treze

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Quatro meses depois.

Maria Cecília
Acordei com o som insuportável do despertador. Pensa num barulhinho irritante. Me sentei na cama e olhei pro espaço vazio ao lado de João Lucas. Uma parte de mim só queria deitar de novo, ficar mais um pouco ali com ele.

Já faz quatro meses que tô aqui, na casa da minha mãe. Mas a sensação de que tem algo fora do lugar não me larga.

Me levantei, tentando afastar os pensamentos que vêm me assombrando desde que deixei a Rocinha. Será que eu fiz a coisa certa?

Eu só queria proteger o João Lucas... Mas, ao tentar proteger meu filho, acabei afastando ele de uma parte importante da vida dele. O pai.

Olhei pro meu pequeno, ainda dormindo, e meu coração apertou.

Fui direto pra cozinha atrás de um café, porque sei que o cansaço do plantão de ontem ainda tá comigo. Minha mãe já tava lá, sentada à mesa com uma xícara de café e um livro na mão.

— Oi, linda, bom dia — ela me disse com um sorriso caloroso, tentando aliviar a tensão que eu sentia no peito.

— Bom dia, mãe — respondi, meio desanimada, me sentando à mesa. Ela me lançou aquele olhar de mãe, o tipo de olhar que parece saber de tudo.

— Como você tá? Ontem tava tão quietinha... — ela fechou o livro e me encarou, já sabendo a resposta.

— Tô bem, mãe. Só tava cansada ontem. —tentei forçar um sorriso, mas nós duas sabíamos que não era bem isso.

Ela suspirou, mas não insistiu de imediato. Só me observou por um tempo antes de continuar.

— Você sente falta dele, né? — a pergunta veio suave, mas o peso dela me acertou em cheio.

Parei de mexer o café por um instante. Sinto falta? Claro que sinto. Mas não é tão simples assim.

— Não sei... talvez. Não é dele. É da vida que a gente tinha, do jeito que ele era com o João. Do jeito que ele olhava pra ele, como se o João fosse tudo pra ele. E agora, ele nem sabe onde a gente tá. — minha voz falhou no fim.

— Você fez o que achou que era certo, filha. Mas, às vezes, o certo dói. — ela pegou minha mão e deu um aperto leve. — Só não esquece de pensar no João também. Ele precisa do pai.

Eu concordei em silêncio, e João Lucas apareceu na cozinha, esfregando os olhinhos de sono.

O cabelo dele tá enorme, criou até franjinha.

— Bom dia, gatinho! — minha mãe disse, abrindo os braços pra ele.

Ele foi até ela com um sorriso inocente, aquele sorriso que só criança tem.

— Bom dia, vovó. Mamãe... —ele me olhou com os olhos ainda inchados de sono, mas logo se animou. — Hoje é dia da escolinha nova, né?

Sorri e acenei com a cabeça, me levantando pra preparar o café da manhã dele.

— É sim, amor. Vai ser um dia bem legal. Tem brinquedos novos e você vai fazer novos amiguinhos.

KairósOnde histórias criam vida. Descubra agora