doze

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Maria Cecília
Quando eu parei em frente àquela casa, uma onda de nostalgia estranha me atingiu.

Não por reconhecer o lugar — era minha primeira vez ali —, mas por imaginar quantas vezes eu poderia ter estado nesse mesmo ponto, com minha mãe, se ela nunca tivesse me deixado.

Respirei fundo antes de apertar a campainha.

Segundos depois, a porta se abriu, e lá estava ela: Verônica. Minha mãe.

Vinte anos desde a última vez que a vi, e era como se o tempo não tivesse realmente passado. Ela ainda tinha aquele jeito forte, mas agora, nos olhos dela, havia algo mais... surpresa, choque, talvez até medo.

— Maria Cecília? — a voz dela saiu quase num sussurro, como se ela não acreditasse no que via. — Meu Deus, é você?

Eu não conseguia falar. Minhas palavras ficaram presas na garganta, então só acenei, ajeitando Lucas, adormecido, no meu colo.

Meu pequeno tava quietinho, no sexto sono.
Veio tagarelando e pulando o caminho todo, e teve uma hora que cansou e dormiu.

Verônica olhou para ele, confusa, seus olhos se estreitaram, como se tentasse encaixar as peças de um quebra-cabeça que não fazia sentido.

— Quem... quem é esse? — ela perguntou, com a voz hesitante.

Eu evitei a pergunta. Não era o momento. Ainda não. — Posso entrar?

Ela balançou a cabeça, parecendo acordar de um transe, e abriu a porta um pouco mais, nos dando passagem.

Entrei na casa, e tudo pareceu tão surreal. Meus pés naquele chão, minha presença ali.
A casa era simples, mas confortável. Algo que poderia ter sido meu lar... se as coisas fossem diferentes.

Nos sentamos na sala, e Verônica não parava de me encarar. Eu podia sentir os olhos dela pesando em mim, quase como se estivesse tentando encontrar traços da criança que um dia ela deixou para trás. Ajeitei João Lucas, deixando ele deitadinho no meu colo.

— Quem é ele, Maria Cecília? — Verônica repetiu, dessa vez com mais urgência, mas antes que eu pudesse responder, ouvi passos entrando na sala.

Um rapaz apareceu, alto, cabelo cacheado e bagunçado, com uma expressão curiosa. Ele parou ao nos ver e, por um segundo, a confusão no rosto dele refletia a minha.

— Mãe, quem é...? — ele começou, mas Verônica o interrompeu, suspirando profundamente.

— Felipe, essa é a Maria Cecília... sua irmã mais nova.

O choque estampado no rosto de Felipe era o mesmo que eu sentia. Eu olhei de volta para ele, tentando processar o que ela havia acabado de dizer.

— Irmã? — ele repetiu, confuso, como se a palavra fosse completamente estranha.

— Eu tenho um irmão? — minha voz saiu quase sem querer, cheia de incredulidade.

Verônica assentiu, os olhos dela piscando, como se não soubesse bem como lidar com a situação. Ela parecia estar tentando consertar alguma coisa que havia deixado quebrada por tanto tempo. Mas como consertar algo assim?

Felipe, mesmo ainda claramente abalado, trocou um olhar rápido com Verônica.

— Faz o seguinte, nego. Deita o menino lá na cama. — Verônica disse pra Felipe e me olhou em seguida. — Se você quiser, claro.

— Pode ser. Esse daqui pesa! — ri me levantando e Felipe sorriu, me guiando até o quarto.

A casa tinha três quartos. Um de hóspedes, um da Verônica e um de Felipe.

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