? Ingênuo? No fim você vai chamar seus amigos, invadir minha casa e roubar minhas coisas.
– Talvez seja alguém desconfiado demais, Orion.
– É, talvez eu seja. E talvez você seja uma louca assassina que eu pus fácil demais em minha casa.
Pisco. Sua reação não me surpreende, não por completo, mas posso ter idealizado sua figura calma com outros olhos.
– Poderia tentar acreditar em mim.
– Ok, ok, está bem. Tente me explicar de novo – concorda vindo até minha frente e cruzando os braços em uma pose de "estou ouvindo".
Aceno, unindo minhas mãos diante do corpo e retomando:
– Sou um anjo que infelizmente teve as asas roubadas por demônios. Passei toda a minha vida ouvindo as orações de quem necessitava de auxílio em questões sensíveis de suas vidas. Isso eu fazia todos os meus dias, pulando de rua em rua sem o mínimo esforço. Mas então, em um desses dias, fui encurralada em um beco e tive minhas asas levadas de mim.
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Quando a balança pende
FantasyO quanto você crê em anjos? Sabemos que em várias religiões os anjos e arcanjos possuem atividades que precisam desempenhar em nome divino. Aqui não seria diferente. Uriel foi criada para atender os pedidos por justiça dos mortais, que oravam e clam...