Capítulo 10 - Uriel

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CAPÍTULO 10 - Uriel

Estou sentada no meio da cama com as pernas cruzadas abaixo de mim e pensando no que fazer. Consegui dormir um pouco, mesmo sendo estranho o ato de dormir.

Primeiro precisamos fingir que estamos desacordados para enfim adormecer de fato, enquanto isso sua cabeça pode ir e vir em diversos cenários diferentes. Em algum ponto cheguei a pensar como seria para pessoas que não conseguem desligar suas mentes com facilidade...

Para a primeira vez em toda a minha existência que dormi, não foi uma experiência ruim. Faria novamente com prazer, sonhei (também pela primeira vez, claro) com um campo florido bem extenso, uma árvore com a copa enorme e um balanço pendendo em um dos galhos fortes. Balancei naquele banquinho suspenso por todo o sonho.

Fora uma das melhores sensações que já tive.

Agora mordo o canto das unhas ponderando como conseguirei minha angelicalidade de volta, minhas asas e, o mais importante, meu eu.

Será complicado retomar o que me foi levado sem nem ao menos conseguir ver quem as levou. Precisarei encontrar um meio, uma forma de achar aquele demônio ou até mesmo uma entrada para o inferno que permitirá minha passagem humana.

– Nunca pensei que precisaria descer...

Talvez, quando conseguir fazer contato novamente com Zadkiel, meu professor possa me indicar o melhor caminho.

Um cheiro doce sobe pelo quarto fechado que estou, pelas frestas da porta iluminada pela luz exterior, e me levanto para ver o que está acontecendo lá fora.

Orion deve estar preparando algo e se for macarrão com queijo de novo não deixarei que o coma sozinho. Não sei se a razão de ter gostado do prato tanto assim tenha vindo do fato dele ter sido o primeiro alimento que já comi, porém se me perguntassem minha comida favorita saberia qual escolher.

Jogo a manta sobre minha cabeça, enrolando meu corpo com ela e saindo em silêncio para o corredor. Passo pelo banheiro fechado com calma, vendo mais além o homem de costas para mim e o restante dos cômodos, mexendo em algo no fogão. Uma bacia grande está do seu lado e um copo com aquele líquido bem mais ou menos borbulha pela metade.

Por um segundo paro próxima a ele, que ainda não notou minha presença, me auto indagando a razão que ele poderia ter me acolhido de modo repentino como o fez.

Pode ser um momento de surto, sei que os humanos passam por ele vez ou outra e precisam de auxílio profissional, pendo a cabeça matutando um pouco mais e observando-o tirar algumas bolinhas da panela e colocá-las na bacia, substituindo-as por uma massaroca firme e arredondada por uma colher.

Ao se virar para pegar algo na bancada ao meu lado, Orion finalmente me vê e pula para trás, a colher em sua mão caindo com um estalo. Seus olhos quase saltam do rosto e seu peito sobe e desce com o susto.

– Misericórdia, Uriel!

– Desculpe, senti cheiro de comida.

Agachando para pegar a colher, Orion respira fundo para normalizar o corpo e joga o talher na pia, pegando outro.

– Tudo bem, só... não sei, finge que tosse quando chegar perto, tá? Ainda não me acostumei com você aqui, ainda mais como uma freira desse jeito – fala, apontando para a manta ao meu redor.

– Estava com frio.

Ele assente, tirando mais bolinhas da panela e desligando o fogo. Pega a bacia de bolinhas quentinhas, pedindo que eu as segure e enchendo dois copos de um líquido preto fumegante. Julgo ser café.

Quando a balança pendeOnde histórias criam vida. Descubra agora