seis

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Luiz
Desci da laje já meio puto com o esculacho que levei lá em cima. GK tava de marola com minha cara, cortou minha lombra legal.

Enquanto saía da casa do Maranhão, cocei a cabeça, pensando ainda no GK.

Roberta tava na calçada, sentada, no seu próprio mundo enquanto fumava um tabaco. Ela virou pra trás ao sentir minha presença e soltou um suspiro, como se tivesse me esperando.

— Não vem pra ficar me encarando, não. — ela se virou de novo e eu fui sentar do lado dela. Ajeitei a arma na cintura. —

— Pô, tu tá ligada no porque eu tava daquele jeito. Bater na Ayla, mano? — ela soltou fumaça e me olhou.

— Luiz, não foi à toa. Ayla me tirou do sério, papo reto. — ela bufou e apagou o tabaco e jogou a ponta longe. —

— Resolver na briga não é certo, mano. — Roberta suspirou, desviando o olhar pra mão com curativo. —

— Eu não mandei ela começar, Luiz. Ela que foi procurar. — Roberta retrucou, com um tom firme. Respirei fundo, tentando me manter na paz.

— Nega, vou te mandar o papo só porque não quero ter que te dar mais sermão. Tu tá ligada na disciplina aqui dentro, então fica na linha. — cutuquei ela pra ela me olhar. — Dá próxima vez que tu arrumar briga por ai, eu te coloco pra varrer a rua no final do baile. — Roberta arregalou os olhos e passou a mão no rosto.

— Ai, Luiz! Só porque é a Ayla, né? —

— Ayla é mulher que nem você. Se a situação fosse ao contrário, eu taria falando a mesma coisa pra ela. — me levantei, limpando o short. — Aqui, a palavra não tem curva. Tu já tá com um erro no nome, mais outro, quem vai conversar contigo vai ser o GK. E tu sabe que ele vê o vacilo, não a pessoa.

Tirei um bolado do bolso e dei pra ela como pedido de desculpas das encaradas lá na laje.

(...)

O sol tava quase se pondo na Rocinha, e eu tava no Q.G, contando o dinheiro do mês que passou.

Meu plantão é as seis da tarde, mas eu enrolei em casa ainda e fui chegar no Q.G umas seis e meia.

As notas de cinquenta e cem reais se empilhavam na mesa improvisada. O som do funk ecoava pelos becos, uma trilha sonora pro trabalho frenético que não pode parar.

Com o costume, minhas mãos se mexiam rapidamente, separando as notas em maços organizados.

Baiano, meu cria, tava sentado no canto, arrumando e colocando o pó nos saquinhos.

Moleque bom, dezoito anos. Esperto, mas ainda tem muito o que aprender.

— Presta atenção no tanto que tu tá colocando nessas 'porra ai, Baiano. — ele assentiu com a cabeça, os olhos arregalados de respeito e um pouco de medo.

O medo pra mim é necessário, mantém a gente vivo.

O som dos radinhos dos soldados ecoavam do lado de fora, sempre alertas pra qualquer movimentação estranha.

Fumaça entrou, trazendo notícias.

Esse é meu outro cria. Evoluiu bem e agora tá de frente e ganhando respeito de GK.

— Luiz, a boca lá embaixo rendeu bem essa semana. Os bota tá mais em cima do que nunca.

Parei de contar e o encarei. A notícia não era boa, mas também não era surpresa.

— É todo dia quinze do mês que esses 'caralho vem receber o deles. Hoje é dia sete. Pode mandar avisar que eles vão ganhar, mas no dia quinze. — Fumaça balançou a cabeça, tirando um telefone do bolso. — Sou nem cachorro pra ficar obedecendo miliciano vagabundo. Quem tá pagando essa porra sou eu, não ele!

KairósOnde histórias criam vida. Descubra agora